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H.E.I.T.O.R.

7 fevereiro 2014

H.E.I.T.O.R.Editora: independente – Edição especial

Autor: Heitor Isoda (texto e arte).

Preço: R$ 20,00

Número de páginas: 64

Data de lançamento: Novembro de 2013

Sinopse

Coletânea de tiras.

Positivo/Negativo

Há uma grande tentação enquanto se lê H.E.I.T.O.R., de Heitor Isoda. E o chamado irresistível é pensar em poesia em quadrinhos. É certo, pois que isso dará certo nó na cabeça e frio no estômago do leitor um pouco mais engajado, digamos assim, na causa das HQs.

Ora, não se vive a dizer por aí que quadrinho é quadrinho, literatura é literatura, cinema é cinema? Diz-se, sim (e este articulista concorda com isso), mas não é por isso que não se pode pensar em poesia e quadrinhos atados aos mesmos requadros (ou versos). Mas calma, que se vá aos poucos.

A publicação de Isoda coleta diversas tiras de um a quatro quadros feitas por ele e publicadas em seu Flickr (que, aliás, merece uma visita – tanto para se entender daquilo que se comenta aqui, quanto para apreciar um material de tanta qualidade).

Os desenhos se adaptam ao que cada tira pede, sem nunca perder seus traços particulares. A narrativa é ousada, fragmentária e com enquadramentos muito bem pensados.

Todas as tiras são coloridas e algumas têm texto verbal e outras não.

Imagina-se o leitor a erguer uma sobrancelha e a pensar: se não há texto verbal, como pode ser poesia?

Existem algumas formas de se pensar nisso. E as relações poéticas estabelecidas pela poesia concreta, a poesia oriental com ideogramas e os poetas visuais talvez seja a mais rápida e convincente. Basta ver trabalhos como de Augusto de Campos, Décio Pignatari, Julio Plaza ou Pierre Garnier.

Mas não é por aí. Esse argumento só demonstra a existência de imagens chamadas de poesia. Porém, o trabalho de Isoda é absolutamente quadrinístico e não é poesia, embora haja um efeito poético em cada um dos painéis do livro.

E com essa expressão chega-se ao ponto. Um filme pode ter um efeito poético; uma canção pode ser poética; um livro em prosa pode ter um efeito poético. Por que não poderia uma HQ?

Mas o que pode haver de poesia neste material? O que é intrinsecamente poético, tão típico dos poemas que pode ser reconhecido em outras formas de expressão que não são poemas?

Há uma primeira impressão mais usual: não se trata de uma história, de uma narrativa. Aquelas tiras não dizem algo por meio de uma trama, elas dizem algo ampliado por metáforas (visuais e textuais).

Além disso, no caso de Heitor Isoda, o que se chama de efeito poético exala da potência contida no pequeno que, como semente, cresce e expande. Nas tiras de H.E.I.T.O.R. há muitas lacunas e espaços para o mergulho do leitor. O essencial é colocado e suas amplas possibilidades de relação são apontadas e que cada um se abrace àquela que melhor lhe parecer.

Trabalham para isso tanto as imagens, fruto de encontros inusitados (a chuva de fogo ou a árvore que vira lápis de cor, por exemplo), quanto o texto. Isoda usa seu próprio nome de acróstico na primeira página e na quarta capa da edição, constrói palíndromos que fariam Laerte (ou melhor, ET Real) bater palmas e sabe fazer rimas. E só isso valeria um parágrafo.

Não é recente a dificuldade dos quadrinhistas e tradutores brasileiros em lidar com os versos. Ou bem não usam, ou os cometem, via de regra, mal. Riminhas de diminutivos, em infinitivos ou em aumentativos aparecem como enxame e levam histórias interessantes para o insuportável. O verso não vive só de rima final, mas também de assonâncias e, sobretudo, de ritmo, surpresa e inteligência.

Além dos versos usados por Isoda terem um bom ritmo e assonância e fugirem das rimas fáceis, ainda se abraçam aos desenhos como manda a cartilha da boa relação entre texto e imagem numa HQ; e criam tiras lindíssimas.

Seja pelo aspecto sonoro ou visual, as tiras de H.E.I.T.O.R. se ampliam e invadem a consciência do leitor, que termina o livro já querendo voltar àquela tira, quer fazer uma camiseta com a outra, usar uma terceira de fundo de tela. Isso porque Isoda conecta o leitor a sua própria vida por meio da vida dele, com o uso de sua arte.

O único porém é que o livro deveria ter mais tiras. Mas, também, é aquilo: quem sabe usar o mínimo para falar, fala muito melhor que o verborrágico.

Classificação

5,0

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