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O Terror Negro # 1

17 março 2014

O Terror Negro # 1Editora: La Selva – Revista mensal

Autores: vários roteiristas e desenhistas, todos não identificados.

Preço: Cr$ 3,00 (valor da época)

Número de páginas: 32

Data de lançamento: Setembro de 1951

Sinopse

Revista em quadrinhos pioneira em terror no Brasil, o número de estreia de O Terror Negro reúne quatro histórias de sete páginas, mais um conto dividido em três partes de uma página cada.

As narrativas foram publicadas originalmente entre 1950 e 1951 pela editora americana Beyond.

Positivo/Negativo

Como chamar este primeiro número de O Terror Negro se, na verdade, trata-se do “segundo” volume 1 da revista, ambos lançados no curto espaço de pouco mais de um ano?

Talvez o correto fosse denominá-lo O Terror Negro # 1 – 2ª Série. Mas essa informação foi omitida pelo editor da época. De qualquer modo, esta foi a primeira revista brasileira inteiramente dedicada ao sobrenatural, além de introduzir no País as então modernas histórias do gênero terror produzidas nos Estados Unidos.

Até aquele momento, ao longo da década de 1940, à exceção da tradução das aventuras do Capitão América, que enfrentava o esquelético e diabólico Caveira Vermelha nas páginas de O Globo Juvenil, praticamente nada ligado a terror ou a monstros havia saído no Brasil.

Até que, em junho de 1950, a pequena editora La Selva, de São Paulo, lançou o gibi O Terror Negro. No entanto, não era exatamente uma revista com histórias em quadrinhos de terror.

O título veio do nome homônimo de um herói fantasiado pouco expressivo, que dividia as páginas da revista com outros similares: Águia Americana, Homem-Maravilha, Pirata Estrela, Princesa Panta, Detective Fantasma, Doc Strange e outros.

Portanto, embora trouxesse na capa do número de estreia – feita pelo brasileiro José Lanzellotti – um herói lutando contra diabos esverdeados, não se tratava de uma publicação feita para assustar. Mesmo assim, fez sucesso.

Até que acabou o estoque desses obscuros personagens, pois tiveram vida curta em seu país de origem. Como não havia mais material para fazer O Terror Negro além do número 9, de março de 1951, a revista foi encerrada.

Só temporariamente, entretanto, como se veria. As vendas animaram Vito La Selva e seus filhos Jácomo e Paschoal a buscarem uma alternativa para dar continuidade à publicação. A ideia de aproveitar somente o título e usar outros gêneros de histórias que tivessem a ver com o ele – ou seja, de terror – veio de Reinaldo de Oliveira (1928-1999), gráfico, roteirista e colaborador de textos da editora.

Com Luiz Rosenberg, dono da distribuidora APLAAgência Periodista Latino-Americana, ele conseguiu uma série de histórias avulsas de terror produzidas originalmente pela editora Beyond, que começavam a fazer sucesso nos Estados Unidos – e polêmica também, por causa das cenas de violência. Assim, Oliveira montou o que seria o décimo número da revista.

Por sugestão do desenhista Jayme Cortez (1926-1987), entretanto, a publicação foi reiniciada a partir do volume 1. Segundo ele, para atrair exclusivamente o público de terror – na época, um dos programas líderes de audiência no rádio era Incrível! Fantástico! Extraordinário!, do apresentador Almirante, transmitido desde 1947, sempre às sextas, à meia-noite, com histórias de assombrações enviadas pelos ouvintes.

A nova O Terror Negro chegou às bancas em setembro de 1951, totalmente dedicada ao horror. A edição trazia quatro histórias que, mais de 60 anos depois, ainda impressionam pela qualidade tanto dos argumentos quanto dos desenhos, todas esquematizadas para um final punitivo contra ambiciosos personagens. Como era praxe na época, não são citados os nomes do roteirista e do ilustrador.

As narrativas eram intercaladas por trechos do conto A maldição da Múmia, de um certo Charles Walton, que pode ter sido mais um pseudônimo do jornalista Cláudio de Souza, colaborador assíduo da editora.

Em O Lobisomem ataca!, que abre a revista, o famoso monstro criado pelo imaginário popular na Idade Média começa a atacar e a cometer assassinatos em uma pequena aldeia de pescadores chamada Finwick, no litoral dos Estados Unidos.

Descontrolado pelo desejo de apenas matar, como ele mesmo repete essa afirmação diversas vezes, no momento em que ataca uma vítima e tira-lhe a vida, o monstro é consciente dos seus atos e procura não deixar pistas sobre sua identidade. Mas resolve buscar ajuda de algum cientista para se livrar da terrível maldição. A história, com desenhos deslumbrantes, mostra uma criatura modernizada, longe dos cenários medievais de onde nasceu a lenda.

A segunda trama, Os semimortos, é uma das primeiras narrativas de zumbis feitas para os quadrinhos – o termo, inclusive, é usado pelos personagens. Eles seriam, segundo o roteirista explica do quadrinhos de introdução, seres quase robóticos que vivem entre o mundo dos vivos e dos mortos.

E viraram tema do novo livro do jovem e destemido escritor Peter Brandon, cujo manuscrito foi recusado pelo editor por não trazer elementos mais excitantes e assustadores para os leitores.

O fato, porém, sai na imprensa e ele recebe a visita de uma bela jovem, cujo tio o convida para viajar ao Haiti e conhecer suas experiências sobre “zumbis”. Ainda irritado e disposto a fazer qualquer negócio para ter uma boa história, ele aceita sem imaginar que pode virar uma dessas criaturas.

A terceira história se chama O fantasma relutante, sobre um casal ambicioso (ela quer a fama fácil e ele gostaria de saber como será o futuro) que pede ajuda ao Dr. Drivet, um senhor de poderes mediúnicos que consegue trazer espectros de mortos em uma sessão de espiritismo.

E quem acode a dupla é uma anciã que diz ser atormentada por coisas ruins que fez no passado. Sem alternativa, ela concorda em atender ao homem e à mulher, mas não do modo como esperavam.

A marionete fantasma fecha a edição. Conta a trajetória de Peter Lucas, famoso criador de marionetes. Ele faz seus bonecos executarem qualquer coisa. Exceto respirar. “Sua arte atingia tão alto grau que somente a vida faltava a seus fantoches. Mas será que faltava mesmo?” Ou seriam suas pequenas criaturas monstros assassinos prontos para matar?

Essas histórias de terror tão exemplares em termos de qualidade, que mostram que O Terror Negro estreou em grande estilo, com uma feliz seleção de tramas que impressionam realmente.

O primeiro gibi de horror brasileiro fez tanto sucesso que sobreviveria por 18 anos, apesar da falta de zelo da La Selva, sempre às voltas com disputas familiares.

A melhor fase da revista aconteceu nos 50 primeiros números, dos mais de 220 publicados. Assim como aconteceu nos Estados Unidos no decorrer da década de 1950, no Brasil os quadrinhos de terror também foram massacrados por pais, educadores, padres, políticos e pela imprensa. Tornaram-se uma espécie de subprodutos piorados dos já criticados gibis, em uma época em que se condenavam as revistas por prejudicar a formação moral de crianças e adolescentes. Ficaram famosos os artigos de Carlos Lacerda contra os gibis da La Selva, publicados em seu jornal Tribuna da Imprensa.

Mesmo assim, O Terror Negro seguiu em frente e abriu um filão que seria seguido por outras pequenas editoras de São Paulo. Em 1953, as Edições Júpiter lançaram Sepulcro e Horror, ambas de duração efêmera. Em janeiro de 1954, a Orbis Publicações mandou para as bancas Sexta-Feira 13. Em 1955, a Companhia Gráfica Novo Mundo e Editora apostou em nada menos que quatro publicações de uma só vez: Gato Preto, Medo, Mundo de Sombras e Noites de Terror.

Até então, as revistas traziam somente histórias norte-americanas. Depois, viria a lendária editora Continental/Outubro, fundada em 1959. Mas essa é uma outra história.

Classificação

5,0

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