Um retrato fiel do mercado
Entrevista: Editora Nona Arte
com André Diniz (Editor)
Universo HQ: Qual a sua opinião sobre o mercado de quadrinhos no Brasil hoje? O que esperar desse mercado no próximo ano?
André Diniz: Parece que o mercado começa a se firmar um pouco, com uma mudança na estratégia dos editores. Acho que, com a experiência de erros anteriores, ficou provado que não há mais mercado para novas edições de 50.000 exemplares, mas o quadrinho pode crescer muito indo direto ao seu público leitor, com tiragens de 1000 ou 2000 exemplares. Este ano de 2001 deve confirmar esta tendência. Outro aspecto relevante é o sucesso das HQs na Internet. Se este veículo não chega a substituir as edições impressas, é, sem dúvida, uma excelente alternativa.
UHQ: Quais os principais problemas que você vê no mercado nacional? O que acha que deveria acontecer para mudar esse panorama?
André: O problema está na teimosia dos desenhistas, roteiristas e editores de baterem sempre na mesma tecla, repetirem sempre os mesmos erros. A grande mudança virá quando a produção de quadrinhos no Brasil for completamente repensada.
UHQ: Qual o balanço que a sua editora faz do ano 2000?
André: A editora começou a “operar” apenas em setembro, mas já colheu ótimos frutos com os resultados das duas primeiras edições – “Fawcett” e “Subversivos”. Inclusive, este curto espaço de tempo foi suficiente para que a editora ganhasse três prêmios Ângelo Agostini: um indireto (melhor desenhista – Flavio Colin, que desenhou Fawcett) e dois diretos (melhor edição: Fawcett / melhor roteirista: André Diniz).
UHQ: Quais são os planos da sua editora para 2001? O que vem por aí?
André: Há uma série de edições planejadas, entre elas a edição “31 de Fevereiro” e um novo “Subversivos”. Além disso, a Nona Arte vai cair arrebentando esse ano na Internet.
UHQ: Hoje, a história em quadrinhos é um produto caro. É possível reverter esse quadro ou a tendência é isso se manter?
André: Dificilmente isso vai mudar. Aliás, a tendência é encarecer ainda mais, já que as tiragens são cada vez menores…
UHQ: Mesmo nessa tremenda crise, poucas vezes tivemos tamanha variedade de lançamentos. O leitor pode optar entre super-heróis, europeu, manga, quadrinho adulto, erótico, nacional etc, mas todos com tiragens reduzidas e preços altos. Como você encara essa segmentação?
André: É a forma dos quadrinhos sobreviverem no Brasil… E esta não é uma tendência apenas dos quadrinhos, mas de todo o mercado editorial. Vai ver quantos títulos novos aparecem a cada dia nas livrarias! Em contraponto a esse processo, temos o alcance da Internet, onde a sua HQ pode ser lida por dezenas de milhares de pessoas.
UHQ: Por muito tempo, os quadrinhos de super-heróis dominaram o mercado nacional. Você acha que essa diversidade de títulos é sinal que eles estão em decadência?
André: Sem dúvida! Imagine se os cinemas passassem 15 anos exibindo apenas filmes de ação…
UHQ: Você acha que a falta de revistas e críticas especializadas no setor afeta o mercado?
André: Não há dúvidas. Mas (mais uma vez) a Internet se mostra como uma forma de driblar este obstáculo. O Universo HQ é uma prova disso.
UHQ: Qual sua opinião sobre a distribuição no Brasil?
André: É caótica, e o assustador é que nem mesmo as maiores editoras do País estão livres deste problema. Nós temos um quadro de quase monopólio, aliado a um serviço porco. Se a Fernando Chinaglia envia 100 exemplares da edição de uma revista para uma banca e 5 para outra, supondo que cada uma venda apenas 4 exemplares desta edição, a edição seguinte será mandada exatamente na mesma proporção: 100 na primeira e 5 na segunda. provavelmente haverá uma terceira banca com capacidade para vender 50 exemplares recebendo os mesmos 5 todo mês.
UHQ: Os quadrinhos estão, cada vez mais, migrando para as livrarias. O que você acha desse nicho?
André: É uma conseqüência da segmentação do mercado. Para distribuir uma pequena tiragem e fazer com que os exemplares fiquem mais tempo em exposição, a livraria é o lugar ideal, não a banca de revistas.
UHQ: A Nona Arte está atuando no segmento de livrarias e bancas especializadas, qual a situação da editora neste mercado? A venda direta da editora, hoje, é significativa?
André: A Nona Arte, como editora, ainda é um grãozinho de areia! Todos os meios de venda ainda são significativos, seja na banca, seja na livraria, pelo correio, em eventos, pela Internet…
UHQ: Vocês trouxeram de volta aos “holofotes” dois craques do quadrinho nacional – Flavio Colin e Laudo. Eles continuarão trabalhando para a Nona Arte? Virão novos nomes? Eles serão artistas experientes ou haverá oportunidade para novatos?
André: No que depender de mim, estas serão as primeiras de uma série de parcerias entre a editora e estes dois mestres! A vantagem de estar em um meio tão “falido” é essa: é como se eu montasse a minha primeira peça de teatro contando com Paulo Autran e Fernanda Montenegro! Com o Laudo, inclusive, já há vários projetos sendo elaborados. Mas a editora está aberta a qualquer um que apresente um trabalho interessante e pessoal, iniciante ou veterano. Eu mesmo me considero meio novato, e fiz o roteiro das duas edições… A próxima edição de Subversivos vem com desenhistas bem menos conhecidos, mas também de muito talento.
UHQ: Vocês têm planos para atuar em bancas?
André: Em bancas especializadas, as edições da Nona Arte já podem ser encontradas. Mas uma distribuição maciça, para todas as bancas, ainda não está nos planos.
UHQ: A situação econômica hoje é desfavorável para os quadrinhos. O preço de suas edições é um problema?
André: Não tenha dúvidas! O leitor paga caro; e eu viro noites em claro para fechar a edição sem prejuízo (Lucro? O que é isso?).
UHQ: Seus dois lançamentos de 2000 foram com artistas nacionais. A idéia é continuar nessa linha ou vocês publicarão também autores estrangeiros?
André: É aquela história do “nunca diga ´desta água não beberei´”… Os quadrinhos estrangeiros não fazem parte do plano inicial da editora, mas quem sabe mais futuramente… Porém, já caiu por terra de que quadrinho importado vende mais do que nacional. A verdade é que nenhum dos dois vende bem! Mas, se o projeto for interessante e bem elaborado, não é a nacionalidade da obra que vai influir.