A História de Patópolis
Há mais de 30 anos, uma saga Disney foi criada no Brasil, contando a origem da fantástica e divertida cidade dos patos.
Nos Estados Unidos, os personagens Disney moram em duas cidades distintas. Mickey e os coadjuvantes habituais de suas histórias (Pateta, Minnie, Clarabela, Horácio e outros) vivem em Mousetown, algo como Ratópolis. Já Donald e os demais vivem em Ducksburg.
O mesmo acontece na França, onde eles se dividem entre as cidades de Mickeyville e Donaldville. Na Itália, Topolinia, cujo nome faz referência ao Mickey (Topolino, em italiano), é a cidade dos ratos; e Paperopoli é onde vivem os patos.
Para os brasileiros, Patópolis é onde, há mais de 60 anos, se desenrolam as aventuras dos personagens desses dois núcleos. Uma cidade que teve a honra de protagonizar alguns números de Disney Especial e, na década de 1990, chegou a ganhar um título próprio, Aventuras em Patópolis.
Também por aqui foi feita a maior homenagem que a cidade já recebeu: em 1982, a Editora Abril lançou A História de Patópolis, uma grande saga contando sua origem em cinco episódios divididos entre os principais títulos Disney.
Com textos de Ivan Saidenberg e desenhos de Roberto O. Fukue, Verci de Mello e Euclides K. Miyaura, A História de Patópolis alcançou fama internacional, fazendo sucesso em países como França, Itália e Dinamarca.
Tendo em comum a mítica pedra do jogo da velha, que estava sempre presente em importantes acontecimentos da história patopolense, tornando-se peça fundamental no desenrolar de alguns dos eventos mais decisivos, os episódios foram narrados pelo Professor Ludovico. E seus ouvintes eram alguns dos principais personagens Disney que assistiam à parada de aniversário da cidade.
Pena Rubra, o viking (Mickey # 359, setembro de 1982)
Tudo começa no século 10, em algum país nórdico, quando Pena Rubra, antepassado do atrapalhado Peninha, é mais uma vez despedido do jornal "A Pataruna". A partir daí, as confusões na vida do pato só aumentam, quando ele se junta a um grupo de músicos vikings e faz crer a todos que é um exímio velejador, vagando pelos mares em direção à China.
Obviamente, seu peculiar senso de direção o faz levar a embarcação à desconhecida América.
Lá, preso pelos índios enquanto seus companheiros músicos escapavam, Pena Rubra passa a conviver com eles e se torna o "espantador de espíritos" da aldeia, ao tocar horrivelmente sua guitarra acústica. Acaba presenciando um pitoresco jogo disputado pelos nativos: o jogo da velha, cujas peças eram, literalmente, velhas índias gordas e magras.
Ao inventar uma forma mais fácil de se praticar aquele jogo, escreve uma representação gráfica numa pedra e cria o jogo da velha como hoje conhecemos.
Depois, retorna ao seu país de origem, mas a pedra do jogo da velha fica esquecida naquele local que, muitos anos depois, viria a se tornar Patópolis.
A invasão dos piratas (Tio Patinhas # 207, setembro de 1982)
Neste segundo episódio, Zé Carioca chega à parada, como convidado do prefeito da cidade, e ajuda a contar como seu tataravô, Zé Cariboca, teve participação marcante na história de Patópolis.
Engajado no navio pirata do capitão El Borrón, tataravô do Mancha Negra, Zé Cariboca estava prestes a participar do ataque à então Vila Patópolis, cujas defesas eram lideradas pelo próprio fundador, Cornélio Patus.
Na noite anterior, no entanto, resolve desertar e ruma a terra firme. Avista a linda Rosita, por quem se apaixona. Mas ao ser visto por um morador, é perseguido e retorna ao navio, não sem antes se esconder nas ruínas da primeira vila e tropeçar na pedra do jogo da velha.
No navio, convence El Borrón de que teve a "visão" de um mapa do tesouro numa pedra em Patópolis. Rumam todos para terra e, lá, Zé Cariboca desvia os piratas mata adentro, em busca do tal tesouro, para livrar a vila da bela Rosita do ataque.
Os piratas perdem as armas num confronto com os índios corvos e, logo depois, são capturados pelo povo da vila, onde são julgados e condenados. O papagaio é poupado, como reconhecimento pelo fato de ter desviado os bandidos de Patópolis.
Uma boa história, cheia de passagens hilárias, como a que Zé Cariboca foge dos índios com a maior facilidade, gabando-se de ter adquirido boas condições físicas correndo dos cobradores em sua terra natal.
Correio a cavalo (Mickey # 360, outubro de 1982)
No Velho Oeste patopolense, o Xerife Cintra solicita a ajuda dos cowboys Mikélio e Patético (bisavôs de Mickey e Pateta, respectivamente) para buscar uma mensagem do presidente, endereçada ao povo de Patópolis.
Um trem que trazia a mensagem estava parado no caminho, pois os vilões Bafão e Escovão (notoriamente, bisavôs de João Bafo de Onça e Escovinha) haviam danificado os trilhos.
Capturados pelos bandidos, os três mocinhos são obrigados a escavar uma mina clandestina, onde Patético descobre, por acaso, a pedra do jogo da velha.
Dominando alguns bandidos que vigiavam a mina, Mickélio e Patético partem a cavalo rumo à cidade, a fim de entregar a mensagem do presidente. Duelam com Bafão e vencem.
Em seguida, o "cavalo de ferro" chega a Patópolis (após o conserto dos trilhos) trazendo a mensagem de felicitação do presidente ao povo daquela cidade, pela ida do primeiro trem àquele local não mais isolado do país. A pedra do jogo da velha também foi levada e, reconhecida pelo Professor Von Pattus, guardada no museu.
A aventura lembrou bastante as famosas histórias de mocinho e bandido de Mickey e Pateta feitas por Paul Mury, mas com muito mais humor. O bisavô do Pateta estava impagável e bem se viu de quem ele herdou a, digamos, "patetice".
O século das luzes (Almanaque Disney # 136, outubro de 1982)
Pardalto, o avô do Professor Pardal, era um inventor maluco que, em 1910, descobrira um cometa que se aproximava da Terra e nela tocaria a cauda (é claro que se tratava do Halley). Aprontando muitas confusões ao tentar alertar os patopolenses de que não havia motivo para pânico, o cientista apenas piora as coisas.
O Professor Gaviâncio, avô do Professor Gavião, resolve se aproveitar do caos gerado, com o intuito de roubar a cidade com mais tranquilidade, na hora da passagem do cometa.
Fugindo da polícia, ao ser reconhecido como aquele que tentou roubar a caixa-forte de Patinhes (tio sabem de quem?), refugia-se no museu e encontra, jogada num canto, a pedra do jogo da velha.
Disfarçando-se de profeta, atiça a superstição do povo proclamando o fim do mundo e apresentando a escrita na pedra histórica como sendo uma antiga profecia.
Mas tudo dá errado. O bandido é preso e a pedra é levada ao salão de honra do museu, ao ser novamente reconhecida por outro antepassado do Professor Ludovico.
Um dos melhores episódios da saga, com interessantes referências históricas e um humor centrado nas geringonças esquisitas de Pardalto, com destaque para o megafonocóptero, uma mistura de megafone e helicóptero, com o qual o inventor passou boa parte da história.
O poderoso Metralhão (Mickey # 361, outubro de 1982)
Para muitos leitores, a melhor história da série. A aventura se passa em 1930, quando Patópolis sofre as investidas do gângster Al Metralhone.
Praticando assaltos com armas de brinquedo (sem que as vítimas saibam desse detalhe, é claro), os alvos eram, inusitadamente, carrinhos de frutas, pois o bandido mantinha um clandestino alambique de sucos naturais.
Quando resolvem fazer um "assalto de verdade", Al Metralhone e sua gangue escolhem Tio Patinhas como vítima, durante a festa de inauguração de sua Caixa-Forte, na qual a pedra do jogo da velha estava sendo exposta no salão principal.
Frustrada a tentativa de assalto (a fortuna do pato muquirana ainda não tinha sido transportada para o prédio), os gângsteres são presos.
Muitas foram as situações cômicas desta aventura e, divertido mesmo, foi ver Donald e Peninha ainda garotos; o Tio Patinhas inaugurando sua Caixa-Forte (muito antes de Don Rosa mostrar isso na sua magistral A Saga do Tio Patinhas); o Coronel Cintra ainda tenente; e o Professor Ludovico um adolescente.
Novos elementos
Em março de 1987, a revista Tio Patinhas Especial # 4 trouxe a republicação de toda A História de Patópolis, acrescentando dois novos episódios, situados antes dos eventos já conhecidos, com textos de Gérson Teixeira e desenhos de Irineu Soares Rodrigues.
O primeiro, Patópolis na Idade da Pedra, uma aventura muito engraçada que mostra que os antepassados de Donald e Margarida foram os primeiros a pôr os pés na terra dos patos, há milhares de anos.
Entretanto, como nem tudo são flores, ocorreu uma discrepância na história: como forma de fazer uma agenda de tarefas diárias para Donalgorg, sua irrequieta esposa acaba originando a pedra do jogo da velha. Isso foi de encontro ao que se veria algumas páginas adiante, quando Pena Rubra cria o artefato.
O segundo episódio, Embarcando numa galera furada, não tem o mesmo brilho, nada acrescentando à saga. Talvez com o intuito de divulgar mais o personagem Boinifácio, a então mais nova criação do Estúdio Abril, a aventura narra as peripécias desse desastrado ruminante no Egito antigo.
O fato mais relevante da trama foi quando a pedra do jogo da velha serviu de trampolim para que uma enorme rocha afundasse a galera onde estava Cleópatra, no litoral da futura Patópolis.
Depois de décadas relegada às boas lembranças dos leitores saudosistas, A História de Patólis voltou a ser republicada pela Abril, em 2012. A edição especial incluiu não apenas todos os capítulos originais e os extras, mas também algumas HQs de Carl Barks relacionadas à cidade da Família Pato.
Marcus Ramone está de férias no sítio da Vovó Donalda, situado no caminho entre Gansópolis e Patópolis, e pede para não ser incomodado.