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A fase esquecida dos Novos Titãs

16 julho 2014

Sob o comando de Dan Jurgens e com arte de George Pérez (durante 15 números), a equipe ganhou novos personagens e tramas interessantes, mas não conquistou os fãs, como se esperava

 

O ano de 1996 marcou o início de uma nova fase cheia de potencial para os Novos Titãs, a mais tradicional equipe de super-heróis adolescentes da DC Comics. Na mesma época, o lançamento marcante das minisséries Reino do Amanhã e Justice League – A Midsummer’s Nightmare sintetizava o retorno dos personagens clássicos em meio ao contexto moderno e diferente do universo ficcional da editora, para alegria dos fãs.

Para a revista da “molecadinha”, entretanto, os poderes constituídos optaram por seguir na direção oposta. Era o relançamento da franquia após a saída do roteirista Marv Wolfman, e a aposta da DC foi em heróis totalmente novos e renovação completa.

Vale lembrar que, na fase final da série The New Titans, o grupo era liderado por Arsenal e contava até com Impulso e Lanterna Verde, financiado pelo governo dos Estados Unidos. O próprio Wolfman decidiu se afastar da revista, pois para ele aquela formação da equipe não fazia sentido, e apenas focava nas vendas.

Assim, com o término do título, estava aberto o caminho para mudanças. Grant Morrison estava interessado no grupo, e chegou a formular uma proposta, mas foi escalado para a nova Liga da Justiça. Para os Titãs, a DC selecionou o competente roteirista e ilustrador Dan Jurgens, além do veterano George Pérez na arte-final, sob a supervisão do editor Eddie Berganza.

Teen Titans # 1 chegou às lojas especializadas com data de capa de outubro de 1996, pelas mãos de artistas muito dedicados e apresentando um novo time de heróis jovens, mas sem esquecer os elos com o passado.

Teen Titans # 1 - Volume 2 Teen Titans # 2 - Volume 2

A nova turma

Jurgens entendia que, para sua encarnação dos Novos Titãs funcionar a contento, ele precisava ter controle total sobre os personagens, evitando assim os heróis que já apareciam em outras revistas. Estavam descartados, portanto, nomes como Robin, Superboy e Impulso.

Outras ideias deixadas de lado foram o uso de Dick Grayson e Donna Troy como mentores do grupo, e a entrada da jovem Kara, uma proto-Supergirl que o próprio Jurgens introduziu na minissérie Superman versus Aliens.

Mas o autor não abriu mão de um super-herói clássico da Era de Prata dos quadrinhos, o diminuto Eléktron. Veterano da Liga da Justiça, Ray Palmer fora transformado em adolescente durante os eventos da megassaga Zero Hora, constituindo uma opção perfeita para a nova revista. Fora ele, porém, os Titãs seriam formados mesmo por uma nova turma, num enredo de ficção científica e muitas surpresas.

Assim, a edição de estreia do título logo apresentou Risco, Argenta, Prisma e Joto, quatro jovens de 16 anos, que faziam aniversário no mesmo dia e partilhavam de uma herança especial. A trama revelou que eles eram seres híbridos, frutos de inseminação artificial por alienígenas mais de uma década atrás, herdeiros do império estelar H’San Natall.

Risco (Cody Driscoll) era o aventureiro nato, dotado de força e agilidade ampliadas e desdém pelas autoridades estabelecidas. Argenta (Toni Monetti), uma patricinha rica que desenvolveu a capacidade de gerar energia. Joto (Isaiah Crokett), o jovem afro-americano com poder sobre o calor. E Prisma, uma garota cujo corpo absorve e reflete luz, criada num ambiente virtual inspirado em programas de TV e contos de fadas.

Teen Titans # 3 - Volume 2 Teen Titans # 9 - Volume 2

O grupo entrou em rota de colisão a partir de acontecimentos fora de seu controle. Perdidos no espaço e atraindo a atenção da mídia na Terra, receberam por engano a alcunha de Novos Titãs. Após sobreviver ao confronto com um caçador de recompensa extraterrestre, Eléktron decide permanecer com a equipe recém-formada, pronta para novos desafios.

Fazendo a ligação com versões anteriores da equipe, Jurgens estabeleceu a figura do milionário Loren Júpiter e da enigmática Sina, cuja identidade seria mantida em segredo, ao menos no início.

Júpiter logo “adotou” os adolescentes superpoderosos, repetindo o papel que tivera, anos antes, com a Turma Titã original. Logo surgiram os conflitos com Eléktron pela liderança, fora os problemas naturais da colaboração com personalidades difíceis e cheias de energia.

Os três primeiros números mostraram a história de origem, com o título Titans Children, em ritmo de ação frenética e apostando na boa construção de personalidades. A arte de Dan Jurgens, finalizada por George Pérez, surgiu mais bonita do que nunca, com o dinamismo habitual. Os Novos Titãs, enfim, haviam renascido.

Histórias posteriores se destacaram pela inserção dos novíssimos Titãs no contexto do Universo DC, com as participações especiais de Asa Noturna, Robin, Capitão Marvel Júnior, Supergirl e até do Guerreiro, numa viagem ao mundo perdido de Skartaris.

O Robin original, Dick Grayson, certamente decidiria investigar a identidade dos garotos usando o nome de seu antigo grupo, e eles teriam que se mostrar dignos do título. E foi o que fez.

Teen Titans # 10 - Volume 2 Teen Titans # 12 - Volume 2

Já a participação do Guerreiro foi a chance de Dan Jurgens revisitar seu primeiro trabalho como profissional dos quadrinhos, justamente com o alter ego de Travis Morgan.

Pouco a pouco, também ganhava forma um pano de fundo da série, versando sobre a herança alienígena dos Titãs e uma conspiração na Terra que daria muito o que falar. Era evidente que o autor tinha planos grandiosos para os heróis.

Teen Titans # 6 foi a edição mais bem recebida dessa fase, justamente por focar na interação dos jovens personagens, narrada pelo cabeça-quente Risco, numa carta para sua mãe. Como não poderia deixar de ser, a série era carregada de sentimentos, não só das paixões secretas entre a turminha adolescente, mas também das relações entre pais e filhos.

Para satisfazer a demanda dos fãs mais antigos e talvez justificando o nome da revista, Teen Titans # 12 foi uma edição dupla, centrada nos super-heróis integrantes da equipe original, Asa Noturna, Arsenal (o ex-Ricardito), Flash e Tempest (o antigo Aqualad).

Com o título Then and Now, a saga apresentou flashbacks dos tempos de Robin, Ricardito, Kid Flash, Aqualad e Moça-Maravilha, narrada alternadamente pelos heróis da velha guarda e apresentando as reações deles aos novos garotos. Também foi o início de uma guinada criativa para Teen Titans, a partir do sacrifício heroico de Joto e da decisão de Loren Júpiter de desativar a equipe.

Teen Titans # 14 - Volume 2 Teen Titans # 15 - Volume 2

O resultado foi o amadurecimento forçado da espevitada Argenta, seguido de encontros com as jovens estrelas do Universo DC e da entrada do Capitão Marvel Júnior como novo membro, escolhido pelos leitores.

Questões como o legado e as tradições heroicas mais significativas dentro do Universo DC estiveram no foco dos novíssimos Titãs, já que eles eram calouros interagindo com os grandes ícones. Dessa forma, havia reminiscências do Eléktron sobre seus tempos na Liga da Justiça, bem como o propósito de Arsenal se redimir dos erros do passado à frente da nova turma.

Nos roteiros, Jurgens exprimia o mais puro respeito e admiração pelos personagens clássicos, enquanto investia pesado em legitimar sua “nova geração”. Mais um grande destaque foi o encontro romântico de Argenta com o Capitão Marvel Júnior, que acabou com o garoto lavando pratos num restaurante luxuoso de Metrópolis.

A série teve um total de 24 edições, um anual com mais páginas e cinco especiais focados em personagens específicos. O tom das histórias foi bem aventuresco, com muito bom-humor e uma mistura saudável entre o material inédito e os clássicos que fizeram a história dos Titãs ao longo das eras.

O arco final tratou de resolver a questão dos alienígenas do império H’San Natall, restaurar a idade cronológica do Eléktron e fechar todas as pontas soltas, preparando o terreno para mais uma reformulação bombástica do grupo. Titans Hunt contou com as participações de Exterminador, Superman e Mutano, significando o fim de uma breve – porém marcante – fase dos Novos Titãs.

Jurgens escreveu todas as histórias, mas Pérez foi substituído após a edição # 15 por Phil Jimenez e Norm Rapmund. Logo, a DC lançou as revistas Young Justice, com Robin, Superboy e Impulso, e The Titans, com o retorno dos membros fundadores. No entanto, o destino ainda guardava algumas surpresas para aqueles improváveis heróis.

Teen Titans # 16 - Volume 2 Teen Titans # 17 - Volume 2

Quase esquecidos    

Durante a publicação desta encarnação de Teen Titans, os personagens da revista apareceram com certo destaque nos quatro cantos do Universo DC.

A série Chase, por exemplo, focou os Titãs em sua quarta edição, em meio a questões mercadológicas e action figures. O crossover com os títulos do Superman, Gigantes do Milênio, também contou com as criações de Dan Jurgens, que marcavam seu espaço com propriedade.

Mas o melhor foi a presença de uma Argenta já adulta do futuro desolado de Rock of Ages, justamente a melhor saga da Liga da Justiça reformulada por Grant Morrison. O escocês enxergou o potencial da heroína e deixou clara a sua visão para a simpática Toni Monetti. Não é surpresa que a moça prateada tenha sido a representante daquela fase que melhor resistiu ao cancelamento da revista.

Quando The Titans foi lançada, dois anos depois, sob os cuidados da escritora Devin K. Grayson, Argenta permaneceu em destaque ao lado dos Titãs originais, funcionando como elo entre gerações distintas de heróis. Já seus antigos colegas não tiveram a mesma sorte.

Teen Titans # 19 - Volume 2 Teen Titans # 20 - Volume 2

Risco, em especial, sofreu ao ter os dois braços arrancados pelo Superboy Primordial, nas sagas orquestradas por Geoff Johns. Joto e Prisma acabaram mesmo caindo no limbo, até que toda esta linha temporal foi desfeita com o reboot da DC Comics em 2011.

No contexto dos Novos 52, toda a história dos Novos Titãs recomeçou do zero, e o futuro é uma incógnita. A nova ordem é primar pelo ineditismo, sem muitas referências ao passado glorioso, muito menos a uma fase dissonante.

No imprevisível mercado dos quadrinhos de super-heróis, as séries de sucesso são eternizadas por meio de relançamentos constantes, homenagens inspiradas e sucessivas reimpressões de suas histórias em volumes luxuosos. O passar do tempo não é capaz de apagar a aceitação entusiasmada de uma equipe criativa vitoriosa.

Por outro lado, há um sem-número de bons quadrinhos que não alcançam a repercussão merecida, apesar dos talentos envolvidos e das boas tramas e desenhos apresentados. Personagens cujo potencial jamais será plenamente desenvolvido, e que permanecerão apenas no coração daqueles que seguiram sua trajetória com carinho. E a “fase esquecida” dos Novos Titãs é um desses casos.

Marcus Vinicius de Medeiros, apesar de conhecer tanto da história desses personagens, não era nascido quando a Turma Titã foi criada.

Teen Titans # 22 - Volume 2 Teen Titans # 23 - Volume 2

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