Confins do Universo 203 - Literatura e(m) Quadrinhos
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O que vamos fazer hoje à noite?

1 dezembro 2001

Depois de um longo inverno (que nem acabou ainda) eis minha segunda (e última) coluna... por enquanto. Acontece que o pessoal daqui do Universo HQ não paga um (NEM UM!) centavo pelas minhas colunas (pesando bem, acho que eu também não pagaria muito por elas...) e várias outras coisas estão acontecendo. Vou tentar enumerá-las.

Em primeiro lugar, a Pandora está crescendo bastante e, como você talvez saiba, somos uns poucos moicanos por aqui...ainda. Em seguida, um projeto legal que fiz para um site de entretenimento foi aprovado. Trata-se de um e-book que terá dezesseis capítulos e será lançado também em formato livro, em parceria com Delfin, um velho amigo. Isso tudo terá que estar pronto até o final de outubro. E, para terminar, estou preparando uma série de propostas de séries, minisséries e one-shots para o Comicon International, de San Diego, na metade de julho. Aliás, também, em San Diego estarei cobrindo o evento para alguns jornais e sites, além de ter uma série de reuniões com os parceiros da Pandora.

Há muitos e muitos anos (dez, pra ser mais exato) meu objetivo mais precioso é conseguir produzir quadrinhos on a regular basis. Aqui, no Brasil, isso não é possível. Então, temos que encarar os grandes quadrinhistas americanos, japoneses, europeus e ingleses (porque inglês não tem nada de europeu, na minha opinião), e mostrar que somos tão bons quanto.

E nem me venham com aquela história de que temos que retratar o Brasil nos nossos quadrinhos, que as lendas daqui são tão bonitas e o !@$%$#!. Que o mercado daqui tem que proteger o artista nacional etc. Você conhece algum cara que virou adulto de verdade vivendo embaixo da saia da mãe? Eles (os americanos, japoneses etc) que se protejam da gente! Vamos fazer histórias que podem ser lidas e entendidas em qualquer canto do mundo!

Há uns dois (ou três?) anos escrevi um artigo para o Página Central, no qual me pediam para falar dos super-heróis brasileiros. Dá pra contar nas falanges de um dedo o que presta. Por que, quando tiveram a chance de produzir, os artistas e escritores da velha guarda não fizeram um trabalho digno? Poxa, os títulos da EC foram cancelados nos Estados Unidos e os brasileiros tinham trabalho sobrando pra fazer! E o que fizeram? Nada que identificasse o quadrinho brasileiro. Até hoje não temos cara!

Era mais fácil fazer qualquer coisa e botar o dinheiro no bolso do que perder tempo fazendo quadrinhos de qualidade. Não adianta se orgulhar (e brigar!) dizendo que o Santos Dumont inventou o avião, o relógio de pulso ou que o Angelo Agostini criou os quadrinhos. Temos que fazer os melhores aviões, relógios e...quadrinhos! E não estamos nem perto disso. É chato ter que admitir, mas, nós não levamos as coisas a sério quando devíamos, e estamos pagando o preço por isso agora.

O mercado brasileiro poderia ser um mercado competitivo e criativo em âmbito mundial, se os artistas e executivos nacionais tivessem atitudes mais sérias e espertas. Ah, mas você pode falar que tivemos grandes artistas brasileiros detonando lá fora, e isso é verdade... até certo ponto. Roger Cruz, Luke Ross, Mike Deodato. Vários deles estiveram nas listas dos 10 mais da Wizard, hum? Mas, se um dia você tiver a oportunidade de conhecer pessoalmente um deles, peça para ver os seus verdadeiros trabalhos. É muuuito melhor do que aquilo que eram obrigados a desenhar para a Marvel ou DC.

O Roger está cada vez melhor, produzindo páginas lindas...mas quando tem que desenhar X-Men é obrigado a fazer o que o editor pede. O Luke aprimorou seu traço numa velocidade incrível e está no nível dos melhores ilustradores do mundo. Mas quando o assunto era Homem-Aranha... "Faça assim, faça assado!" O Deodato, bom...basta ver o trabalho que ele tinha antes do mercado externo, e ver o quanto ele teve que reduzir sua criatividade e talento para fazer quadrinhos para os americanos. Vamos ver essa sua nova série para a Marvel e até onde vão deixá-lo desenhar. Desculpem por citá-los, pessoal, mas realmente acho que vocês mereciam muito mais reconhecimento do que já têm.

O caminho, portanto, torna-se mais difícil e tortuoso. Minha idéia é produzir. Não importa para onde, mas... produzir. Estamos conseguindo, apesar de vagarosamente, fazer algumas coisas como as cores exclusivas para o Dredd do Brian Bolland e outros projetos. O Sam Hart, grande amigo meu, acabou de colorir a segunda parte de Razorjack (de John Higgins) para a Com X, a nova editora britânica. Depois disso, vamos desenhar e escrever...?

Acho que deixei um pouco mais claras minhas teorias sobre mercado... Ou seja, "Tentar conquistar o mundo!" Mas há várias outras coisas que devemos relevar e sublevar. O Quesada, por exemplo, é uma pessoa que sabe muito bem o que está fazendo, e está se cercando dos melhores profissionais do mercado. Boa parte da sobrevivência dos quadrinhos neste novo século está nas mãos dele. Mas isso já é assunto pra outra coluna.

Bem, pessoal, agora já podem festejar. Vocês não terão mais que dizer "puxa, li sua coluna no Universo HQ e achei muito legal, cara!" quando me encontrarem nas comic shops por aí. Fora isso tudo, espero que quando meus compromissos se abrandarem um pouco, Samir, Naranjo, Codespoti e Sidão me aceitem de volta como colunista.

Espero também que todos vocês continuem prestigiando o trabalho feito aqui (Ei! Prestigiem a Pandora também, né?) porque não é todo mundo que sabe fazer um site tão legal e dinâmico assim. Aliás, fiquei sabendo que a entrevista com o Gaiman estava sendo supercomentada no site do Warren Ellis (nota do UHQ: no fórum de discussões foi aberto um tópico sobre a entrevista de Gaiman, que já tem quase uma centena de mensagens)! Chique, hein?

Espero voltar em breve!

Ricardo Giassetti é diretor/editor da Pandora Books, mas garante que não vai transformar este espaço em um outdoor dos títulos que eles publicam ("apesar de serem os melhores", garante). Ele foi crítico de quadrinhos de vários jornais e revistas durante algum tempo, e, apesar da pouca idade, com certeza, tem muita experiência no assunto, como comprova sua "calvície galopante".

 

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