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Bá e Moon comentam Daytripper - obra já está à venda

26 setembro 2011

Gabriel Bá e Fábio Moon

O álbum Daytripper (edição especial, formato americano, 256 páginas, R$ 62,00, capa dura), de Gabriel Bá e Fábio Moon, já está à venda em livrarias e lojas especializadas.

Daytripper (confira aqui a resenha da edição norte-americana) traz dez momentos cruciais na vida de Brás de Oliva Domingos, um escritor de obituários que está desgostoso com seu emprego e tem problemas de relacionamento com seu pai famoso.

Publicada originalmente nos Estados Unidos pelo selo Vertigo, da editora DC Comics, a obra ganhou os importantes prêmios Eisner e Eagle, além de ter ficado em primeiro lugar na lista dos encadernados mais vendidos do New York Times.

O Universo HQ conversou com os autores sobre a obra, a sua importância e as consequências que trouxe para suas carreiras.

Daytripper

Universo HQ: Quando surgiu a ideia de Daytripper, já foi pensando no mercado norte-americano?

Gabriel Bá: A ideia surgiu no banho, nessa possibilidade de a morte chegar a qualquer momento, sem um motivo, sem razão nenhuma, sem heroísmo. Isso foi em 2001, 2002, muito antes de qualquer coisa, em outro tempo, e ficou parada até 2006, quando começamos a discutir nossas ideias para ver quais eram boas para propor para a Vertigo.

Quando nos pediram ideias, enfatizaram que buscavam de nós o tipo de história que contávamos, o nosso "realismo fantástico", que não precisávamos tentar pensar em algo que se encaixasse nos outros títulos da Vertigo. A história em si que contamos só foi desenvolvida a partir do momento que o Bob (Nota do UHQ: o editor Bob Schreck) disse se interessar bastante pela ideia, e então começamos a pensar com mais profundidade nela, no formato em série, nos personagens, na trama mesmo.

UHQ: Como foi o processo de publicar o trabalho no selo Vertigo?

Fábio Moon: No início, foi um processo longo. Vínhamos mostrando nosso trabalho, primeiro somente a arte, mas desde 2003 também as histórias, para o Bob Schreck, desde antes de ele ser um editor da Vertigo. Ele era editor de super-heróis na DC (do Arqueiro Verde quando o conhecemos e, depois, do Batman e da linha Grandes Astros), mas vinha de uma carreira com trabalhos mais autorais, tanto na Dark Horse como, mais tarde, na Oni Press, da qual foi um dos fundadores.

Então, ele se interessou bastante pelo tipo de histórias que estávamos fazendo na época (que acabaram entrando no álbum 10 Pãezinhos - Crítica aqui no Brasil, e no De: Tales nos Estados Unidos).

Quando foi transferido dentro da DC para a Vertigo, ele nos disse: "Agora é a hora, rapazes, comecem a me mandar ideias". Desse momento, em meados de 2006, até aceitarem a ideia do livro e assinarmos o contrato, foi um ano e meio de troca de emails.

10 Pãezinhos - Crítica

Quando começamos a trabalhar realmente no roteiro e nas páginas, tivemos liberdade criativa para fazer a história do jeito que achávamos melhor, mas tivemos um acompanhamento editorial que nos manteve focados, pensando nos prazos, e nos fez pensar bastante em todas as partes do processo, desde a capa ao roteiro e o desenho.

: Aprovar as capas deu uma dor de cabeça, principalmente no início. A primeira foi a que deu mais trabalho. Ao mesmo tempo, a cada nova versão, a capa foi ficando melhor e, no final, isso ajudou muito a dar uma unidade às dez capas.

UHQ: Alguma obra literária influenciou na concepção de Daytripper? De que forma?

: Muitas obras nos influenciam, de literatura, quadrinhos e cinema. Fazia um tempo que eu queria escrever uma HQ que tivesse narração em terceira pessoa, como via em obras do Will Eisner, em livros ou naquele filme Mais estranho que a ficção, no qual a escritora narra a vida do personagem principal.

Isso ajudou a direcionar a escolha de carreira do Brás como escritor de obituários, pois nela ele precisa descrever como foi a vida da pessoa que faleceu, o que ela fez, que marcas deixou.

O nome do Brás tem relação direta com Brás Cubas, assim como seria um nome que um apaixonado por literatura daria a seu filho. Os livros do Saramago, Ensaio sobre a cegueira e Intermitências da morte, principalmente, também influenciaram muito essa escolha por contar algo totalmente corriqueiro com um elemento surreal e ver para onde a história nos leva.

Acho que também fomos influenciados por poesia e música, pelas letras do Cartola, Vinícius, Tom Jobim, Chico Buarque. Elas sempre trataram do homem comum, da mulher, dos encontros e desencontros. Isso está muito enraizado na cultura brasileira e marca muito o tipo de história que gostamos de contar.

Moon: Além disso, lemos vários livros do Hemingway para buscar uma voz do narrador, uma escrita em inglês que fosse mais natural, cotidiana, falando do homem comum, de coisas corriqueiras.

Era preciso interiorizar o pensamento direto em inglês para escrever a história, para usar a língua da melhor maneira possível. Dá, também, para ver algumas influências da maneira de escrever do Neil Gaiman, da qual eu gosto muito.

UHQ: Vocês lidam o tempo inteiro com a morte no álbum. O tema os fascina?

Moon: Somos mais fascinados pela vida, pela importância dos eventos cotidianos e as relações entre as pessoas. A morte, por ser um ponto final na vida de alguém, é um elemento que cria essa reflexão sobre o significado e a importância de uma vida que acabou e, ao mesmo tempo, sobre as outras vidas que continuam. É como um lápis que você usa sem prestar atenção que existe. Você está pensando no que está escrevendo ou desenhando. Você só presta atenção no lápis quando ele quebra.

UHQ: O quanto de pesquisa houve para retratar várias regiões do País, com tanta diversidade, para mostrar aos norte-americanos? Como foi esse trabalho?

De Tales

Moon: A diversidade de regiões do Brasil não foi uma meta, e sim uma consequência da história que queríamos contar, do que a mudança de cenário poderia acrescentar à trama, ao personagem, à jornada. Houve uma grande pesquisa visual, baseada em fotos dos lugares retratados, e ajuda muito o fato de tirarmos muitas fotos de todos os locais que visitamos.

: A internet ajuda bastante também na pesquisa visual.

Moon: Para o capítulo que se passa em Salvador, por exemplo, fizemos uma viagem específica para pesquisar e recolher imagens e informações na tentativa de conseguir uma autenticidade igual à dos capítulos que se passam em São Paulo.

No momento em que assinamos o contrato, sabíamos que precisávamos ir para Salvador no dia 2 de Fevereiro, dia de Iemanjá, e então marcamos a viagem antes mesmo de começar a escrever o roteiro, de saber como exatamente a história usaria os elementos pesquisados, pois só teríamos aquele 2 de Fevereiro disponível durante a produção do livro.

: A diversidade de cenários é um atrativo também para o público brasileiro, pois temos várias realidades num país tão grande. Nossa história se passa em São Paulo, é urbana, mas passeia por um sítio no interior e por praias e dunas. Pode acontecer com qualquer um. Este é o vocabulário que o Brasil nos oferece, mas o mais importante sempre foi contar uma boa história.

UHQ: Alguma percepção de como os estrangeiros viram o Brasil que vocês retrataram?

Moon: Acho que alguns elementos ou situações da história podem parecer um pouco exóticos, mas acho que não é isso que chama mais atenção. Acho que houve uma grande identificação com o que os personagens sentem em diversas situações, o que é um sinal de que, por mais diferente que seja o cenário ou a realidade retratada, ela foi passada com uma sinceridade que transparece e é facilmente reconhecida. Então, o Brasil entra somente como um tempero a mais, um mundo novo, mas familiar, no qual o leitor é seduzido e convidado a explorar, muitas vezes da mesma maneira que o personagem principal.

UHQ: Já deu pra ter a noção de que os prêmios de Daytripper no exterior podem ser um divisor de águas para roteiristas brasileiros publicarem nos Estados Unidos - algo que nunca acontecia?

: Divisor de águas acho que é, pois nunca foi feito, mas não facilita em nada a entrada de roteiristas no mercado norte-americano e não vejo resultados tão a curto prazo, pois é um processo muito longo, que não tem nada a ver com o país de onde você veio.

Moon: O que acho mais importante, que é realmente um divisor de águas, é que mostramos que pode ser feito, que não é impossível. Acho que isso incentiva o autor nacional, incentiva o mercado nacional, e inspira outros a tentarem, a darem o seu melhor e a darem a cara a bater.

UHQ: No Twitter, vocês institucionalizaram o #foda em seus posts. E colocaram isso na HQ. Os norte-americanos sabem o que significa?

Moon: Eles não sabem o que isso significa, e acho que em inglês não teria essa mesma dualidade de poder ser algo muito legal ou algo horrível.

5

Em inglês, acho que parece só um palavrão. Foi uma das primeiras palavras em português que ensinamos à Becky Cloonan e ao Vasilis Lolos enquanto estávamos produzindo a 5, pois era um jeito de mostrar o entusiasmo em relação aos projetos que estávamos fazendo juntos. E, ao mesmo tempo, ensinávamos palavrões em português (os gringos sempre querem aprender, ou os brasileiros sempre querem ouvir gringos falando palavrões com sotaque).

Depois do FIQ de 2009, quando a Becky e o Vasilis vieram para o Brasil, usamos tanto entre nós nas palestras e entrevistas, que acabou virando a palavra desse entusiasmo, desse momento, e acabamos esquecendo o quanto, de fora, isso pode ainda soar somente como um palavrão.

No Daytripper, aconteceu por acaso, pois eu e o Bá queríamos colocar um caminhão de entregar da FedEX na história, mas tive que mudar o logo, e já que tinha que inventar um novo, escolhi um que também começasse com "F": FODA Entregas. E acho que a Becky acabou colocando um caminhão da FODA Entregas num número da série Demo.

UHQ: Em trabalhos próprios, vocês quase sempre optaram por contar histórias que vivenciaram. Como foi trabalhar com um personagem fictício?

Moon: O personagem fictício não te afasta das histórias que você vivencia e vice-versa. Já criamos personagens para contar histórias que aconteceram conosco e já contamos histórias inventadas nos colocando como personagens, quem acompanha nossos livros 10 Pãezinhos vê que somente no Crítica temos histórias em que somos personagens.

Acho que o fato de nós sermos praticamente os únicos personagens que aparecem em mais de uma das nossas histórias dá essa sensação de que contamos histórias que vivenciamos, mas a maioria das nossas histórias transita mais no campo da ficção.

Numa história mais longa, como Daytripper, facilita criar um personagem do zero, pois ele se revela aos poucos e o leitor vai descobrindo a história ao mesmo tempo em que vai querendo conhecê-lo melhor.

UHQ: Não é toda hora que temos uma HQ feita exclusivamente por autores brasileiros publicada primeiro nos Estados Unidos (e com sucesso!) e depois lançada aqui. Como analisam isso?

Moon: As histórias de super-heróis desenhadas por brasileiros para fora têm sido lançadas primeiro nos Estados Unidos e depois aqui há anos, e acho que foi isso que nos atraiu ao mercado internacional.

Mas a natureza do nosso trabalho, mais autoral, acabou nos direcionando para outro caminho, tanto aqui como lá fora, o dos trabalhos mais independentes. E são eles que acabam chamando a atenção das editoras que eventualmente podem publicar seu trabalho.

Fizemos fanzines aqui no Brasil, e essa produção acabou chamando a atenção de editoras nacionais. Assim, além dos nossos projetos independentes, começamos a publicar por editoras. Nos Estados Unidos, acabamos fazendo um pouco disso também, lançando projetos independentes, como a Rock'n'Roll, a 5 e a Pixu, que chamaram a atenção de editoras maiores e nos ajudaram mais nos projetos futuros do que só ficar mostrando portfólios.

: Acho que mostramos que esse movimento de produção independente, seja aqui ou no mercado exterior, surte resultado. A Mesmo Delivery, do (Rafael) Grampá, foi lançada primeiro independente lá fora. As revistas do Gustavo Duarte, , Taxi e Birds foram feitas de maneira independente e lançadas primeiro lá fora, e acho que talvez o próximo passo seja essa produção chamar a atenção de editoras dos Estados Unidos (como já aconteceu com o livro do Grampá, que foi relançado pela Dark Horse) e termos mais autores publicando álbuns antes lá, o que pode ser uma realidade com mais visibilidade e um pouco mais atraente financeiramente.

Rock'n'Roll

Moon: Acho que fazemos um esforço para que nossos trabalhos nos Estados Unidos também sejam publicados aqui no Brasil, pois temos interesse em estabelecer esse mercado nacional de quadrinhos, em contribuir com boas histórias, e espero que os livros continuem disponíveis em dez anos, pois, no final das contas, em dez anos (ou mais) não fará diferença onde foi publicado primeiro.

Confira abaixo os diversos eventos de lançamento de Daytripper, com a presença dos autores.

Quarta-feira, 28 de setembro, na Livraria Saraiva do Shopping Ibirapuera, em São Paulo/SP, a partir das 19 horas.

Sábado, 1º de outubro, na Itiban Comic Shop, em Curitiba/PR, a partir das 18 horas.

Sábado, 8 de outubro, na RV Comics, em Salvador/BA, a partir das 17h30min.

Bá e Moon também estarão presentes na Fest Comix, no Pixel Show, na Rio Comicon e no FIQ.

Daytripper é um lançamento da Panini Comics.

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