Na Trilha de Masamune marca o retorno de Saidenberg aos quadrinhos
Luiz
Saidenberg é apaixonado pela nona arte, mas há muito tempo não trabalhava
no meio. Com exceção de um rápido retorno em 1979, quando atuou na Grafipar
por um ano, o autor ficou ausente durante quatro décadas, se dedicando
à publicidade.
"Em 1963, após a lamentável experiência da CETPA, de Porto Alegre,
entrei para a agência McCann, de São Paulo para fazer storyboards
com Lyrio Aragão. De lá passei a outras agências, e de ilustrador a diretor
de arte", orgulha-se.
Nesta área, sua carreira foi muito bem-sucedida, chegando a ganhar o Leão
de Ouro no Festival de Veneza em 1977, pelo filme Último
Posto, para a Fiat. Após 36 anos na publicidade, se aposentou
em 1998 e, em 1999, pediu demissão da Logullo, sua última agência.
Agora, em 2003, a Opera
Graphica lança Na Trilha de Masamune, o trabalho que marca
o seu retorno aos quadrinhos. O Universo HQ conversou com Saidenberg
sobre este novo projeto e, quem sabe, futuros lançamentos.
"Masamune
começou, mesmo, há vários anos. Em 1988 comecei a estudar filosofia e
artes marciais orientais. Era também a época do surgimento das exuberantes
graphic novels. Entusiasmado, resolvi fazer umas experiências,
e o gênero que me pintou foi samurai", relembra.
Tudo isto foi muito antes da febre dos mangás. Fiz tentativas, mas a experiência
ficou por ai", continua o criador. "Em 2002, recebi o Prêmio Angelo
Agostini como mestre da HQ nacional, e voltei a rever e contatar meu
pessoal da velha guarda. Shimamoto e Canini me incentivaram muito a continuar
desenhando e mandei ao Carlos Mann (editora da Opera) as páginas
de samurai e outras amostras. Ele achou ótimo e já queria publicar, se
eu tivesse algo pronto".
Mas Luiz Saidenberg não tinha. Entretanto, era uma boa oportunidade para
voltar a produzir algo. "Depois de aposentado havia retornado aos storybords
e ilustrações para propaganda e, no início de 2003, tive um período longo
sem trabalho. Não podia perder o gume, e comecei Masamune", explica.
Na Trilha de Masamune levou três meses para ficar pronto, com algumas
interrupções. O álbum tem 40 páginas de histórias, e envolveu ainda pesquisas
e documentação. "Deu um senhor trabalho, mas era um desafio!", empolga-se.
E
ao ler a história, percebe-se o quanto a pesquisa foi importante. Além
de explorar a cultura japonesa, são contados fatos históricos da Europa,
principalmente Espanha. "Acho importante que fatos históricos, se cabíveis
e interessantes, bem como folclore e lendas sejam passados ao leitor.
Shimamoto mostra bem isto quando, em Musashi # 1 (também da Opera
Graphica), coloca algumas fábulas zen. Elas dão uma maior profundidade
ao samurai, além da violência brutal", analisa Saidenberg.
E para isso é preciso ler bastante, algo que o autor sempre gostou de
fazer. "Tenho gosto variado, muda com a época. Na minha fase zen, só lia
orientalistas, Herrigel, de O Arqueiro Zen, Allan Watts e Taizen
Dashimaru", enumera.
"Depois passou. Li muito Hemingway, Scott Fitzgerald e Hermann Hesse.
Dos nacionais, Veríssimo, Marque Rebello, João Antonio e João Ubaldo Ribeiro.
Os latinos Cortazar, Jorge Luis Borges, Garcia Marques e Vargas Lhosa.
Houve tempo em que lia tudo que me caia nas mãos. Hoje, tenho pouca paciência",
admite.
Como fica claro, Júlio Shimamoto é muito amigo de Saidenberg. Por isso,
foi homenageado em Na Trilha de Masamune como Shoey Yoshimoto,
o protetor da lendária espada de Masamune.
Mas
não apenas ele serviu para retratar personagens da trama. "Coloquei o
falecido Lyrio Aragão como o guia Arellano. Era o pseudônimo que ele,
descendente de espanhóis, usou em várias de suas histórias. Achei que
o Aragão seria um digno representante daquelas terras, como se fosse o
espírito do lugar. Usei ainda figuras da propaganda, como Sylvio Lima,
no papel de D.Quixote, e Ruben Sampaio, como o Padre Del Mayo".
"Meu irmão Ivan, por muitos anos roteirista da Editora Abril, fez
uma ponta como o espectador que informa ao herói sobre os yakuzá. E o
grotesco vilão José Hernando foi baseado num péssimo caráter da minha
juventude quadrinhística", descreve.
Como terá sido voltar aos quadrinhos após tanto tempo? "Foi uma experiência
redentora, um grande desafio e uma enorme emoção de ver que, sim, ainda
sou capaz, mesmo depois de tanto tempo!", comemora o autor.
E, no que depender dele, é possível que novos projetos surjam por aí.
"Não penso em ficar só nisto, aprendi bastante com Masamune, e
a idéia é continuar aprimorando desenho e redação. Tinha pensado em fazer
uma continuação da obra, mas não sei se restaram elementos para isso.
Bom, estou de antenas ligadas, pronto para o que aparecer".
E tomara que apareça logo.