Religião Disney é tema de curso em universidade
Cultuar
personagens como Pato Donald, Tio Patinhas e Mickey pode não ser apenas
força de expressão para definir a paixão dos fãs de personagens da Disney.
Essa é uma das conclusões que pode ser tirada das aulas de Religião
e Disney: Não é só mais outro curso sobre Mickey Mouse, ministrado
neste mês de janeiro por Jennifer Porter, pesquisadora e professora de
estudos religiosos da Memorial University, no Canadá.
Em maio do ano passado, Porter teve uma epifania ao visitar a Disneylândia.
"As produções do parque temático, a exibição de fogos de artifício e assim
por diante, sempre envoltos em um conto de moralidade e uma exigência
para os expectadores acreditarem no poder do bem e dos desejos", explicou
ao site jornalístico Canada.com. "Isso afeta o público da Disney?
Isso afeta como eles vêem o mundo?", questiona a pesquisadora.
Quando ministrava uma de suas aulas (que combinam religiosidade e ícones
da indústria do entretenimento, como Jornada nas Estrelas e Buffy,
a caça-vampiros - que a professora define como uma versão feminina
de Jesus Cristo), foi debatido um crossover entre Star Trek
e Disney. Na ocasião, um aluno afirmou que, caso o camundongo Mickey
se vestisse como um cavaleiro Jedi, ele seria considerado uma figura canônica.
"Causou estranheza, a mim, alguém comentar que produtos da Disney
deveriam ser canônicos. Isso chamou minha atenção", disse Porter ao Canada.com.
Foi então criado o curso que versa sobre a vida e a fé de Walt Disney
e seu esforço consciente para excluir o cristianismo de seus desenhos
animados, colocando elementos sobrenaturais (fadas, bruxas etc.). Nas
aulas, além de outros assuntos relacionados, ela também comenta as produções
que denotam pluralidade de crenças e religiões (Pocahontas, Hércules
e outras animações).
No final do ano passado, a professora concedeu uma entrevista ao portal
brasileiro de notícias G1.
"Muitos fãs são extremamente devotados, e essa devoção se expressa de
diversas maneiras, desde assistindo aos filmes da Disney, passando
por visitar os parques temáticos, comprar os produtos relacionados, ler
as biografias e histórias de (Walt) Disney até conversar com os amigos
sobre o que Disney significa para eles. Para alguns, seu nível de comprometimento
determina a própria maneira de eles se definirem, seus relacionamentos
e seu entendimento sobre a natureza do mundo a seu redor", disse ao jornalista
Diego Assis. "Quando algo atinge um nível de importância que molda nossa
compreensão do que significa ser humano, fazer parte de uma comunidade
de pessoas com as mesmas crenças, e molda nosso entendimento do universo
a nosso redor e de como o mundo é e deveria ser, então esse algo se torna
religioso. E penso que Disney preenche esse papel para alguns fãs, ainda
que certamente não para todos".
Questionada pelo repórter se é possível encontrar alguma espécie de "profeta"
na religião disneyana, Jennifer Porter respondeu: "Acredito que,
no caso de Disney, o 'personagem' central, se preferir, é o próprio Walt
Disney. Os fãs o idealizam como um artista, filósofo e homem de negócios,
e ele se tornou um modelo para muitos fãs tentarem seguir. Você se lembra
de uma campanha, anos atrás, que perguntava às pessoas para medirem suas
ações perguntando primeiro 'o que Jesus faria'? (nota do UHQ: What
Would Jesus Do?, campanha de apelo religioso, mas, na prática, bastante
lucrativo, que foi iniciada nos Estados Unidos, em 1996, e até hoje vende
produtos com essa frase impressa). Bem, acho que, para muitos fãs fiéis,
a questão central seria 'o que Walt Disney faria'?".
Ela também acredita que produções contemporâneas, como High School
Musical e Piratas do Caribe, são transitórias e não os "novos
messias". Personagens como Mickey e Pato Donald continuam fortes e exprimem
melhor uma visão nostálgica da América que estaria no coração da Disney.
Há quem acredite exatamente no contrário. Ou seja, as novas criações da
Disney vêm ganhando mais espaço e admiradores nos Estados Unidos
e no resto do mundo, em detrimento dos personagens clássicos que, há quase
80 anos, povoam as revistas em quadrinhos, mídia na qual os atuais ícones
são apenas visitas.
Mas, como religião é assunto para especialistas, resta a Jennifer Porter
a tarefa de resolver essa "cisma".