Confins do Universo 216 - Editoras brasileiras # 6: Que Figura!
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As Verdadeiras Mulheres-Maravilha

1 dezembro 2001

Geralmente, quando falamos de personagens femininas, no universo das histórias em quadrinhos de super-heróis, temos sempre algumas "figurinhas carimbadas": Mulher-Maravilha, Elektra, Mulher-Gato, Vampira, Mulher-Invísivel, Fênix, Tempestade, Caçadora, Batgirl, Supermoça, Tróia...

Lois Lane e Super-HomemO que há em comum, entre elas? Ou têm poderes e/ou habilidades físicas acima do considerado normal e as usam em prol de um bem maior - até mesmo a Mulher-Gato tem feito isso, principalmente durante a saga Terra de Ninguém, quando saiu numa missão em nome de Batman - ou destacam-se por sua ousadia e coragem, ao atuar em uma área prioritariamente ocupada por homens ou adolescente masculinos, no caso de grupos como a Justiça Jovem ou os Novos Titãs, em início de carreira. Tudo bem que nesses grupos a presença feminina sempre foi marcante, mas as mulheres, em menor número, acabavam tendo seu valor obscurecido por seus pares masculinos. Quase sempre.

Apesar de achar essas personagens atraentes, ainda prefiro aquelas sem poderes, que, apesar de não estarem presentes no momento de se jogar na frente de um caminhão que voa em direção ao seu companheiro de equipe, são as reais motivadoras das ações desses heróis.

Mulheres como Lois Lane (Super-Homem), Mary Jane Watson-Parker (Homem-Aranha) e Katherine "Kit" Ryan (John Constantine) são, em minha opinião, os maiores exemplos dessa estirpe de personagem. Kit, mesmo não sendo um exemplo presente em histórias de super-heróis, está sendo citada aqui pelo fato de ter mostrado ao leitor um lado humano que, até então, John Constantine não havia nos apresentado.

Mary Jane Watson-Parker, em seu primeiro encontro com Peter ParkerMJ talvez seja, ao lado de Lois, aquela que mais tem influência sobre seu par, o fotógrafo Peter Parker. Acho que uma das primeiras vezes em que vi isso acontecendo foi na já clássica mini-série A Última Caçada de Kraven. Quem conhece a história deve se lembrar muito bem que, depois de passar duas semanas enterrado no cemitério de Kraven, fortemente sedado, o Homem-Aranha ganha forças para sair de seu túmulo repetindo o nome "Mary Jane" de forma incessante. Sua vontade de sobreviver naquele momento se alimenta, quase que exclusivamente, da esperança de ver sua esposa novamente. (Nota do autor: na época em que a mini-série foi editada no Brasil, a edição que mostra o casamento de Peter & MJ ainda não havia saído por aqui. No entanto, pela cronologia aparente na época, eles eram, no mínimo, recém-casados. A Abril, provavelmente, adiantou o lançamento da obra e suprimiu esse fato da mesma.)

Capa do clássico Amazing Spider-Man #31, início da história Se Este For o Meu DestinoEngana-se quem pensa que a Tia May é a mulher mais importante da vida de Peter. Ela já foi, sim, o centro das atenções do herói, o que proporcionou grandes momentos para o mesmo, principalmente em seus primeiros tempos. Afinal, quem não se esquece de um Homem-Aranha que lutava desesperadamente contra toneladas de destroços que o cobriam, só para poder levar um remédio para a amada tia? Isso aconteceu em Se Este For Meu Destino, de Stan Lee e Steve Ditko, um dos clássicos do aracnídeo em todos os tempos, que foi republicada por aqui em Spider-Man Collection nºs 7 e 8.

É claro que eu não poderia escrever uma coluna sobre mulheres sem poderes nos quadrinhos de heróis sem falar de Gwen Stacy. Afinal, Gwen foi uma personagem de extrema importância, não apenas para a cronologia do Homem-Aranha, quanto para o mundo das HQs como um todo.Ela foi a primeira personagem realmente importante a ser morta nos quadrinhos de heróis, em um período onde isso não acontecia a toda hora e nem era apenas um pretexto para determinado título vender mais do que o habitual. Nem mesmo era usado como a desculpa perfeita para, meses depois, retornar com o dito morto, dando uma explicação - algumas vezes convincente, mas na maioria furada - sobre sua "miraculosa" volta do Mundo dos Mortos. E haja edições especiais de funeral, além-vida, retorno...

Gwen StacyInfelizmente, a morte de Gwen Stacy gerou tanta comoção - Marcelo Castillho Avellar, crítico de HQ do jornal O Estado de Minas, escreveu anos atrás: "Nunca tanta gente parou de ler quadrinhos quanto naquela época. Todos adoravam Gwen" - que a Marvel acabou sentindo-se na obrigação de trazê-la de volta, através de seu clone, o que gerou toda uma série de complicações, que todos os leitores do Aranha conhecem.

De qualquer forma, a geração recente de leitores do Cabeça de Teia pouco conhece sobre Gwen. MJ está casada com Peter Parker há tempo suficiente para obliterar sua imagem das mentes dos novos fãs. O engraçado é que, desde o começo, nos idos anos 1960/70, quando a ruiva fez suas primeiras aparições, como a vizinha misteriosa da qual o jovem Peter Parker corria e, mais tarde, como a festeira colegial, ela já se mostrava uma personagem forte, carismática e prometia alcançar um lugar de destaque na vida do Aranha.

Amazing Spider-Man #121, edição da morte de Gwen Stacy.O casamento dos dois, anos depois, apesar de ter surpreendido quase todos os leitores, já que naquela época pouquíssimos heróis se "amarravam" - que eu me lembre, só o Homem-Animal o era, mas então ele ainda era um desconhecido personagem de segunda, pois apenas começava a passar pela reformulação sofrida nas mãos de Grant Morrison. Isso acabou trazendo uma dinâmica maior para a vida do Homem-Aranha.

Coincidência ou não, depois de casado, o Aranha enfrentou alguns de seus maiores desafios e, na grande maioria deles, foi a força vinda de MJ a principal responsável pela superação dos mesmos. Novamente, não me remeto à fase "novela mexicana" atual, mas à anterior, onde tivemos sagas como Tormento.

Aliás, a fase atual do Aranha e a credibilidade dos quadrinhos hoje em dia andam tão em baixa que MJ foi "morta" e ninguém protestou, rasgou seus gibis ou deixou de comprá-los. Pelo menos não por esse motivo. Talvez prevendo que ela logo voltaria, como já ocorreu nos Estados Unidos. Ao abandonar os títulos do Aranha, Howard Mackie (Nota do autor: Aleluia!) resolveu amarrar todas as tramas deixadas soltas ao longo de seus anos no título e trouxe a ruiva de volta.

Falando em heróis casados, não poderíamos nos esquecer do maior símbolo da DC, o Super-Homem. Confesso que nunca fui muito fã do personagem, em parte pelo fato dele ter passado por sofríveis equipes criativas nos últimos anos, o que tornou a maioria dos acontecimentos significantes em sua vida - morte, retorno, casamento - verdadeiras histórias feitas sob encomenda para vender mais do que o normal, os populares "caça-níqueis".

O casamento de Clark Kent com Lois Lane foi apenas um acontecimento natural na vida do herói. A maioria de seus fãs sentia, que, dia mais, dia menos, isso acabaria acontecendo. E, na minha opinião, foi uma decisão acertada, independente da forma como foi feita. O evento serviu para mostrar mais ainda a força de Lois Lane como personagem de destaque, e a decisiva influência que ela exerce sobre a vida do herói. Até mesmo a atual fase de problemas conjugais que ambos enfrentam tem sido muito bem aproveitada pela atual equipe de criação do herói, parecendo-nos algo mais palpável do que a maioria das situações mostradas nos quadrinhos de heróis em geral.

Ora, venhamos e convenhamos, nem a mais forte das mortais conseguiria manter uma vida conjugal com um herói no nível do Super, certo? Suas aventuras, seus desafios e as batalhas em que se envolve são grandes demais, despejando uma enorme carga emotiva sobre as pessoas que o amam, especialmente sua esposa. Mesmo assim, Lois ficou firme, continuando a ser a mesma mulher forte da época de solteira, não vivendo à sombra do marido, como poderia ser o esperado. Novamente, ponto para a equipe liderada por Jeph Loeb, que a cada dia mostra ter sido a escolha mais acertada para assumir as rédeas criativas do Super-Homem.

Kit Ryan é outra dessas mulheres fortes. Não tem o carisma de MJ, a ternura de Gwen e nem é tão querida pelos leitores quanto Lois Lane. No entanto, merece ter destaque como a personagem que fez o fanfarrão John Constantine chorar como um bebê pelo seu amor. O homem que um dia enganara o demônio vagou por cerca de um ano pelas ruas de Londres, bebendo e bebendo sem parar, dormindo em becos, vivendo de esmolas, sem se importar consigo mesmo ou com qualquer pessoa, apenas porque não tinha mais uma mulher do seu lado.

Katherine RyanMéritos para Garth Ennis, criador de Kit. No pouco tempo que permaneceu no título John Constantine: Hellblazer, ele escreveu algumas das maiores histórias do personagem, criando uma fantástica mitologia ao redor dele e trazendo-nos personagens memoráveis, como Ellie ou o Esnobe. Dentre eles, a de maior destaque foi mesmo Kit. O interessante é que, nas poucas edições em que aparece, ela sempre é mostrada como uma mulher forte, decidida, dona de si. No começo namorada de Brendan Finn, larga-o quando ele começa a abusar da bebida que acabaria matando-o.

Mais tarde aproxima-se de Constantine e diz que ficaria com ele até o dia em que "a merda em que ele estava sempre se envolvendo" a alcançasse. Nesse dia, o abandonaria. E foi o que fez, levando John à fossa mais negra em que poderia se meter, talvez superior mesmo à decorrente dos eventos em Newcastle.

No entanto, isso não quis dizer que ela sairia de vez da vida do mago inglês. Não! Ela voltou para um último adeus no arco final de Ennis no título. Não só isso, como estrelou uma edição especial (Hellblazer: Pátria Amada), onde Ennis nos mostra seu passado desconhecido e entendemos o porque dela ser uma mulher com caráter e personalidade tão fortes a ponto de mexer muito com a cabeça de um homem aparentemente frio como John Constantine. Infelizmente, confesso, não sei que fim Kit levou após a saída de Garth Ennis de Hellblazer, mas creio que ela não mais foi aproveitada, o que é uma pena...

Enfim, o que une todas essas mulheres, e o que as torna atraentes é justamente essa influência extremamente forte que exercem perante seus companheiros, heróicos ou nem tanto. São delas que eles tiram forças para continuar, e são a elas que recorrem quando se encontram perante algum dilema. E são elas seu conforto após as batalhas de cada dia.

É esse o aspecto que considero mais marcante, que mais aproxima esses personagens de nós, pessoas reais. Quantas vezes passamos por situações miseráveis, algumas desesperadoras, e conseguimos superá-las apenas contando com uma palavra de apoio ou com a perspectiva de, ao fim do dia, estarmos com a pessoa que faz tudo aquilo valer a pena? Sem isso, aposto que alguns de nós, inclusive esses super-heróis, desistiríamos mais facilmente dos desafios que nos são impostos a cada dia.

Rodrigo "Piolho" L. Monteiro, escreveu esse texto como uma homenagem a todas as mulheres e, mais especificamente, para sua namorada, que brigou feio com ele. Esperamos que ela, ao ler esse texto, dê um desconto ao rapaz...

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