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Hank Ketcham tinha o dom de entender a infância

1 dezembro 2001

Hank KetchamMuita gente grande já escreveu ou disse coisas bonitas sobre a infância. Acho que foi Madre Tereza que, um dia, falou que são as crianças os maiores mestres da humanidade. Mas... mestres como? O que, realmente, estas pessoas queriam dizer? Quantas delas realmente conseguiram entender a infância?

O que muito adulto tende a fazer é esquecer a infância que teve, e tratar as crianças como, simplesmente, o futuro de qualquer coisa. Mas qualquer criança sabe que infância não é futuro de coisa alguma, mas um momento presente e consciente de alguém que existe agora, e percebe, muito bem, o que está acontecendo à sua volta neste exato momento, sendo certo ou errado, bom ou ruim.

O primeiro encontro de Lucas com Dennis, no traço de Marcus Hamilton
Marcus Hamilton, um dos desenhistas que ajudaram a perpetuar a criação de Hank Ketcham, mostrou, em 1998, que Dennis e Lucas tinham muito em comum

Falar da infância não é tão simples, como pode parecer à primeira vista. Por que isso significa falar do ser humano em sua maior amplitude. Sem tantas poses, máscaras sociais e artificialismos impostos pela vida. Nós, adultos, tão cheios dessas mesmas poses de sabe-tudo da vida, não sabemos lidar tão facilmente com o ser humano em estado puro e, quase sempre, metemos os pés pelas mãos. Ou, simplesmente mentimos para nós mesmos, idealizando sobre o único momento em nossas vidas em que fomos, simples e exatamente, quem nós nascemos para ser.

Hank Ketcham foi uma dessas pessoas iluminadas, que soube falar da infância com toda sinceridade, humildade e humor devidos. Sinceridade para expressar seu amor pelo gênero humano, que o Dennis representou todo este tempo. Humildade para reconhecer como somente um ser humano em estado de infância seria capaz de escrever o que o Pimentinha dizia. E fazer como ele fazia tudo na vida, sem autocensura, sem castrações, sem poses ou máscaras e com tanta fé no futuro, na humanidade e em sua capacidade de crescer e vencer desafios - eis a maior lição da infância, talvez (afinal, são tantas). E bom humor, pois somente a criança ainda acredita - pergunte a qualquer menino gordinho de condomínio ou com fome na rua - como é gostoso jogar bola, lambuzar-se de manga, atirar com estilingues, empinar pipas, etc, etc, etc...

Dennis encontra Lucas, nas tiras de Fala Menino!
O "cartão de visitas" de Luis Augusto para se apresentar a Hank Ketcham foi esta tira, na qual Lucas contracena com Dennis

Dennis, que não envelhecia, feito Peter Pan, com seus eternos cinco anos e meio de idade, nunca deixou de acreditar que, um dia, seria capaz de entender os adultos, de desvendar todos os mistérios, de entender as meninas - talvez fosse esta a sua única certeza menos certa, mas quem o culpa? Dennis sequer entendia a si mesmo!

O que ele sabia, realmente, é que queria ser feliz e se divertir com todos de quem gostava. Seus pais, Joey, Tonny, Margareth, Gina, Ruff e, principalmente, seu vizinho, Sr. Wilson, eterno representante daqueles que vivem resmungando a juventude perdida e acreditam que, junto com ela, acabaram todas as suas razões para crescer. Pobre George Wilson... Pobres dos Georges Wilsons que envelhecem tão "capitãoganchamente" em nós...

Lucas, da tira Fala Menino, e Dennis, o Pimentinha
Lucas abraça Dennis, numa bela homenagem a Henk Ketcham

Hank Ketcham era da mesma geração que nos deu e levou Charles Schulz, Dennis era um ano mais novo que Charlie Brown. E, enquanto o Minduim desbravava as neuroses e ansiedades humanas, o Pimentinha brincava nos playgrounds. Ele ainda não havia envelhecido para tanta "adultice" - por mais fantásticas que sejam algumas dessas coisas de "gente grande". Ele não tinha tempo par isso, tinha mais o que brincar. E, brincando, fez o adulto questionar a si mesmo e a, nostalgicamente, perceber como dói manter quieto o Pimentinha que nunca desaparece de dentro da gente, por mais que a gente finja ou faça cara feia. Nós precisamos dele, feito o Sr. Wilson.

Mas Dennis sempre estará aqui. Como Charlie Brown e sua gangue. O Pimentinha está em cada rua de cada cidade. Brincando, rindo e fazendo barulho. Dennis estava comigo quando conheci o Lucas e estará comigo quando meus filhos apresentarem o Lucas aos filhos deles. Porque Dennis é uma criança de verdade, como poucas que há no papel. E criança é a alma do ser humano e, como esta, Dennis, o Pimentinha é eterno.

Longa vida a Hank Ketcham. Fabuloso!

Luis Augusto Gouveia sempre foi fã confesso do trabalho de Hank Ketcham. Em 1998, quando o "pai" de Pimentinha conheceu Lucas (da tira Fala Menino!), gostou muito e mandou um comentário tão singelo quanto significativo: Fabulous! Uma prova da admiração do autor baiano por Dennis são os personagens Caio (repare no cabelo dele) e Mateus (note o figurino do garoto), que homenageiam visualmente o eterno Pimentinha.

Fala Menino! com o personagem Caio
Caio
Caio tem o rosto e o cabelo muito parecidos com Dennis
Mateus
Não à toa, Mateus veste-se como Dennis, o Pimentinha
 

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