Confins do Universo 216 - Editoras brasileiras # 6: Que Figura!
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Matérias

Histórias sem fim

2 março 2002

Amazing Spider-Man #30Uma linha de discussão que tive há pouco tempo com um conhecido: títulos com personagens carismáticos (super-heróis, principalmente, para não citar tiras de jornais que continuam, geração após geração - Hagar, por exemplo, que passou de pai para filho), como Peter Parker, o Homem-Aranha, não acabam.

Parece óbvio demais para que se martele esse tema com freqüência, mas as editoras que monopolizam o mercado norte-americano e (inter) nacional de quadrinhos vivem dessas franquias intermináveis, que vêem pouquíssimas mudanças em sua existência. Ou mudanças reais.

Continuar com o Homem-Aranha como exemplo é fácil (e cômodo).

Sim, o sujeito casou, perdeu a filha, a tia, a esposa, recuperou uma ou outra para perdê-las de novo e assim continuamente. O gibi criado por Lee e Ditko, num mundo mais simples, para um público menos exigente, tornou-se um eterno pingue-pongue sentimentalóide e pseudodramático nas mãos de roteiristas como Howard Mackie (X?).

Há o conceito "inovador" de recomeçar a história do zero, atualizando-a, fazendo com que os eventos que originalmente aconteceram em 1963, passem-se em nossos dias (ou em 2000, para os norte-americanos), com um protagonista que não é mais fotógrafo, mas webmaster e, melhor ainda, esticando uma história que coube em 15 páginas para 160 ou mais. Moderno, certo?

Amazing Spider-Man #36Não estou discutindo a qualidade desse material, entenda, por favor. Li, por exemplo, o que J. Michael Straczinsky vem escrevendo em Amazing Spider-man e fiquei, ahã, "amazed", mas não tenho certeza de quanto tempo isso vai durar, de quanto fôlego o autor tem para dar ao personagem.

Por quê?

Porque sempre há o risco de os editores se esquecerem que estão lidando com histórias em quadrinhos e não com o mundo real, e acharem que a melhor atitude a ser tomada em relação a acontecimentos como os de 11 de setembro é fechar os olhos e esconder a cabeça num buraco e, como conseqüência, privar os criadores de liberdade para dar mais ângulos ao personagem, ousarem mais na construção da trama, no desenvolvimento da narrativa etc.

O que nos faz voltar à questão da franquia sem fim. Se não me engano, o processo deve ser similar ao que ocorre no Brasil.

Criar uma publicação de qualidade e mantê-la em banca demanda investimento. Não só em talentos, gráficas e distribuição. É necessário, por exemplo, que se invista em marketing, para que o público interessado nos assuntos abordados (histórias, reportagens, o que seja) saiba de sua existência e concretize o objetivo último da pessoa ou empresa que disponibilizou esse produto no mercado: que você o compre. Há também a necessidade de profissionalismo que resultará na permanência da revista hipotética nas prateleiras das bancas. Resumindo, há, como já foi dito, um investimento considerável, e as editoras não estão prontas a simplesmente perdê-lo sem tirar-lhe as últimas gotas de lucro.

Será que faço acusação e defesa simultâneas? Sim.

De qualquer forma, preste atenção:

A DC Comics descobriu uma fórmula para jogar nos dois times ao mesmo tempo. Ao invés de só criar marcas novas que durarão, sei lá, 40, 70 anos e que precisam ser reformuladas de tempos em tempos para manter o frescor (leia-se 'capturar a atenção do novo leitor'), a editora de Batman criou subdivisões que trabalham com segmentos diferentes (pero no mucho) do mercado de quadrinhos.

Starman: Sins of the FatherEnquanto há uma linha de quadrinhos de super-heróis que nunca morrem, mas "passam por mudanças", algumas traumáticas, outras nem tantas, dependendo, óbvio, do empuxo pretendido nas vendas das revistas, há também, paralelamente, uma outra linha de publicações chamadas "adultas", sob o selo Vertigo.

Esse selo serve, entre outras coisas, para publicar histórias de terror, crime, sátira política e afins. O "entre outras coisas'" e isso é interessante, é que depois de firmar uma nova marca no mercado, não há um interesse obsessivo em que a história não termine nunca, como ocorre com os super-heróis.

Há exceções, claro, como Sandman (o nome, parece, pertence à editora, não ao criador das histórias que terminaram tornando-se - e ainda são - um megahit), que tem spin-offs aparecendo o tempo todo. Preacher, por enquanto, não tem nenhuma outra pessoa, que não seu criador, desenvolvendo projetos envolvendo o nome da marca e seus personagens, assim como The Invisibles. Transmetropolitan acaba de entrar em seu último ano e já tem pelo menos dois spin-offs (que podem ser edições especiais ou mini-séries, neste caso específico) sendo discutidos na surdina, quase como boatos.

HitmanAlém disso, há mini-séries explorando não somente personagens estabelecidos nas cronologias dos títulos regulares, mas outros, criados, escritos etc por pessoas que detêm os direitos autorais e têm participação nas vendas.

Ainda me acompanhando? Pois bem.

O fenômeno das histórias com começo, meio e fim estendeu-se há pouco tempo para o universo de super-heróis DC: Starman, de James Robinson, encerrou-se há alguns meses. O detalhe interessante é a semelhança entre este título e Sandman. Mais uma vez, o protagonista e as situações da trama são criações do autor das histórias, mas o nome e boa parte dos personagens secundários pertencem à editora. Logo, um relançamento pode ocorrer a médio e longo prazo, com ou sem Robinson. Caso similar é o de Hitman, não exatamente um super-herói, mas situado na mesma continuidade que todos os personagens principais do Universo DC.

O que talvez não tenha sido dito é que essa diversidade de títulos, autores etc. é uma boa coisa para a casa publicadora. Sim, porque assim o leitor tem a prerrogativa de ler historietas com algo além de homens em roupas apertadas praticando boas ou más ações.

Não lembro de onde isso saiu, mas aí vai: "A variedade é o tempero da vida."

AliasSe serve para a vida, serve para a ficção, que nada mais é que imitação da vida (não me pergunte de quem). E a vida acaba.

Em tempo: Sei que a Marvel tem feito esforços consideráveis para criar uma linha de gibis adultos que pagariam direitos autorais ou participação aos criadores, mas até agora o único resultado que não tem como personagem principal um dos muitos pré-existentes é Alias. O detalhe: personagens do Universo Marvel circulam o tempo todo pela revista e a protagonista foi introduzida (ret-conned) como se já tivesse sido uma super-heroína de pouca visibilidade. O maior problema não é esse. O conceito de um detetive num mundo habitado por superseres já foi usado antes, inclusive pelo autor de Alias, no divertido Powers.


Abs Moraes garante que, se dependesse dele, muito super-herói teria sua carreira abreviada, para não ficar sofrendo nas mãos de roteiristas fraquinhos, fraquinhos.

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