Morreu o artista gráfico brasileiro Miécio Caffé
Por Sidney Gusman e Jal
O humor gráfico nacional sofreu uma grande baixa. Faleceu no dia 11 de março, aos 82 anos, vítima de complicações oriundas do Mal de Alzheimer, o artista Miécio Caffé, um mestre do traço, que fez muito sucesso nas décadas de 1950 e 60.
Os novos leitores de quadrinhos certamente jamais ouviram o nome de Miécio Caffé, mas ele ilustrou as épocas de ouro do esporte, da chanchada, do teatro de revista e dos cantores.
Miécio retratou tudo isso com mestria e um traço bico de pena espetacular.
Na Gazeta Esportiva, ele publicava uma página inteira em cores com as caricaturas de Eder Jofre, Pelé, Garrincha, Maria Esther Bueno, Ademar Ferreira da Silva e outros ícones do esporte. Aliás, Miécio foi o primeiro a caricaturar Edson Arantes do Nascimento, em 1958, quando o Brasil ganhou sua primeira Copa do Mundo, na Suécia.
No cinema e teatro fez cartazes de grandes títulos com Ronald Golias, Anquito, Otelo Zeloni, Zé Vasconcelos entre outros.
E na música, além de retratar cantores e cantoras de verdade, como Emilinha Borba, Francisco Alves, Orlando Silva, Francisco Alves, Vinícius de Moraes, Lupicínio Rodrigues, Elis Regina, Carmem Miranda, Maysa... era amigo deles. Era da turma de boêmios da Aracy de Almeida, e só para se ter noção de sua importância: João Gilberto sempre o procurava quando vinha para o Brasil, para dar-lhe um abraço.
Junto com sua esposa (já falecida) Dona Hedy, Miécio se tornou um dos maiores pesquisadores e colecionadores da música popular brasileira nos discos 78 rotações. O Museu da Imagem e do Som, na década de 1980, recebeu do artista seu acervo gigantesco, com praticamente toda a história da MPB, em sete mil discos. Em seguida, teve que contratar o casal (que descobriu como tirar chiados e fazer a difícil manutenção daquelas raridades) para fazer a curadoria daquele acervo. Coleções como a dos Grandes Compositores da MPB, da Abril, sempre contaram com a consultoria do grande pesquisador Miécio Caffé em seus fascículos, ao lado de nomes como José Ramos Tinhorão, Tárik de Souza, Zuza Homem de Mello e muitos outros.
Num belíssimo artigo no site da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo, o artista gráfico, desenhista de quadrinhos e jornalista Ruy Jobim Neto conta um fato curioso: em 1945, Miécio teria feito em 1945, sob a antiga assinatura, "De Siqueira", uma história em quadrinhos, intitulada Fu Manchu, completamente inédita. Estas páginas foram compiladas pela esposa Hedy, e depois encadernadas. Era uma HQ policial, com uma mistura de Alex Raymond (de Agente Secreto X-9 e Flash Gordon) com Chester Gould (de Dick Tracy).
Marca registrada de suas obras, sua assinatura era bastante peculiar, pois era calcada numa xícara de café, "com um 'fê' a mais e um acento aguado", como ele mesmo dizia. E seu talento e carisma eram tamanhos, que tornou-se uma quase unanimidade entre os grandes nomes dos quadrinhos e do humor gráfico nacional.
O enterro do baiano (de Juazeiro) Miécio Caffé Siqueira acontece hoje (12 de março), às 10h, no cemitério do Tremembé.