Músicos e escritores negros do Brasil vão virar quadrinhos
A atriz e pesquisadora Ângela Nenzi está encabeçando um projeto de grande relevância cultural: a coleção Cultura Negra e suas Antologias, que vai transformar músicos e escritores negros brasileiros em personagens de quadrinhos. O primeiro passo foi dado em 1998, quando ela lançou uma revista em quadrinhos (praticamente artesanal) sobre o compositor Wilson Moreira, seu marido e autor de sucessos como Senhora Liberdade.
Agora, o projeto foi retomado com uma nova edição que apresenta a vida e obra do compositor Nei Lopes. E a intenção é que os próximos números mostrem talentos como Carlos Cachaça, Paulinho da Viola, Zé Keti, Tia Doca da Portela, Lima Barreto e João Cândido, o Almirante Negro da Revolta da Armada, no início do século passado.
Nei Lopes está entre os nomes mais ilustres do samba e é autor de inúmeros sucessos e de livros importantes sobre cultura brasileira, em geral; e negra, em particular. Ele tem mais de 200 composições, com hits como Coisa da Antiga, Senhora Liberdade e Gostoso Veneno (parcerias com Wilson Moreira).
Curioso é que Ângela tomou esta iniciativa, por não se conformar em ver seus filhos fascinados pelos heróis de quadrinhos e desenhos animados importados. "Eu pensava que, se temos uma história tão rica, por que não contá-la a nossas crianças? Alguém tinha de tomar a iniciativa", declarou, numa entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.
Apesar de não ter conseguido um patrocínio para o projeto, Ângela continuou o trabalho, sem desanimar. Com o apoio da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ, que bancou a impressão de 3 mil exemplares, ela batalha para que as revistas sejam distribuídas nas escolas da rede pública.
Os desenhos da revista serão do cartunista Adail (na primeira edição, em 1998, o traço foi do artista Ikenga). A edição tem 32 páginas e custa R$ 5,00.
A revista começa com a infância de Nei Lopes, no bairro de Irajá, na zona norte do Rio de Janeiro, mostra a faculdade de Direito e as rodas de samba que freqüentava na juventude, os primeiros sucessos, sua passagem pela escola de samba Acadêmicos do Salgueiro e a fundação da Quilombo, com Candeia. No fim, há ainda um levantamento por ordem alfabética de suas músicas (mais de 250) e a discografia.
E Nei Lopes mostrou, numa entrevista ao Jornal do Brasil, que, além de gostar do resultado final, conhece (boas) histórias em quadrinhos. "Naquele tempo, nós chamávamos de gibi. O Príncipe Valente me agradava muito. Também lia Ferdinando e Nick Holmes", disse.
Ângela Nenzi promete continuar este belíssimo trabalho, mesmo que não consiga parceiros dispostos a ajudá-la. Mas vale o "convite" para que empresas analisem a idéia com carinho, notem a sua importância cultural e patrocinem o projeto.