Preço a toda prova
O ano que passou apenas confirmou algo que já vinha acontecendo há algum tempo: os preços aumentam, e está cada vez mais difícil comprar suas revistas prediletas.
Os primeiros sintomas estavam nas publicações da Metal Pesado/TEQ/Atitude. Apostando na linha Vertigo, o preço de suas revistas eram invariavelmente altos, em relação aos outros quadrinhos publicados naquele período. Hoje, R$ 5,50 virou preço comum, mas, na época, era uma grande diferença, se comparados aos formatinhos de R$ 2,30; ou especiais em formato americano de R$ 3,90.
O tempo foi passando, e a nossa economia, teoricamente, navegando em mares mais calmos, porém, isso não não impedia que, cada vez mais, as revistas tivessem seus preços remarcados. Foi quando a Editora Abril, tentando parar a contínua queda das vendas, resolveu reformular a linha de super-heróis. Todas as revistas foram canceladas e, em seus lugares, surgiram outras cinco, em formato americano, 160 páginas, papel couché e "qualidade nunca antes vista no Brasil", segundo as propagandas da editora.
Mas, junto com essas mudanças, veio também um aumento de preços que assustou. Em três meses, as revistas passaram de R$ 2,50 (maio/2000) para R$ 3,50 (junho/2000) e, posteriormente, a R$ 9,90 (agosto/2000). Uma diferença que, para o bolso dos leitores, não é das mais sadias.
Antes, eram ao todo doze revistas (excluindo Spawn e Conan), que juntas somavam 1150 páginas, pelas quais se pagava R$ 30,80, em março; e R$ 43,00 em junho/julho de 2000. Agora, são cinco títulos, 800 páginas, por R$ 49,50. E não podemos esquecer que são 250 páginas com onze histórias a menos, por mês!
Pela qualidade gráfica (indiscutível, diga-se de passagem) das Premium, o preço não é muito caro. Mas, devido ao poder aquisitivo do brasileiro, acaba fugindo de nossa realidade. Muitos leitores estão deixando de ler seu personagem predileto, por não poder comprar suas revistas.
Não é mistério a crise que assola o mercado de quadrinhos, no Brasil e no mundo, mas as editoras acabam correndo no sentido contrário, e aumentam os preços para tentar conseguir lucros maiores. Acontece que, com isso, mais leitores param de comprar, as vendas caem e as editoras voltam a elevar os preços para recuperar o prejuízo, e mais leitores param de adquirir as publicações... Percebeu a bola de neve que se forma?
Aí, pinta a velha comparação com o preço de revistas importadas. Ora! Quem compra essas edições ainda é uma parcela pequena, em comparação com o número total de leitores. Se as editoras começarem a apostar nesse público, as vendas cairão ainda mais.
Quer ver como ficaria uma comparação feita de maneira justa?
Uma revista americana, de 32 páginas, custa, em média, US$ 2,25. Convertendo, dá R$ 4,50. Então, 160 páginas por 10 reais não é caro, certo? Errado! O salário mínimo por lá é 5,75 dólares POR HORA (variando de estado por estado, pois nos EUA cada um tem sua constituição e leis independentes). Se levarmos em conta uma carga diária de oito horas, são 46 dólares por dia, num total de 1380 dólares por mês. Isso são 2760 reais! Mas aqui em nosso País, o salário mínimo é de 151 reais (US$ 75,50). Uma diferença brutal!
Não havendo quadrinhos acessíveis, fica mais surgirem novos leitores. Atualmente, está acontecendo no Brasil o mesmo fenômeno que aconteceu nos Estados Unidos, na década de 80. Por lá, as revistas pararam de ser vendidas em bancas, e passaram a ser encontradas apenas em lojas especializadas (comic shops). Isso parecia ser a alternativa perfeita para as editoras, porque acabariam com o encalhe e todas as edições que iam para a gráfica acabavam sendo comercializadas.
Mas, com o tempo, acabou surgindo o lado negativo da idéia. Não houve uma renovação de leitores por causa disso e, hoje, as editoras americanas tentam, de todas as maneiras, aumentar suas vendas, tanto que a Marvel está lançando a linha Ultimate Marvel em bancas comuns. A diferença é que, aqui no Brasil, essa elitização está acontecendo por causa do preço.
Apesar de a Abril ser o exemplo mais nítido dessa situação, não é o único. Os preços sobem em todas as editoras, com raras exceções. A Brainstore é outra que anda exagerando, o que afugenta os leitores de seus lançamentos, que já não se destinam a um público grande, como o dos super-heróis da Marvel e da DC, por exemplo. O lançamento mais recente a sofrer deste mal é Sandman: Caçadores de Sonhos, da Conrad Editora. O álbum de luxo, vencedor do prêmio Eisner Award como melhor livro relacionado a quadrinhos, chegou mês passado às livrarias e lojas especializadas por 49 reais. A qualidade é irrepreensível, mas o preço... Está mais cara do que a edição original americana, que pode ser encontrada no Amazon.com por US$ 23,96 (R$47,92).
A causa desse preço alto está intimamente ligado à tiragem. Quanto menor a tiragem, mais cara será a publicação. Verdade seja dita, a culpa não é exclusiva das editoras. Todo o material utilizado para a produção das revistas possui preço elevado, incluindo papel, fotolitos, gráfica, transporte de material, distribuidoras etc. Acontece que muitos leitores não estão conseguindo acompanhar esse ritmo, e o produto "revista em quadrinhos" acaba tendo cada vez menos consumidores.
É preciso uma mudança de mentalidade dos responsáveis pela produção das revistas no Brasil. É necessário que editoras apostem e invistam nessa área, porque não é esperando um retorno imediato que elas melhorarão o mercado. Propaganda, divulgação, promoções. Tudo isso se faz necessário para chamar a atenção de leitores em potencial, pois apenas colocando suas publicações nos cantos das bancas - contra anúncios de TV, rádio, jornal e revistas sobre cinema, CDs e vídeo game - a luta será ainda mais difícil.
Neste ano, as editoras terão que enfrentar um grande desafio. Estabilizar as vendas e fazê-las aumentar, para que o mercado volte a ter a mesma vitalidade de outrora. Como isso será feito? Só saberemos com o passar do tempo.
Samir Naliato, sempre que vai às bancas para comprar suas revistas, retorna de bolsos vazios. Neste momento de profunda reflexão, fica imaginando qual será o motivo de seu salário nunca aumentar, apesar de quase tudo ser remarcado constantemente! E o governo continua dizendo que a inflação sempre fica por volta de 1% ao mês...