Cornücópia
Editora: independente – Edição especial
Autor: Bräo (roteiro e arte).
Preço: R$ 50,00
Número de páginas: 64
Data de lançamento: Novembro de 2015
Sinopse
A cornucópia é um símbolo antigo, presente na mitologia grega e representado em obras de arte através dos séculos. É uma representação de riqueza, abundância e fertilidade.
Entre quatro paredes, a fartura é a sexual, multirracial e multigênero, sem rédeas, personagens específicos ou diálogos.
Positivo/Negativo
Primeira história em quadrinhos de Bräo, Cornücópia vai direto ao assunto, enquadrando uma luxuosa sala com móveis “antiquados” com anônimos que destoam da decoração.
Alternando a narrativa, acontecem duas ações distintas, uma com maior ênfase na splash page (única imagem na página inteira), onde acontecem as experiências sexuais fetichistas; e outra em que há uma espécie de preparativo da protagonista para o que está por vir, com a pequena janela “flutuando” na página em branco. Ambos são rituais voyeurísticos.
Mesmo sendo propostas bem diferentes, essa estrutura é semelhante ao clássico de fantasia (não sexual) dos anos 1970 escrita por Alejandro Jodorowsky com arte de Moebius (1938-2012) Os Olhos do Gato (lançada em 1987 pela Martins Fontes e republicada em 2015 pela Nemo).
Num preto e branco bem marcado e cheio de detalhes, os belos desenhos do autor fazem com que o leitor se demore mais nos diversos atos sexuais. Com quase nenhum diálogo, Bräo não reflete tal economia nas sacanagens: masoquismo, masturbação, ménage à trois e bondage são algumas das ações presentes na HQ adulta.
Com uma angulação fixa revezando com closes e detalhes, o álbum perambula entre o erotismo e a pornografia propriamente dita (esta última geralmente vista com maus olhos pelos curiosos puritanos, e subvalorizada erroneamente por causa da nossa histórica repressão sexual).
Em determinado momento, as obscenidades também têm margem crítica comportamental, com destaque para a provocativa aparição de uma entidade religiosa. O simbolismo aqui é mais acentuado que os adornos fetichistas dos outros personagens que passaram pela sala.
Apesar do bom repertório de sacanagens, Bräo não ultrapassa tanto a margem de possibilidades mais ácidas ou escatológicas. Está mais para um pornô chic do que para as depravações literárias de um Marquês de Sade (1740-1814) ou uma lente despudorada de um cineasta como Pier Paolo Pasolini (1922-1975). Mas é apenas questão de escolha do autor.
Porém, já cumprindo seu papel de entretenimento, a obra oferece ainda um desfecho inusitado, que abre um diálogo direto com o leitor, derrubando a chamada “quarta parede”. Uma abordagem bem inteligente do quadrinhista.
Para quem ainda era descrente que uma edição independente não poderia alcançar toda uma pompa luxuosa, Cornücópia apresenta um trabalho editorial que não deve nada a nenhuma grande editora do Brasil. Com um formato que evidencia a sua arte (24 x 32 cm), a obra possui capa dura e é impressa em papel couché fosco de boa gramatura.
Uma HQ “tântrica”, que norteia um cenário no qual o erótico e pornográfico andam meio sumidos. Bom sinal para nós, leitores, órfãos que oram nos “catecismos” nacionais do Carlos Zéfiro (1921-1992) e buscam exercer o voyeurismo em outras salas “importadas”, arquitetadas por nomes como Milo Manara, Massimo Rotundo, Paolo Eleuteri Serpieri, Vittorio Giardino, Giovanna Casotto, dentre outros.
Classificação