Confins do Universo 216 - Editoras brasileiras # 6: Que Figura!
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Historieta

17 março 2014

HistorietaEditora: Casa Daros / Daros Latinamerica – Edição especial

Autores: Julio Le Parc (roteiro e arte) e Beatriz Horta (tradução).

Preço: R$ 35,00

Número de páginas: 60

Data de lançamento: Outubro de 2013

Sinopse

Julio Le Parc apresenta o mundo da arte, seus personagens, seus mitos, suas limitações e propõe uma visão de como ele deveria ser.

Positivo/Negativo

No último trimestre de 2013, o artista argentino Julio Le Parc ganhou três exposições simultâneas no Brasil. Da maior e mais impressionante, na Casa Daros, no Rio de Janeiro, saiu uma publicação de um projeto pouco ambicioso do artista: a HQ Historieta.

Le Parc é um dos maiores artistas argentinos vivos. Seus trabalhos mais conhecidos são esculturas cinéticas, que têm mecanismos que geram movimentos. A exposição da Casa Daros, Obras Cinéticas, focava especialmente em esculturas de grandes dimensões que, por lidarem com projeção de luz, foram apresentadas em salas escuras. Não tem como o autor ser mais grandioso que isso.

A exposição contrasta com Historieta, que é uma HQ singela, de baixa tiragem, em formato A5, míseras 60 páginas em capa de papel bege. Não espanta que, diante da grandiosidade das obras cinéticas, ela tenha ficado em segundo plano. Agora que a mostra está fechada, é tempo de voltar os olhos para o livrinho.

Segundo a introdução que Le Parc escreveu para a edição, a história de Historieta começa ainda na Escuola de Bellas Artes de Buenos Aires, nos anos de 1950. É lá que, durante uma ocupação estudantil, surgem os primeiros desenhos que contestam as idiossincrasias do mundo das artes visuais.

Em Paris, nos anos 1970, o artista fez mais alguns quadros. Em 1978, a BBC produziu um documentário sobre a sua obra, e pediu mais alguns desenhos para completar o roteiro. Ao final, havia 150 quadros, que Le Parc utilizou por anos como slides de palestras, e que seu filho transformou em um vídeo de 13 minutos de duração.

A forma atual de HQ foi compilada pela primeira vez apenas em 1996, e permanecia inédita em português até agora.

A importância de Historieta vai além de ser uma HQ de Le Parc. Ela é pioneira também para os quadrinhos, por antecipar em algumas décadas um gênero que até hoje é pouco comum: o ensaio.

Julio Le Parc é um crítico feroz do mercado de arte, e é sobre isso a sua HQ. Ele não pouca ninguém. Grosso modo, na sua visão, o artista é o sujeito que precisa escolher entre vender e ser genuinamente bom. O marchand, o colecionador, o gestor de museus e o crítico de artes são cúmplices na manutenção desse sistema, que deixa a arte de lado e exclui a apreciação do povo.

Le Parc

Na prática, a visão de Le Parc peca ao generalizar demais os mecanismos da arte. Até porque, afinal de contas, a arte ocidental sempre foi ligada ao mercado – uma arte livre da influência do dinheiro nunca existiu. Sempre houve um Médici, um galerista, um gestor de museu. Para ser o que Le Parc quer que a arte seja, ela precisa se tornar algo que nunca foi, e não se aproximar de uma essência que nunca esteve lá plenamente.

Ainda assim, a HQ não deixa de ser importante: ela evidencia com clareza o ponto de vista de seu autor, um criador que durante décadas desafiou e, por consequência, foi vítima desse sistema, sendo deixado de fora de coleções importantes – uma injustiça que, nos últimos anos, vem sendo corrigida (inclusive pela ação da própria Coleção Daros Latinoamerica).

Não é só no tema que Historieta surpreende. Visualmente, a HQ é composta por fotografias que registram colagens de desenhos – e eventualmente algum detalhe extra, como cordões e uma mão humana. Algumas das imagens têm realmente profundidade, com vários planos sobrepostos. Inegável, também, a influência de Marc Chagall – nos cavalos voadores e nos azuis.

Até onde se sabe, Historieta é a única HQ de Le Parc, e uma de suas obras mais obscuras. Mesmo na Argentina, onde as artes gráficas costumam ter mais intimidade com as artes visuais, fala-se pouco dela.

Agora, há um processo global de reconhecer a importância de Le Parc no mundo das artes visuais. Com esta publicação de Historieta, o mundo dos quadrinhos está convidado a fazer esse mesmo movimento.

Classificação

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