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Saga – Volume Três

10 novembro 2017

Saga - Volume TrêsEditora: Devir – Edição especial

Autores: Brian K. Vaughan (roteiro) e Fiona Staples (arte) – Originalmente publicado em Saga # 13 a # 18 (tradução de Marquito Maia).

Preço: R$ 65,00

Número de páginas: 152

Data de lançamento: Novembro de 2016

Sinopse

Os pais de primeira viagem Marko e Alana vão até um planeta chamado Quietus para encontrar com o seu autor preferido, cujo romance foi o estopim para a aproximação de ambos, apesar de serem de raças diferentes e que se encontram em guerra.

Enquanto isso, seus perseguidores se aproximam cada vez mais do casal, que está fugindo com a mãe de Marko, Klara, e a babá fantasma Izabel. De um lado, o Príncipe Robô IV, enviado de Aterro, e do outro, o mercenário O Querer, que viaja com seu fiel Gato das Mentiras, uma garota ex-escrava resgatada de um planeta de prostituição e Gwendolyn, ex-noiva de Marko, enviada de Grinalda, o único satélite de Aterro.

Positivo/Negativo

Saga tem todos os ingredientes convencionais para um bom folhetim espacial: uma soldado do maior e, consequentemente, mais avançado tecnologicamente, planeta da galáxia apaixona-se por um subjugado guerreiro do único satélite deste mundo, habitado por uma raça que avançou por meio da prática de magia.

Entre os dois está um guerra patrocinada pelos seus povos, de forma tão longeva que chegou a ser terceirizada para outros planetas. E, desse caos, nasce Hazel, a filha proibida. Para sobreviveram, eles precisam fugir de seus opositores.

Com essa estrutura, tinha tudo para ser um refugo que o leitor já viu por aí no cinema, literatura e até nos quadrinhos. Porém, o grande trunfo é ter a escrita de Brian K. Vaughan, que assume mais constância e complemento com o traço da Fiona Staples.

Perceba os detalhes de como ele vai conduzindo a trama e, ao mesmo tempo, guiando o desenvolvimento não só dos personagens, mas também do universo ao redor.

Logo na abertura deste volume, vê-se o centro médico militar de Aterro. Na frente, está passando um senhor com ares de mendigo, com casaco de veterano de guerra, empurrando um carrinho de supermercado com toda a sua vida ali dentro. Um retrato do descaso do governo com os homens que estavam no front de suas batalhas.

Esse mero elemento de cena introdutória para situar o local pode passar despercebido tranquilamente, o que não é um problema. Mas o roteirista o insere para expandir de certa forma a percepção das consequências de uma guerra tão longa. O mesmo quadro de descaso lá fora é visto lá dentro, quando se vê ratazanas voadoras (sim, parece que todos os seres de Aterro têm asas) perambulando nos corredores do hospital.

São apenas "efeitos colaterais" que servem para avançar a história. Um mero coadjuvante com a mão decepada visto en passant no primeiro volume volta para inserir a imprensa na jogada.

Uma boa jogada, diga-se de passagem, porque os jornalistas vão investigando o passado da Alana (lembrando que um pouco da história pregressa de Marko também foi revelada na edição anterior, por intermédio da aparição dos seus pais).

Para prender a atenção, Vaughan retarda a curiosidade do gancho que deixou no final do Volume 2 para espalhar a ação essencialmente em três frentes paralelas, por cinco capítulos.

A mais interessante é do ilhado O Querer e sua pequena tripulação, após tentar interceptar a nave-árvore dos protagonistas. Frustrado, o caçador de recompensas tem uma inusitada "visita" num estranho planeta tropical no qual foi forçado a pousar devido às avarias da sua espaçonave. Todo o mistério vai sendo elucidado, ao mesmo tempo em que vai complicando a permanência do quarteto na floresta.

Por muito cavoucar o grande furo, os jornalistas acabam sendo os intermediários de apresentar mais uma mercenária na jogada dessa história. Com a intervenção de A Mácula, Vaughan deixa uma ponta solta que poderá ser desenvolvida mais à frente.

Voltando à forma de condução do autor em Saga, a "humanização" dos alienígenas é um dos atrativos sedutores do cotidiano.

Em qualquer parte da galáxia, a superprotetora sogra sempre vai meter o bedelho na criação da neta ou criticar a forma como seu filho é tratado pela esposa, mesmo estando aparentemente bem apaziguado o convívio.

A idealização – projetada nas obras – que o leitor pode ter do seu ídolo também pode ir por água abaixo, como foi com Alana ao conhecer o amargurado e alcoolizado Oswald Heist, o autor ciclope dos romances água com açúcar que ela lia. Ou até a maneira como os jovens devem encarar a dura realidade daqui para frente, com a responsabilidade de criar (e sustentar) uma filha que sempre será alvo das duas raças por ser algo proibitivo, talvez até pernicioso para alguns, cultivado do tradicional e enraizado conflito entre eles.

Como bem coloca Alana, no encerramento das discussões na morada de Heist, existe o clichê da própria vida. Brian K. Vaughan talvez tenha apenas extraído todas essas idiossincrasias do mundo real para servir de pano pra manga da sua sci-fi.

Dentre as alternativas de tocar a vida e ludibriar seus perseguidores, surge como solução um inusitado e igualmente clandestino negócio chamado O Circuito, uma espécie de trupe de artistas caçada pelos censores. No resumo dado por Alana, pode-se encontrar uma explicação ou um paralelo com a própria série (e para persuadir os leitores mais céticos): "Boa parte não passa de melodrama ruim, mas algumas das tramas podem ser interessantes, principalmente quando o público entra no clima".

Antes do tempestivo clímax, o roteirista brinca com vários elementos e características que geralmente não são exploradas na ficção científica em quadrinhos, principalmente quando se "presta homenagem" a algo específico, como a space opera, no caso.

Uma série de indiretas sobre o ofício se coloca nas falas do renomado romancista Oswald Heist, que tem medo de trabalhar com ilustradores, além das piadas sexuais (o momento em que uma excitada Alana quer fazer felação em Marko é hilário), escatologias e sarcasmos que se tornam habituais no enredo do título.

E novamente o gancho no final da edição atiça o leitor a querer saber o destino de Marko, Alana e da pequena Hazel.

A Devir continua com um excelente trabalho, com capa dura, formato 18,4 x 27,2 cm (maior que o material lançado lá fora), papel couché com boa gramatura e impressão. Infelizmente, ainda continua com extras bem minguados, reservados à arte de Staples.

Saga segue envolvente e usando todo o universo space opera que estava aí, empoeirado, ao seu favor. É a trama interessante dessa revisitação, principalmente quando o público entra no clima.

Classificação:

4,0

.

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