10 PÃEZINHOS - CRÍTICA
Título: 10 PÃEZINHOS - CRÍTICA (Devir) - Edição especial
Autores: Fábio Moon e Gabriel Bá (roteiro e arte).
Preço: R$ 18,00
Número de páginas: 104 páginas (preto-e-branco, formato americano)
Data de lançamento: Novembro de 2004
Sinopse: Nesta nova fornada de 10 Pãezinhos (marca adotada pelos autores) o livro abriga dez histórias "de amores perdidos e sonhados, sobre juventude e experiências recém-adquiridas, mas, acima de tudo, uma bela homenagem à amizade", como diz um trecho do material de divulgação.
Trabalho produzido ao longo dos últimos dois anos, permeado de traços autobiográficos, fantasia e metalinguagem, características da dupla. Confira as histórias.
Crítica - Um artista convida um crítico para conhecer sua nova fase.
El Camino - Os autores buscam inspiração para criar novas histórias no mundo dos sonhos.
Vernissage - Um artista discute o atual significado da arte.
Impressões - Diversas impressões de pessoas diferentes numa noite, num bar qualquer.
Reflexões - Ao ir ao banheiro, um sujeito se depara com uma versão de si mesmo e tem um diálogo, no mínimo, estranho.
Fora de moda - Um encontro é cancelado e um jovem tem que conseguir um programa substituto.
All you need is love - Pensamentos que passam pela cabeça após uma noite de sexo casual.
O Sapo - A vida de um sujeito após o final de um relacionamento amoroso.
Feliz Aniversário, Meu Amigo - Um grupo invoca um falecido amigo na data de seu aniversário, para poderem comemorar com ele.
Qu'est-ce que C'est? - Os autores, em meio a uma situação inesperada no metrô de Paris.
Como se nunca tivesse existido - Uma noite num bar e dois amigos observam uma garota sozinha.
Positivo/Negativo: O álbum Crítica reúne ótimos exemplos da peculiar visão dos gêmeos Fábio Moon e Gabriel Bá sobre o mundo, especialmente no que diz respeito a amor, amizade e, de certo modo, o sentido da vida.
Fora de Moda, Como se Nunca Tivesse Existido e Feliz Aniversário, Meu Amigo são os destaques da edição, carregadas de situações comuns, mas com uma pitada de coincidências e realismo fantástico (especialmente a última) que dão o tom das HQs dos autores.
Bá e Moon têm a invejável capacidade de contar histórias que provocam identificação com um grande número de pessoas, inclusive os não habituados com os quadrinhos. O leitor é transportado para o mundo deles, que também é o nosso, um grau de proximidade que talvez só seja possível pelo fato de eles dividirem experiências pessoais com o público, situações do cotidiano tão únicas quanto um ser humano consegue ser diferente de outro e, ao mesmo tempo, tão parecido.
Às vezes, as histórias são contadas literalmente como autobiografias, outras com personagens especialmente criados, que ganham vida e consistência. O tipo de roteiro que a dupla se propõe a fazer lembra seriados dramáticos de TV ou filmes, não é algo tão comuns nos quadrinhos. Também se parecem com boas conversas de bar (vale lembrar, o típico local de suas HQs). Ponto positivo decisivo no trabalho.
Uma característica do livro (que talvez tenha valido o nome Crítica) é o fato de os autores demonstrarem preocupação em pensar sua própria arte. É nítida a preocupação que aparece no contexto da coletânea com os quadrinhos, como linguagem. Em especial se considerarmos o período de trabalho: os últimos dois anos marcaram também um intenso trabalho no blog, no qual procuraram mostrar um pouco de seu processo criativo.
Uma prova de maturidade e de uma preocupação cada vez maior com o público. As histórias nas quais isso aparece de forma mais evidente são Crítica, El Camino, Impressões e Vernissage.
Em El Camino, eles conseguem levantar questões de forma espontânea e aparentemente sem grandes pretensões, compondo uma boa HQ. No entanto, isso não acontece com Vernissage, que fica com um pé no lado intelectual e não consegue dizer a que veio.
Impressões talvez seja apenas um exercício e represente tão somente o que o próprio título diz, mostrando a capacidade dos gêmeos de entender seus personagens, pessoas comuns.
Um bom exercício do livro é Reflexões, que mostra a mesma (boa) história contada duas vezes, uma por cada quadrinhista.
O Sapo foge do tipo de trabalho usual dos autores. Acaba se tornando uma grande reflexão com texto pesado, introspectivo demais. É, no fundo, uma bela trama (a primeira e a última página são muito boas), mas pecou na métrica.
Mesmo em All you need is love há uma introspecção, mas é mais bem distribuída pelas páginas. Contrasta pelo fato da dupla saber descrever melhor até mesmo sensações como raiva e indignação sem perder a empatia com o público comum. Prova disso está no final do livro, em Qu'est-ce que C'est.
Embora a força do trabalho esteja nos roteiros, a arte também se destaca. Cada autor tem seu estilo de desenho, mas ambos trabalham bem com preto-e-branco e têm traços levemente estilizados, fugindo tanto do cartum (comum entre desenhistas nacionais) quanto do comics (popularizado pelos super-heróis norte-americanos), sem se tornar realista demais. A arte se adequa perfeitamente ao texto.
Para quem já acompanha o trabalho dos gêmeos, fica no ar uma "leve" bronca pela republicação de Feliz Aniversário, Meu Amigo, lançada de modo independente em 2003. É uma ótima história, mas tomou espaço de material inédito.
Fica o consolo em saber que aumentará seu potencial de público ao ser editada agora pela Devir. Em outros casos, a republicação é merecida, pois eram inéditas no país: Qu'est-ce que C'est saiu originalmente na antologia norte-americana Autobiographix (Dark Horse), em 2003, e El Camino foi produzida para o catálogo da exposição espanhola ConSecuencias, de 2002, sobre o novo quadrinho brasileiro.
O álbum apresenta alguns erros de português e/ou digitação que não deveriam existir, principalmente levando-se em conta que a publicação é resultado de anos de trabalho. Mas o conjunto da obra é muito bom, se os autores tropeçam levemente numa história, se superam em outra.
Por isso, apreciadores de boas histórias (em quadrinhos ou não) não devem pensar duas vezes para adquirir esta edição.
Classificação: