A Samurai
Editora: Tambor Quadrinhos – Edição especial
Autores: Mylle Silva (roteiro), Yoshi Itice, Vencys Lao, Guilherme Match, Mika Takahashi, Bianca Pinheiro, Herbert Berbert, Leonardo Maciel e Gustavo Borges (desenhos).
Preço: R$ 35,00
Número de páginas: 112
Data de lançamento: Dezembro de 2015
Sinopse
Japão, Período Edo (1573-1603), época em que os senhores feudais e líderes militares dominavam territórios, sempre muito bem guardados por seus samurais.
Numa sociedade estratificada e dominada por homens, Michiko decide negar seu destino e torna-se uma guerreira para realizar o sonho de encontrar sua família.
Acompanhada por Yamada, seu camareiro e melhor amigo, ela não medirá esforços para atingir seu objetivo – mesmo que, para isso, precise abrir mão da própria vida.
Positivo/Negativo
Com uma boa pesquisa sobre o cenário e costumes nipônicos, A Samurai traça na lâmina da espada a trajetória de sua protagonista, uma gueixa que treina escondida para se tornar a guerreira do título, enfrentando vários obstáculos na busca de descobrir as suas origens.
Dividido em capítulos, cada um desenhado por um quadrinhista, a obra apresenta diálogos pobres, novelescos, sem personalidade, simplórios e sem nenhuma novidade acerca do tema, que também carece de ser original.
Independentemente de ter ou não originalidade, a HQ tem um verniz de jornada aventureira que não empolga, muito menos atiça uma reflexão em cima dos motivos da protagonista, os quais ficam muito rasos.
A estrutura no qual o álbum é embasado – uma mulher que se impõe, luta e desafia um sistema patriarcal para ir atrás da sua família – poderia até se encaixar como um trabalho voltado ao público infantil, mas A Samurai apresenta cenas violentas (até desnecessárias) e uma classificação indicativa para maiores de 16 anos. Isso não justifica ser tão pueril e não ter uma lufada de criatividade que vá além de colocar na trama uma singela lenda oriental sobre almas gêmeas.
Analisando os motivos de Michiko, observa-se sua postura de guerreira, focada e obstinada para encontrar a família e – nas palavras da própria – “ter uma vida tranquila” ao lado dos entes queridos.
Esse objetivo sólido é colocado em xeque quando ela vê uma oportunidade de começar de novo, fugindo das consequências de suas ações para uma trivial e oportuna “virada de mesa” mística (que foi pautada apenas numa brevíssima introdução na primeira página). Se Michiko quiser visitar um templo, o local aparece do nada, simples assim.
A samurai não liga para as sangrentas disputas por terras, mas mostra toda sua inocência quando se martiriza (e se supervaloriza, afinal ela é a heroína) por não impedir que uma guarda mate mulheres e crianças, desrespeitando o código de honra entre os guerreiros.
Há também falas que reverberam na mente como forçadas para valorizar a pesquisa sobre o Japão. Um exemplo, dentre outros, é o instrumento de cordas chamado shamisen. Num determinado momento, ele é citado pela Michiko, que promete treinar sua execução. Em outro, a senhoria confessa que se sente orgulhosa pela personagem principal quando a ouve tocar e repete o termo nipônico, tornando-o deslocado na fala, agindo sem nenhuma naturalidade no contexto.
Contribuindo ainda mais para a não fluência da narrativa, alguns termos nipônicos que são explicados no rodapé estão posicionados na próxima página e sem ordem de leitura, obrigando o leitor a voltar quando consulta o deslocado verbete.
Outro ponto negativo é o descuido da revisão, principalmente com o uso de vírgulas e da crase (esta última utilizada erroneamente já na dedicatória), além da básica – e não menos importante – separação de sílabas nos textos da seção de extras.
Altos e baixos também nos desenhos, apesar de manter uma “unidade”, uma coerência com base nos desenhos cartunescos e estilizados dos quadrinhistas. Mesmo assim, percebem-se discrepâncias artísticas, deixando evidente o virtuosismo narrativo de boas surpresas, como nos traços de Mika Takahashi e Leonardo Maciel.
Separar por capítulos, distribuir aos artistas e escolher uma cor para cada parte (que poderia ter um propósito no mínimo simbólico ou ser mais bem aproveitada em algumas cenas de flashbacks) resultou também na visível mudança de “temperamento” da história de Mylle Silva, que parte do cômico ao trágico de um capítulo para o outro de maneira bastante abrupta.
Após um previsível clímax, completam a bonita edição de capa cartonada com orelhas e impressa em papel off-set um prelúdio em prosa ilustrado com outros convidados, os bastidores da produção e uma breve biografia de cada autor.
No final, a roteirista presta uma merecida homenagem ao veterano Claudio Seto (1944-2008) e fala sobre o álbum ser um wabi-sabi, estética japonesa que valoriza a beleza do imperfeito.
Nada contra o imperfeito, muito pelo contrário: de tal conceito se pode extrair histórias bem acima da média, que permanecem por um bom tempo na sua mente ou que no mínimo seja agradável e entretenha. Não é o caso de A Samurai.
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