Título: CAPOTE NO KANSAS (Devir
Livraria) - Edição especial

Autores: Ande Parks (roteiro) e Chris Samnee (arte).

Preço: R$ 21,90

Número de páginas: 128

Data de lançamento: Abril de 2007

Sinopse: Quando já se tornara um escritor famoso e reconhecido de Nova York, Truman Capote decidiu mudar a história da literatura e do jornalismo. Um novo conceito transitava em sua cabeça: o do romance de não-ficção.

A decisão de partir para a empreitada foi tomada quando Capote ouviu falar de um crime hediondo realizado em Holcomb, no Kansas: a família Clutter fora chacinada em plena calmaria do campo norte-americano.

O escritor deixou Nova York e entrou em uma jornada que levou seis anos até que seu livro, A Sangue Frio, foi publicado, relacionando-se não só com a comunidade local, mas também com a vida dos mortos e com os dois assassinos.

Positivo/Negativo: A história da escrita de A Sangue Frio é bastante conhecida. Não só porque é o centro das biografias de Truman Capote (há várias, e pelo menos a mais famosa, de Gerald Clarke, saiu no Brasil pela Globo), mas também porque já foi tema de Capote, filme de 2005 que ganhou vários Oscar.

Ande Parks, conhecido dos leitores brasileiros como arte-finalista parceiro de Phil Hester em revistas como Arqueiro Verde, pega o mesmo bonde para contar sua versão da história. Desta vez, o artista assume o papel de roteirista. Os desenhos ficam para Samnee, que tem narrativa competente e um belo uso de luz e sombras.

O resultado é uma obra madura, de uma leitura prazerosa e bem conduzida na maior parte do tempo, principalmente para quem está por dentro da trama. Um grande achado é o tom do personagem Capote.

O escritor era homossexual assumido e tinha trejeitos bastante afetados para a época. Nova-iorquino cosmopolita, sofreu e provocou um grande impacto em sua chegada a Holcomb. Não é só o roteiro que retrata bem o conflito entre o campo e a cidade grande. O desenho de Samnee mostra brilhantemente a diferença entre os dois mundos.

O mérito é ainda maior quando se percebe que a HQ é em preto-e-branco, e o artista não tem cores como recursos para representar os maneirismos do escritor.

O maior problema de Capote no Kansas, porém, será enfrentado pelos leitores menos habituados com o enredo de A Sangue Frio ou da história de sua construção, que podem se perder com a participação de Nancy.

Na vida real, Nancy também foi morta na chacina familiar. Mas Parks usa uma licença poética em que a garota aparece "viva", conversando e interagindo com Capote. É um recurso válido, principalmente para a fase em que Harper Lee, autora de O Sol é para Todos e companheira de Capote no começo da investigação, abandonou o Kansas. Mas a participação da garota fica dúbia - e um leitor desavisado pode acreditar que ela sobreviveu.

O deslize está na transição da cultura norte-americana, mais habituada com a história de Truman Capote, para o cenário brasileiro, em que o autor é mais conhecido por seu conto Bonequinha de Luxo, que inspirou um filme muito cultuado, estrelado por Audrey Hepburn.

Depois do sucesso das edições iniciais, A Sangue Frio ficou mais restrito a círculos jornalísticos por aqui - e esteve fora de catálogo por anos até que, recentemente, a Companhia das Letras incluiu-o em sua coleção de livros-reportagem.

Ainda que uma nota pudesse estragar a história, uma observação ou mesmo um texto final apresentando uma análise da HQ poderia resolver o problema sem grandes complexidades.

Se Nancy não ajuda, não chega a estragar o lançamento da Devir, que desde que perdeu seus títulos Vertigo e Wildstorm para a Pixel Media, conseguiu dar a volta por cima e trazer materiais mais diversificados - e, muitas vezes, mais interessantes - para o país. De quebra, a julgar por este volume, a qualidade da melhorou significativamente.

Álbuns como Capote no Kansas são sempre bem-vindos.

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