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HOMEM-ARANHA 2: ADAPTAÇÃO OFICIAL DO FILME

1 dezembro 2004


Autores: Roberto Aguirre-Sacasa (roteiro) e Staz Johnson, Pat Olliffe e Ron Lim (desenhos).

Preço: R$ 5,00

Número de páginas: 48

Data de lançamento: Julho de 2004

Sinopse: Há dois anos, Peter Parker descobriu que, com grandes poderes, vêm grandes responsabilidades. Disposto a usar seus dons para o bem, ele assumiu a identidade do Homem-Aranha para combater o crime. Mas quando o jovem fotógrafo vê suas notas caírem, a situação econômica de sua Tia May se agravar e sua relação com a ex-vizinha Mary Jane Watson ruir, se dá conta de que o fardo de ser um super-herói pode ser mais pesado do que possa carregar.

E esse conflito existencial não poderia chegar em pior hora, pois Nova York está prestes a conhecer um novo e poderoso vilão: o Dr. Octopus.

Positivo/Negativo: Se existe uma constante em todas as adaptações cinematográficas é a presença de um grupo de fãs sempre alertas para apontar o que "faltou" no filme. Foi assim em O Senhor dos Anéis, Tomb Raider, Harry Potter, e até Resident Evil.

Não importa de qual mídia os personagens tenham saído, o simples fato de a história já ter sido contada acaba virando uma preocupação extra para os roteiristas, que carregam a difícil missão de selecionar o que será usado e o que será deixado de lado.

Quando se trata de adaptações de HQs, essa situação fica ainda mais complicada, já que, na maioria dos casos, existem décadas de continuidade a serem levadas em conta. O roteiro final acaba virando uma espécie de amálgama, formado pelos elementos principais das mitologias dos personagens, e muitos aspectos apreciados pelos fãs acabam não indo parar na tela grande. Alguns exemplos: as ausências dos Sentinelas nos filmes dos X-Men, e de Gwen Stacy nas produções do Homem-Aranha.

Mas o que acontece quando o processo toma o sentido contrário, e os filmes são adaptados para os quadrinhos?

O fato é que, se anos e anos de continuidade representam revistas demais para serem adaptadas em um filme de duas horas, uma produção desse tamanho também constitui roteiro demais para ser condensado em uma HQ de 48 páginas. E essa relação torna-se gritante quando se compara Homem-Aranha 2, o filme, com Homem-Aranha 2, o gibi.

Se a nova aventura cinematográfica do Aranha consagra-se por juntar um roteiro inteligente, uma produção caprichada e o alto grau de dedicação de todos os envolvidos, num filme legal, sensível, emocionalmente impactante e visualmente espetacular, a revista em quadrinhos segue o rumo contrário. No papel, toda a grandiosidade da película é dissolvida em uma história apática, estéril e com ar de "feita às pressas".

O gibi é uma colagem de "resumos" das cenas vistas no cinema. Não há a sensação de continuidade, a narrativa é forçada e, muitas vezes, a trama fica tão imediatista, que os personagens se descaracterizam em relação ao filme.

A urgência do roteiro (afinal, vale lembrar: são 126 minutos de película para 48 páginas de história) "atropela" todas as passagens importantes da aventura, excluindo completamente da versão em quadrinhos o belíssimo teatro emocional construído por Sam Raimi ao longo da produção.

Na página 31, por exemplo, é reproduzido o momento em que Peter Parker conta à Tia May que é responsável pela morte do Tio Ben. Além de reduzir um dos momentos mais importantes do filme a uma única página, o argumento de Roberto Aguirre-Sacasa ainda consegue deixar a cena extremamente fraca, insossa e, pior, desinteressante.

Entre as descaracterizações de personagens, pode-se citar Mary Jane gritando com a secretária eletrônica (no filme, a ruiva está tão desconsolada com Peter, que nem sequer vê propósito em fazer algo do tipo); o Dr. Octavius citando T. S. Eliot quando, na produção, diz que, mesmo após tantos anos, ainda não entende o autor; o vilão autodenominando-se Dr. Octopus (na versão cinematográfica ele nunca se refere a si mesmo assim) e, posteriormente, conversando com os tentáculos ("o que vocês estão dizendo, meus braços queridos?"), um clichê absurdo que Sam Raimi jamais deixaria passar em sua obra, entre muitos outros. A cereja no topo do bolo? Peter brigando (isso mesmo!) com o tio falecido durante a conversa imaginária entre os dois.

Seria injusto culpar Aguirre-Sacasa pelo fracasso do roteiro dessa versão em quadrinhos. A obrigação de condensar mais de duas horas de filme em um espaço equivalente a duas edições normais de uma HQ americana pesaria mesmo sobre os ombros de um escritor experiente.

O fato é que, antes de tudo, a adaptação oficial de Homem-Aranha 2 é um produto que tem como objetivo atrair aqueles que gostaram do filme mas nunca encostaram em uma revista em quadrinhos. Logo, fazer uma história mais extensa iria, além de encarecer, desviar interesse da publicação.

Portanto, escrever o argumento dessa adaptação era uma missão ingrata, mas necessária. Vale lembrar que Chuck Austen, em 2003, passou exatamente pela mesma situação ao ser encarregado de adaptar X-Men 2, e obteve um resultado tão ruim quanto.

Salvam-se neste especial os desenhos do trio Ron Lim, Pat Olliffe e Staz Johnson (este último é também o ilustrador da minissérie Homem-Aranha/Doutor Octopus: Exposição Negativa, publicada por aqui na revista regular do aracnídeo). A arte não é excepcional, mas funciona de forma até agradável. O que, considerando a revista como um todo, já é um ganho.

Classificação:

4,0

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