Esta é uma publicação independente de um homem só, toda escrita desenhada, editada e diagramada por Ulisses Garcez. Trata-se do relato de uma viagem, uma HQ com um leve fundo jornalístico. Ulisses Garcez narra o que presenciou e no que se envolveu, mostrando influência das HQs de Joe Sacco, por exemplo.

A comparação, entretanto, fica apenas no plano da proposta da narrativa. Em La Gira, o autor se envolve com a história até se tornar parte integrante e essencial dela. Isso só não acontece no interlúdio, que mostra sua viagem para os Países Baixos para visitar o saxofonista Pix.

A história não tem grandes pretensões. Por isso, acaba virando um simples relato de uma viagem de amigos. Talvez, exatamente por isso, sua leitura é tão agradável. É algo tão comum, e ao mesmo tempo tão divertido - e povoado por passagens marcantes, como o testemunho de neve em Buenos Aires após mais de 70 anos -, que poderia ter acontecido com qualquer um, inclusive o leitor.

A linguagem urbana também merece uma análise. Os eventos acontecem em subúrbios e cenários típicos, sejam eles em Montevidéu, Rosário, São Paulo ou Amsterdã.

A arte de Ulisses Garcez causa um pouco de estranhamento à primeira vista. Não é rebuscada, mas, de maneira nenhuma, é simples. O autor tem um traço particular, repleto de pequenos detalhes, alternados com momentos mais caricatos.

Sua narrativa gráfica é ousada e competente. Ao desenhar suas próprias letras e balões, por exemplo, usa muito bem o espaço "morto" nos quadrinhos. É muito bom ver balões planejados com a arte, para variar um pouco.

Se por um lado a arte das letras tem seu aspecto positivo, a HQ carece de uma revisão um pouco mais apurada. Alguns errinhos de português, como letras "engolidas", são o maior senão da revista.

Ainda assim, La Gira é uma obra brasileira competente, sem grandes pirotecnias, e que deve agradar.