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Reviews

MARVEL MAX # 1

1 dezembro 2003


Título: MARVEL MAX # 1 (Panini Comics) - Revista mensal

Autores: Viúva Negra - Greg Rucka (argumentos), Igor Kordey (desenhos) e Chris Chuckry (cores);

Alias: Conexão Mistério - Brian Michael Bendis (argumentos), Michael Gaydos (desenhos) e Matt Hollingsworth (cores);

Cage - Brian Azzarello (argumentos), Richard Corben (desenhos) e Jose Villarrubia (cores).

Preço: R$ 4,50

Número de páginas: 72

Data de lançamento: Setembro de 2003

Sinopse: Viúva Negra - A espiã russa Yelena Belova tem que se infiltrar no submundo sadomasoquista russo para descobrir quem matou seu mentor e evitar o vazamento de importantes segredos da Agência para a qual trabalha.

Alias: Conexão Mistério - Jessica Jones, ex-super-heroína, agora é uma detetive amarga e autodestrutiva. Mesmo sentindo a necessidade de uma folga, ela acaba aceitando um novo caso.

Cage - Apesar de suas regras de apenas trabalhar pelo preço certo, o herói de aluguel aceita ajudar a descobrir quem é o responsável pela morte de uma menina. Mas as coisas podem ser muito mais complicadas do que imaginava.

Positivo/Negativo: Nos últimos meses, a Panini aumentou a agressividade de sua estratégia de expansão. Baixou os preços e aumentou o número de títulos disponíveis nas bancas, dando uma leve diversificada em sua linha. O foco ainda é nas HQs de super-heróis com temáticas infanto-juvenis, mas parte dos lançamentos expande um pouco o público-alvo da editora, mas sem distanciar-se muito do que eles já publicam.

O grande exemplo disso é justamente a justificativa para lançar Marvel MAX: oferecer alternativas mais adultas para o público que quer um pouco mais que super-heróis. Mas abordarmos esse assunto depois. Vamos começar pelas histórias em si.

É curioso perceber que, ao menos nesse começo, a revista apostou pesado num gênero bem conhecido na literatura, que nos últimos anos ganhou fôlego nas HQs: mistério. Exato! Detetives, investigações etc. Mas com superpoderes. E palavrões!

Ei, esta é uma revista para leitores maduros, não é?

A série Cage é adulta apenas por mostrar peitos e palavras chulas. Ela atualiza o herói negro surgido durante os anos 70, abandonando todos os clichês de mau gosto da época de sua criação, e o transporta para os tempos atuais, nos guetos de Nova York.

Brian Azzarello é o roteirista. Quem leu Banner (uma interessante reinterpretação do Hulk, feita com o mesmo desenhista de Cage, Richard Corben, já publicada no Brasil em Marvel Apresenta # 3) e 100 Balas (série da Vertigo atualmente lançada por aqui pela Opera Graphica) podia esperar algo bem diferente.

O surpreendente foi a influência que ele seguiu nesse trabalho: a literatura policial surgida nos pulps, com autores como Raymond Chandler e Dashiell Hammett. O velho esquema: narração em primeira pessoa de um personagem extremamente durão, frases afiadas e agressivas que escondem uma pessoa que, lá no fundo, é boa.

Nenhum problema nisso, é um estilo narrativo bacana quando bem utilizado, mas Azzarello podia ter acrescentado algo mais. Cage apresenta uma história totalmente dentro desse formato, apenas transposta para os dias de hoje. Diverte principalmente pelo seu bom texto, pelas frases divertidas e, claro, comparações com o personagem original.

É uma trama que pode funcionar para quem consome basicamente histórias detetivescas do Batman e da TV, mas os leitores mais acostumados com o gênero em que a HQ se baseia podem sentir falta de mais inventividade (que, por exemplo, vinha aos galões em uma pequena pérola da recriação de clichês, Grimjack, quadrinho da década de 1980 que misturava esses mesmos elementos, mas com ficção científica e situações bizarras para surpreender).

Essa primeira parte acaba servindo mais para definir cenário, personagens e conflitos básicos. Com mais quatro pela frente, o roteiro ainda pode dar uma virada, mas aparentemente seguirá mesmo esse caminho de contar uma história certinha com peitos e palavrões - uma decepção para alguns leitores que esperavam algo mais adulto. Sinceramente: quem vive de frases bacanas é publicitário ou humorista. Azzarello podia ter ido bem além disso.

De Richard Corben não há muito o que falar. Conhecido desenhista americano faz o seu competente trabalho de sempre. Não vai conquistar os que não gostam de seu estilo, mas também não decepcionará os fãs. As cores de Villarrubia dão um belo ganho à arte.

Viúva Negra (minissérie em três partes) mistura o mistério com outros elementos: espionagem e sexo. Yelena Belova se mistura aos "pervertidos sexuais" da Rússia para cumprir sua missão e, de quebra, se vingar do assassino de seu mentor. Mas o quanto ela poderá descobrir sobre si mesma e seus desejos enquanto tenta resolver o crime?

O roteirista Greg Rucka é conhecido por suas histórias de suspense policial e espionagem e aqui está perceptivelmente mais confortável do que em sua triste fase na série Elektra (atualmente sendo publicada no Brasil na revista que a personagem divide com o Justiceiro). Ele é um roteirista que trabalha muito com o Batman e personagens femininas (atualmente escreve Mulher-Maravilha, para a DC), e até dá pra manter as esperanças de que ele consiga fugir do choque fácil e não cair na armadilha de usar esse cenário "devasso" apenas para justificar o selo "Para Adultos".

Depende de como ele construirá a psicologia de Yelena e o seu envolvimento com toda essa diversidade de recreação sexual. Se Rucka quiser, pode ser algo realmente maduro. Se não quiser, terá feito uma mistura de 007 com 8mm (o filme de Joel Schumacher com Nicolas Cage).

O grande destaque aqui são os desenhos de Igor Kordey. Uma arte simples, mas expressiva, que consegue mostrar cenas de sadomasoquismo de uma forma que não erotiza, mas também não apela para a repulsa barata. Competente. E não é comparável ao trabalho que ele executou para os X-Men. Quando desenhou os mutantes, ele tinha prazos ridículos, o que prejudicava seus traços. Em Viúva-Negra, a Marvel lhe deu tempo para trabalhar tranqüilo.

Essas duas séries são adultas basicamente por causa do cenário e do palavreado, mas ainda não mostraram outra possibilidade aberta pela liberdade que o "para maiores de 18" pode trazer: a criação da psicologia de personagens muito mais complexos que um simples "Grandes Poderes Trazem Grandes Responsabilidades".

É aí que entra Alias: Conexão Mistério. É a única série regular da revista, mas que será descontinuada no número 28 americano, para ser transferida para a linha infanto-juvenil normal da Marvel, com o título The Pulse.

Quem conhece Bendis, de seu trabalho no Demolidor, já sabe o que esperar. Muito diálogo. Mas ele o usa de uma forma excepcional. Assim como Garth Ennis (de Preacher, Justiceiro e Fury), o autor não tem medo de passar páginas e mais páginas para criar as situações e evoluir os seus personagens.

O resultado impressiona. Luke Cage aparece aqui também, mas ganha muito mais profundidade em apenas quatro páginas do que em todas as 22 escritas por Azzarello. E Jessica Jones, a personagem-título, promete virar uma das mais interessantes da HQ americana atual.

Ex-super-heroína, agora é uma detetive. Autodestrutiva e depressiva, resolve seus conflitos pessoais das formas mais dolorosas possíveis para si mesma. Mas, ao mesmo tempo, continua levando seu trabalho em frente.

A forma de narrativa é bem semelhante à de Demolidor, mas aqui Bendis tem também os palavrões e o sexo, que não pode usar quando escreve para o público infanto-juvenil. E ele os usa, assim como os outros autores presentes em Marvel MAX. Mas de uma forma diferente, menos explícita, porém mais pesada, ao mostrar suas implicações nos personagens.

Bendis engendra uma história efetivamente madura ao criar personagens mais reais, mesmo que com superpoderes.

A arte de Michael Gaydos é linda, embora esteja um pouco prejudicada pelo papel usado na impressão da revista. O preto, que o desenhista usa para a criação de clima, ficou meio acinzentado no Pisa Brite que a Panini escolheu para baratear os custos. Uma pena, pois esta série merecia melhor sorte.

Por outro lado, é o papel que possibilita o preço. E, convenhamos, R$ 4,50 por 72 páginas é uma ajuda camarada. Mesmo os leitores que não gostarem de uma ou outra série, poderão seguir a revista.

E agora de volta ao ponto inicial: HQs para adultos.

Quando a Marvel lançou o selo MAX nos Estados Unidos, o marketing foi todo feito em cima do chamariz "Para Maiores de 18 anos" - estratégia devidamente seguida aqui no Brasil pela Panini.

Mas qual o sentido de uma expressão dessas hoje, quando moleques de 12 anos são capazes de xingar como caminhoneiros e desenvolver estratégias de guerra para matar oponentes no computador, enquanto os mais velhos cada vez mais se vêem no direito de agir nas ruas como perfeitas crianças mimadas? Quase nenhum. Ou melhor: uma infinidade de possibilidades diferentes.

A que eles escolheram é razoavelmente restrita. Não foi seguido o exemplo da concorrente DC e seu selo Vertigo, que criou histórias distantes conceitualmente de Batman, Super-Homem & cia., justamente para abrigar os leitores que não querem ler sobre seu típico super-herói.

O MAX é apenas a Marvel dando mais liberdade aos autores e foi produzido para pessoas que querem ler super-heróis, sim, mesmo que apresentados de uma forma diferente, adulta - na teoria.

Certo, os roteiristas podem usar palavrões e mostrar mais violência e sexo. Eles podem até subverter personagens e cronologias de acordo com sua vontade (o que alguns anos atrás soaria como heresia entre editores e fãs em geral). Mas acabam mantendo-se incrivelmente próximos ao que já é feito atualmente nas revistas "normais" da própria editora.

Para comprovar que essa distância não é tão grande, é só lembrar do primeiro título MAX lançado no Brasil: Fury, de Garth Ennis e Darick Robertson, publicado em 2002 na extinta Paladinos Marvel. Tirando alguns excessos, a HQ não era tão diferente de uma outra colega de revista, a série do Justiceiro escrita pelo mesmo roteirista.

Outra prova é a transferência de Alias para a linha normal da "Casa das Idéias", defendida pelo próprio Bendis, com a justificativa de que ele só teria que abrir mão da "palavra-com-F" e do sexo anal nas histórias (pra saber mais, leia a revista).

Agora, o selo volta ao Brasil reunido em um único balaio, a Marvel MAX. A esperteza da Panini é que, com esse mesmo marketing de "quadrinho para adultos", cria um pacote que possibilita o lançamento de histórias que possivelmente não se sustentassem sozinhas em títulos isolados.

E tem efeitos curiosos. Alguns leitores podem criticar Cage e Viúva-Negra por serem basicamente tramas com a profundidade típica dos infanto-juvenis, dentro de um pacote brilhante adulto. Outros podem dizer que Alias é chata por só ter diálogos e quase nenhuma ação.

Mas o ponto importante é que a Panini acabou oferecendo uma revista perfeita para "envelhecer" o público. Um dos grandes problemas das HQs no Brasil é o salto entre as séries infantis e infanto-juvenis e as adultas. A edição da MAX acabou fazendo um balanço razoável, criando uma ponte que permite desenvolver gostos diferentes nos leitores mais novos, possibilitando, assim, a descoberta futura de outros títulos mais restritos.

Só isso, a chance de aumentar o público potencial de outras revistas mais complexas, que hoje sobrevivem com tiragens baixas, já deveria servir para alegrar os leitores que esperam mais do que simplesmente palavrões e sexo. Mas, além disso, ainda tem Alias que, sozinha, já justifica os R$ 4,50. E, se me permite uma "liberdade-poética", Bendis é foda.

Pronto! Agora essa resenha é oficialmente voltada ao público adulto. Acho...

Classificação:

4,0

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