Memórias do Mauricio
Editora: Panini Comics – Edição especial
Autores: Samantha Flôor, Herbert Berbert, Fabio Coala, Gustavo Borges, Lu Cafaggi, Vencys Lao, Sandro Hojo, Thobias Daneluz, Danilo Beyruth, Laudo Ferreira, Artur Fujita, Eduardo Schaal, Eduardo Damasceno, Luis Felipe Garrocho, Vítor Cafaggi, Eduardo Ferigato, Eduardo Medeiros, Spacca, Júlio Brilha, Guilherme Petreca, Flavio Luiz, Adriana Melo, Magno Costa, Marcelo Costa, Erica Awano, Shiko, Alex Shibao (roteiro e desenhos) e Cris Peter, Omar Vinole, Davi Calil, Paula Markiewicz, Juliana Adlyn (cores).
Preço: R$ 140,00
Número de páginas: 212
Data de lançamento: Agosto de 2016
Sinopse
Momentos decisivos e causos curiosos da trajetória de Mauricio de Sousa, da infância à consagração como o criador da Turma da Mônica.
Positivo/Negativo
Desde os anos 1970 – e possivelmente até antes – Mauricio de Sousa tem sido, além de autor, um personagem das histórias da Turma da Mônica. O gosto pela metalinguagem faz com que criador e criaturas contracenassem muitas vezes ao longo das décadas. Concebido para homenagear os 80 anos do quadrinhista, Memórias do Mauricio o coloca mais do que nunca “do outro lado do lápis”.
Seguindo em parte o modelo que deu certo desde o MSP 50 – Mauricio de Sousa por 50 Artistas, em 2009, o álbum reuniu um time de artistas nacionais para homenagear Mauricio. Dentre eles, foram distribuídas 25 histórias, cada uma contando uma passagem da vida do autor.
Por meio delas, dispostas quase sempre em ordem cronológica, é possível ver o crescimento profissional de Mauricio. De seus dias como repórter policial, passando pelos primeiros tempos em que combinava essa atividade com a de desenhista da tira Bidu, quando ainda trabalhava sozinho, a criação da Mônica, o começo do sucesso, o merchandising, as amizades com grandes artistas, como Will Eisner, Hugo Pratt e Osamu Tezuka, até seus dias como artista e empresário consagrado.
Há também HQs que dão uma ideia de como foi sua infância e outras curiosas, como o dia em que dormiu no carro e acordou no meio de uma feira, ou quando acredita ter visto um OVNI, ou ainda quando, com pouco dinheiro, foi hospedado por Pratt e sem saber em um hotel caríssimo de Veneza, na Itália.
Algumas dessas histórias já haviam sido contadas pelo próprio Mauricio nas crônicas que publicou em um jornal de Mogi das Cruzes, republicou no site da Mônica e que foram, várias delas, reunidas nos dois volumes de Navegando nas Letras – Crônicas, livros lançados pela Globo em 1999 e 2000.
Mas, aqui, o interessante é perceber como o que foi contado por Mauricio ganha outras vozes. Embora algumas HQs não consigam ir muito além da homenagem em si, mesmo que narrando de maneira correta a sequência que lhe cabe, outras se esmeram em tornar sua pequena trama interessante, independentemente do contexto do álbum.
Dentre essas, talvez a melhor seja Cadáver no quintal, em que Danilo Beyruth reconta um causo dos tempos do Mauricio repórter policial, vestido como Dick Tracy. Ele investiga a denúncia de que um homem teria enterrado um corpo em seu quintal. Não só a narrativa é ótima, com um grande desenho e mise en scene, como o desfecho vai muito além do relato original do homenageado, contando algo que ele não poderia saber.
Mas isso rende um grande final para o seu capítulo, o que nem todas as histórias conseguiram amarrar. É o mesmo caso de Ufos? Vi, mas não acredito, de Flávio Luiz, que também subverte um pouco a biografia para criar um desfecho interessante.
Já Sem dinheiro no hotel mais caro do mundo, de Júlio Brilha, em vez de adicionar um fato, o suprime. Nela é contada a história de como Mauricio e sua segunda mulher, Vera, foram parar neste hotel de Veneza em 1971, quando o quadrinhista ganhou o Yellow Kid em um festival de quadrinhos de Lucca, também na Itália. O final mostra o autor em seu estúdio, olhando para o troféu e uma garrafa de vinho, símbolos da aventura recém-vivida.
Acontece que essa crônica terminava de maneira melancólica, quando foi escrita por Mauricio: ele conta que Vera, sua segunda esposa, morreu em um acidente pouco depois de retornarem da viagem. Fica claro que Brilha evita tocar no assunto, não há nenhuma referência ao trágico desfecho no final do capítulo. Talvez porque o tom do álbum seja justamente de alegria.
Há algumas tentativas de arriscar na narrativa. Já comeu içá?, de Gustavo Borges, coloca formiguinhas passeando pelos quadros em suas páginas. Com belos desenhos e programação visual inspirada, é pena apenas que o andamento da trama tenha ficado um pouco confusa, com a caça às iças parecendo começar duas vezes.
Lu Cafaggi, na história O dia em que queimei meus gibis, prefere quadros únicos e centralizados em cada linha, sem bordas, com cenas curtas e preferindo o silêncio a partir de certo momento.
Ao irmão Vítor coube um dos principais momentos: ao ser provocado ("Você é misógino?”), Mauricio percebe que falta mesmo meninas em suas histórias e encontra sua inspiração na própria casa, nas filhas. Cadê as mulheres? mostra de maneira exemplar o nascimento da personagem Mônica, deixando a filha do autor fora de quadro até o momento-chave.
Outros destaques são a muito bem narrada trama de abertura, Olha a cocada, o manjar!, de Samantha Flôor; a emotiva e bem ambientada Ah, essa minha timidez, de Vencys Lao; o excelente desenho de Thonias Daneluz, na episódica Reservista de terceira categoria, e Spacca narrando muito bem o começo dos passos que levaram o Jotalhão a se tornar elefante-propaganda da Cica, em Uma pausa para os comerciais.
Em capa dura e papel couché no miolo, Memórias do Mauricio cumpre sua missão: é uma bela homenagem ao maior quadrinhista brasileiro, por si só um grande personagem. E, em seus melhores momentos, transforma pequenas histórias em grandes histórias.
Classificação
.