Última edição da série Marvel Collection, lançada pela Panini em 2010, que foge do padrão de minissérie apresentado até então dentro da coleção. Mitos Marvel reúne um sexteto de histórias fechadas analisando a origem de alguns dos principais heróis da "Casa das Ideias".

Em meia dúzia de contos ilustrados - apresentando (ou recontando) o surgimento do Homem-Aranha, X-Men, Quarteto Fantástico, Hulk, Capitão América e Motoqueiro Fantasma -, o leitor brasileiro descobre mais alguns detalhes dos primórdios desses vigilantes. Trata-se de mais uma tentativa da Marvel para contextualizar suas criações ao panorama pop atual, baseando-se nas edições de estreia dos personagens, nas décadas de 1940, 1960 e 1970.

É notório que a maioria dos fãs sabe até mesmo o mais ínfimo pormenor do acidente radioativo que deu poderes aracnídeos ao estudante Peter Parker, da exposição a uma tempestade cósmica sofrida por Reed Richards e sua tripulação, ou mesmo do incidente com raios gama que liberou e transformou a fúria interna e as incertezas psicológicas de Bruce Banner em algo monstruoso, literalmente.

Esses fatos foram tão reiterados em dezenas de releituras e flashbacks ao longo de suas respectivas séries, que despertam as mais antagônicas opiniões. Não raro, tornam-se um aborrecimento regular ao longo dos anos.

Mas aqui o objetivo é analisar o conjunto da obra em si, divorciada das mesmices ad nauseam já comentadas.

Todas as histórias foram elaboradas pelo escritor Paul Jenkins e o artista Paolo Rivera. Este último, inclusive, baseou boa parte de sua ótima arte pintada nos traços clássicos em que cada personagem debutou nas HQs, emulando grandes nomes como Jack Kirby, Steve Ditko e Mike Ploog em determinadas cenas.

Três aventuras se destacam por explorar em primeiro plano a psicologia dos personagens pouco antes das grandes mudanças que viriam a sofrer, em maior ou menor intensidade: Hulk, Motoqueiro Fantasma e Capitão América.

Neste quesito, o cientista Bruce Banner é definitivamente o centro das atenções, fisgando a atenção do leitor quase instantaneamente. As inquietudes, contragostos e ansiedades momentos antes do acidente dão um tom mais interessante do que sua transformação em seguida, acrescentando detalhes sobre sua psique conturbada.

Já o motociclista Johnny Blaze personifica o desespero e a irracionalidade de alguém que julga não ter nada a perder quando dominado por uma forte emoção. O "contrato" celebrado com o diabo resulta num diálogo bem elucidativo, embora efêmero, acerca da real motivação do personagem.

Sua primeira transformação no espírito da vingança, digna de seu talento como acrobata, se torna uma das mais criativas já elaboradas para o anti-herói.

No Capitão América, o sempre presente patriotismo anacrônico somente enfatiza seu inquebrantável espírito de luta e a busca pela liberdade, pela verdade e pela justiça do modo de vida norte-americano, depois que Steve Rogers ganha seus poderes. Quem leu o álbum Capitão América - A escolha (o segundo desta coleção) já sabe o que esperar nesse contexto.

O Quarteto Fantástico protagoniza uma história de bastidores, passada pouco depois do acidente cósmico, na linha do que fora feito em Quarteto Fantástico Anual # 1 (lançado pela mesma Panini, em 2007).

Diferentemente deste último, no qual o excesso de politicagem torna a obra carregada e exaustiva, a leitura deste especial se mostra uma das mais interessantes - com destaque para a página 42, que sintetiza bem os pensamentos e as emoções de cada um quando seus poderes afloram.

Em X-Men, os filhos do átomo praticamente se tornam coadjuvantes de peso numa aventura em que o Professor Xavier e Magneto são destaques. A eterna dicotomia ideológica entre os dois cria bons momentos, tanto em cenas de ação como no próprio debate que travam sobre a coexistência entre humanos e mutantes, que muitas vezes deixa o leitor em cima do muro acerca do tema.

Por fim, o Homem-Aranha tem revisitada sua origem pela segunda vez. A primeira foi no especial Homem-Aranha - Com grandes poderes..., que inaugurou esta coleção.

Ou seja, o leitor apenas reviverá seu acidente no laboratório, o descobrimento de suas incríveis capacidades, a utilização desta no showbiz e a consciência dos grandes poderes e das grandes responsabilidades depois do falecimento do tio Ben. Nada de novo no horizonte, apenas mais do mesmo.

Em suma, esta edição por ser vista como um trabalho honesto e despretensioso. Não há necessidade - nem intenção, à primeira vista - de servir como um provável retcon, algo tão em voga no mercado.

Assim, seria mais adequado classificar esta obra como uma porta de entrada para leitores com pouco conhecimento desses personagens, que porventura venham a surgir, atraídos pelas adaptações cinematográficas já lançadas.

Como consta na quarta capa, é apenas um novo olhar sobre a origem de alguns dos mais populares super-heróis da Marvel, acrescentando e diversificando alguns detalhes na trama para enriquecer a leitura.

Por fim, resta parabenizar a Panini pela publicação desta série de álbuns em acabamento primoroso, histórias competentes e preço acessível. Uma coleção desse porte merecia ganhar mais alguns números. Fica a dica.