O DECÁLOGO # 10 – A ÚLTIMA SURATA
Autores: Frank Giroud (roteiro), Franz Drappier (arte) e Gabrielle Horvath e Paul (cores). Publicado originalmente em Le Décalogue - Volume 10 - La dernière sourate.
Preço: 15,50 euros
Número de páginas: 56
Data de lançamento: Março de 2005
Sinopse: 652. As conquistas árabes reuniram sob o mesmo estandarte povos tão distintos quanto os egípcios, os persas, os sírios, os libaneses e os afegãos. E o único elo deste vasto conjunto é a religião. Uma religião que o profeta Maomé transmitiu essencialmente pela palavra, motivo pelo qual, 20 anos após a sua morte, as divergências florescem, ameaçando a coesão do império e a própria credibilidade do Islão.
Para obliterar esse perigo, o califa Uthmân encarregou alguns fiéis de recolher os testemunhos mais credíveis para, posteriormente, inseri-los numa versão única e definitiva do Corão.
Tayeb Abou Tayeb é um desses compiladores e pensa ter executado bem a sua tarefa... até o dia em que encontra Mahdjubah, filha de um companheiro de Maomé assassinado sob estranhas circunstâncias.
A mulher revela a Tayeb a existência de uma surata desconhecida, em forma de decálogo, que o próprio profeta teria redigido numa omoplata de camelo. Mas esses preceitos de tolerância ameaçam demais os interesses da alta cúpula do poder.
Por isso, Tayeb e sua protegida Mahdjubah encontram muitas dificuldades para obter a omoplata. A tal ponto que o compilador não demora e deparar com um terrível dilema: perder a vida... ou a alma!
Positivo/Negativo: O Decálogo é um grande sucesso na Europa. A série foi inicialmente lançada na França, pela Glénat, a partir de janeiro de 2001. No 17º Festival de Amadora, em Portugal (onde foi publicada pela Asa em álbuns luxuosos em capa dura), por exemplo, uma bela exposição dedicada à obra era uma das que mais chamava a atenção do público.
A trama gira sempre em torno do Nahik, um livro definido como um romance excepcional, um objeto de arte, um tesouro bibliográfico, um tomo sagrado, um instrumento político ou, simplesmente, uma ponte entre dois seres.
No Nahik estaria presente o equivalente muçulmano dos Dez Mandamentos do cristianismo. E teriam sido escritos sobre a omoplata de um camelo, em árabe Hidjâzì. Seriam eles:
1) Não matarás;
2) Saberás escutar a tua consciência, para nela ouvir a voz de Deus;
3) Não atribuirá a Deus nenhuma imagem;
4) Não prestarás falso testemunho;
5) Perdoarás os teus inimigos;
6) Honrarás pai e mãe;
7) Não enganarás os que te amam;
8) Mostrar-te-ás caridoso com os fracos, os diminuídos e os pobres de espírito;
9) Não cobiçarás o bem do próximo;
10) Farás amar Deus pelo exemplo e não pela força.
A série é formada por dez álbuns independentes, mas que possuem uma ligação. Assim, podem ser lidos isoladamente ou como uma saga. Em comum, todos mostram as paixões e ganâncias que movem o homem desde a aurora dos tempos e também suas incertezas frente ao Além e às suas relações com o divino.
Neste último tomo, enfim, é revelada a origem de todo o mistério da série: a última surata, escrita numa omoplata de camelo, possivelmente pelo próprio profeta Maomé.
Frank Giroud constrói a trama de forma inteligente, mostrando a todo momento o que a revelação do decálogo faria com a situação do poder. Em outras palavras, divulgar preceitos que propagariam a paz não era, de modo algum, interessante.
Depois que Tayeb passa quatro anos na cadeia e reencontra Madjubah, o destino novamente faz a sua parte. Ele descobre que o decálogo não fora escrito por Maomé, mas sim por um escrivão qualquer e que o profeta não chegou sequer a lê-lo, pois morreu antes.
E quando Tayeb está à beira da morte, o amor (e depois a fatalidade) o impede de revelar a verdade a Madjubah. Dessa forma, nasce a lenda da omoplata que carrega o decálogo.
É extremamente interessante a forma como Giroud mostra a propagação da fé. Mesmo que ela seja baseada em uma mentira. Fica claro que o seu humano, independentemente de sua crença religiosa, acredita no que quer.
Perto do final do álbum, o autor ainda justifica o engrandecimento da aura da lenda a respeito da omoplata baseando-se num fenômeno natural chamado Fata Morgana, que consiste num vento terrível do deserto cuja aproximação pode ser acompanhada por estranhas miragens.
Pena que este desfecho tenha sido retratado num traço tão tradicional. O belga Franz Drappier (que morreu em 2003, aos 54 anos) não ousa em nada. Aposta numa diagramação sem arroubos, com pouca variação de enquadramentos e cores opacas.
É um desenho anatomicamente correto, mas que limita-se a traduzir o roteiro em imagens. Parece "velho". O final de O Decálogo merecia mais.
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