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O DECÁLOGO # 2 - A FATWA

1 dezembro 2007


Título: O DECÁLOGO # 2 - A FATWA (Edições
Asa
) - Série em dez volumes

Autores: Frank Giroud (roteiro), Giulio De Vita (arte e capa) e E. P. Faucon (cores).

Preço: 14 euros

Número de páginas: 60

Data de lançamento: 2002

Sinopse: Saberás escutar a tua consciência, para nela ouvir a voz de Deus - Depois de assistir a uma apresentação de dança de sua namorada Aline, o muçulmano radical Merwan Khadder se revolta com a sensualidade da interpretação, a insulta e, por fim, a agride. Fim de relacionamento.

Arrependido, ela parte atrás da moça, que está embarcando no Expresso do Oriente, para o início de uma turnê de sua companhia de dança por vários países.

Após levar o fora definitivo, ele está saindo do trem quando cruza com uma figura que lhe parece familiar. Entrando clandestinamente no comboio, ele puxa conversa com o homem, que se apresenta como Kateb Mselati.

Mas, na verdade, ele é Halid Riza, turco autor de uma obra - A Última Surata (cada surata corresponde a um dos 114 capítulos do Corão, livro sagrado do islamismo), que, segundo os muçulmanos, desacreditou o Islã. Por isso, ele vive fugindo pelo mundo com a cabeça a prêmio: dois milhões de dólares. E Merwan acabou de descobri-lo por acaso.

Riza escreveu seu livro com base no Nahik, considerado uma invenção pelos muçulmanos. E enquanto pergunta para o jovem enfurecido por que sua obra lhe é tão ofensiva, ouve como resposta a seguinte frase: "Um verdadeiro crente não tem que raciocinar".

Então, como está prestes a morrer (apesar de Merwan titubear no momento de executar sua "missão"), o escritor pede um último desejo: que o rapaz leia um capítulo do Nahik. Se quando acabar, não estiver convencido de que não deve se tornar um assassino, pode dar cabo da vida do autor sem resistência.

Mas Riza esconde um outro segredo: está condenado à morte devido a problemas de saúde. Por isso, decide usar Merwan para abreviar seu sofrimento. Após a leitura, o jovem muçulmano se nega, mas é tarde demais: ele já está envolvido numa trama que mudará para sempre a sua vida.

Positivo/Negativo: Um escritor caçado por muçulmanos radicais. Se alguém aí pensou em Salman Rushdie, indiano autor do livro Versos Satânicos (1989), que passou a ser inimigo numero 1 do Islã, acertou. Parece clara a inspiração de Giroud para este segundo tomo de O Decálogo.

Desta vez, a história se passa, possivelmente, no final de 1997 - só há menção à data em jornais que aparecem nos quadrinhos.

E, a exemplo do que fez no primeiro tomo,
o autor conduz o roteiro de forma muito competente. Do início, com a briga
entre os namorados, ao final, permeia as páginas de reviravoltas que vão
atraindo o leitor e fazendo-o, por exemplo, mudar de opinião a respeito
de Merwan, que primeiro parecia apenas um machista xiita, mas é o "herói"
da aventura.

A mescla de cenas em flashbacks no decorrer da história vão tornando as coisas claras para o leitor, mas não para Merwan. E isso deixa tudo ainda mais interessante.

Na volta a Paris, mesmo sem ter tido a intenção de matar Riza, Merwan é considerado um herói do Islã, por ter executado a Fatwa (um pronunciamento legal no Islã emitido por um especialista em lei religiosa - neste caso para dar cabo do escritor). Mas quando está viajando para Marselha, para fugir da perseguição policial, revela à sua amiga de longa data Latifa que leu o Nahik e passou a questionar se tudo em que acredita é realmente verdade.

Ele só não contava que Latifa o entregasse para os poderosos do seu grupo. Ou seja, Merwan se torna vilão e, claro, precisa ser silenciado; e o Nahik, destruído. Afinal, aquilo "abalaria a fé dos crentes no Islamismo".

Giroud conta tudo isso mostrando os dois lados: o de Merwan, mais lúcido após passar os olhos no Nahik; e o dos radicais, que simplesmente se recusam a acreditar que aquilo seja verdade. E mesmo com todas as diferenças ideológicas, é o valor da amizade que norteia o final da trama.

Em tempo: a súplica de Merwan a Alá, logo na primeira página, só se torna mais clara no final do álbum. E faz muito mais sentido se, quando se acabar a leitura, voltar-se ao começo.

A arte de De Vita é linda. O italiano trabalha com enorme categoria as expressões faciais e é ótimo tanto em cenas de ação quanto em tomadas mais paradas. Seu detalhamento nos cenários também é digno de elogios. E tudo com traço bastante realista.

Sua diagramação das páginas é mais ousada, e ele distribui os quadros em diversas formas como se estivesse brincado. O resultado é bastante agradável. Mérito também para o colorista Faucon, cujo trabalho evidencia ainda mais o belo traço de De Vita.

Este tomo consegue algo difícil: manter a qualidade do primeiro volume, o que certamente atraiu mais fãs e críticas positivas por parte da imprensa para O Decálogo.

A série é um grande sucesso na Europa. Foi inicialmente lançada na França, pela Glénat, a partir de janeiro de 2001. No 17º Festival de Amadora, em Portugal, por exemplo, uma bela exposição dedicada à obra era uma das que mais chamava a atenção do público.

A trama gira sempre em torno do Nahik, um livro definido como um romance excepcional, um objeto de arte, um tesouro bibliográfico, um tomo sagrado, um instrumento político ou, simplesmente, uma ponte entre dois seres.

O Nahik seria o equivalente muçulmano dos Dez Mandamentos do cristianismo. E teriam sido escritos sobre a omoplata de um camelo, em árabe Hidjâzì. Seriam eles:

1) Não matarás;
2) Saberás escutar a tua consciência, para nela ouvir a voz de Deus;
3) Não atribuirá a Deus nenhuma imagem;
4) Não prestarás falso testemunho;
5) Perdoarás os teus inimigos;
6) Honrarás pai e mãe;
7) Não enganarás os que te amam;
8) Mostrar-te-ás caridoso com os fracos, os diminuídos e os pobres de espírito;
9) Não cobiçarás o bem do próximo;
10) Farás amar Deus pelo exemplo e não pela força.

Além disso, os manuscritos aparecem sempre acompanhados de aquarelas pintadas por Desnouettes, durante a campanha de Bonaparte no Egito, no século 17.

A série é formada por dez álbuns independentes, mas que possuem uma ligação. Assim, podem ser lidos isoladamente ou como uma saga. Em comum, todos mostram as paixões e ganâncias que movem o homem desde a aurora dos tempos e também suas incertezas frente ao Além e às suas relações com o divino.

Com o bem-vindo retorno das HQs européias ao mercado nacional, O Decálogo é uma excelente pedida para pintar nas livrarias. Fica a sugestão para as editoras.

Classificação:

4,0

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