O HOMEM-ABRIL - CLÁUDIO DE SOUZA E A HISTÓRIA DA MAIOR EDITORA BRASILEIRA DE REVISTAS
Título: O HOMEM-ABRIL - CLÁUDIO DE SOUZA E A HISTÓRIA DA MAIOR
EDITORA BRASILEIRA DE REVISTAS (Opera
Graphica) - Livro teórico
Autores: Gonçalo Júnior
Preço: R$ 49,00
Número de páginas: 304
Data de lançamento: Dezembro de 2005
Sinopse: A história das três primeiras décadas da Editora Abril, a partir da vida profissional do jornalista Cláudio de Souza que, em quase 25 anos, foi um de seus mais destacados colaboradores.
Positivo/Negativo: No excelente A Guerra dos Gibis, Gonçalo Júnior mostrou a formação do mercado de quadrinhos no Brasil. Com O Homem-Abril, ele não só complementa muitas informações de seu livro anterior, como amplia sua pesquisa e discussão para o mercado editorial como um todo. E faz isso novamente de forma exemplar.
O texto de Gonçalo é ágil e envolvente, mas sua maior qualidade talvez seja a imparcialidade. Ele evita ser tendencioso a simplesmente enaltecer ou denegrir a figura dos biografados, apenas tenta apresentar os fatos da melhor maneira possível.
O livro se propõe a contar a história dos primeiros 30 anos da Abril sob o ponto de vista de Cláudio Souza, mas há claramente um segundo protagonista na história: Victor Civita, fundador da editora. Não chega a ser um problema, na verdade era algo inevitável, em virtude do tema.
Na maioria das biografias sobre Civita, há uma aura heróica e idealizada criada pela forma como ele conduziu a Abril ao posto de maior editora do Brasil. O livro de Gonçalo tem o mérito de apresentar uma versão menos romantizada e com mais desafios do que se imagina.
Há, por exemplo, algumas revelações sobre o fundador da editora. Uma delas é o fato de ter permanecido no anonimato por dez anos, já que era estrangeiro e as leis o impediam de ser dono de uma empresa de comunicação. Até Civita conseguir sua nacionalidade brasileira, as revistas da Abril saíam apenas com a assinatura de seu sócio, Gordiano Rossi, como diretor responsável.
Fato semelhante é retratado em Guerra dos Gibis, com a revelação de que Adolfo Aizen, fundador da Ebal, mantivera sua nacionalidade russa sob segredo por décadas. A primeira revista com editorial assinado por Civita foi a Quatro Rodas. Outra revelação é a de que ele teria recorrido a empréstimos estrangeiros, algo questionável sobre o ponto de vista legal na época.
Essas revelações, contudo, não tiram o mérito de Civita como grande empreendedor e homem de visão, pelo contrário. Gonçalo mostra de forma clara a principal diferença de Civita em relação à maioria dos empresários da época. Em vez de fundar a Abril no Rio de Janeiro, onde já estavam as maiores editoras e o grosso do mercado publicitário, ele escolheu São Paulo, até por se identificar com a imensa colônia italiana do estado. A decisão foi tida como impensada na época, mas o empresário enxergou o potencial do estado paulista que já era o maior gerador de riquezas do Brasil. A forma como ele foi montando, aos poucos, toda a infra-estrutura para só então lançar várias revistas também é um modelo de estratégia.
É interessante notar também que boa parte das revistas da Abril não alcançaram sucesso imediato. Algumas como a Capricho e a Veja, hoje duas das mais rentáveis, quase levaram a editora à falência. Sobreviveram graças à insistência e à visão de seus criadores, que foram aprendendo com os erros cometidos.
Já outras como a Playboy, a Exame e a própria Veja ficaram na "geladeira" por muitos anos até a editora ter a estrutura necessária para publicá-las. E ainda tem muito editor (especialmente os de quadrinhos) querendo emplacar títulos logo na primeira edição...
O papel de Cláudio nessa consolidação da Abril foi crucial. Ao longo dos anos se tornou um dos homens de confiança de Civita. Atuou em vários setores da empresa, inspecionou bancas, ajudou a organizar a gráfica e a distribuidora (hoje conhecida como Dinap) e atuou na criação de vários títulos de sucesso, como Capricho, Cláudia e Placar.
Além disso, Cláudio, apaixonado por quadrinhos, tem seu nome ligado ao lançamento de publicações como Mickey, Zé Carioca, Disney Especial, Mônica e outros.
Aos amantes de histórias quadrinhos o livro reserva passagens marcantes. Uma remete os primeiros anos da Abril. Assim como outras editoras, suas primeiras publicações foram revistas de quadrinhos: a primeira e a mal-sucedida Raio Vermelho e O Pato Donald.
Outro momento importante é a criação do título do Zé Carioca, cujas histórias tiveram que ser produzidas no Brasil por conta da escassez de material do personagem. Isso originou o núcleo de quadrinhos da Abril, que chegou a produzir mais páginas que o próprio estúdio norte-americano da Disney e criou diversos personagens, como o Morcego Vermelho.
Outra passagem digna de nota é quando Cláudio assume o Departamento de Publicações Infanto-Juvenis, em 1971. Em quatro anos no cargo, ele praticamente triplicou a tiragem mensal das revistas: de 1,4 milhões para 4 milhões (ah, se alguma editora vendesse isso hoje). Fundou ainda o Centro de Criação, para formar desenhistas e roteiristas nacionais.
Uma pena é descobrir que a saída de Cláudio do departamento infanto-juvenil foi provocada por intrigas internas. Se projetos como a Crás ou Projeto Tiras (este já na gestão de Waldyr Igayara de Souza) tivessem perdurado, a realidade do mercado de quadrinhos nacionais poderia ser outra atualmente.
Uma curiosidade: ao sair da Abril, em 1975, Cláudio montou a Idéia Editorial, cujo logotipo é bastante semelhante ao da Image Comics.
O declínio vertiginoso das vendas de quadrinhos nos anos 90 também ganha explicações esclarecedoras no livro. Dois fatores são ressaltados: a liberação das revistas de sexo, que teriam conquistado a parcela adulta do público, e a parceria com a Panini no mercado de álbuns e figurinhas que concorriam com os gibis dentro do segmento infanto-juvenil.
Ou seja, os leitores de HQs passaram a comprar revistas de sexo e álbuns de figurinhas e não houve uma estratégia eficiente para recuperar ou renovar esse público.
De negativo, há alguns incômodos erros de digitação, um desrespeito muito freqüente com o leitor nas publicações cada vez mais caras da Opera Graphica. Também é incômodo o fato de o livro não ter tido a divulgação merecida na imprensa. Até agora só foi noticiado em veículos especializados em quadrinhos e, mesmo assim, não em todos.
Será que a formação de um dos maiores conglomerados de comunicação do País não é algo digno de nota?
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