O Maestro, o Cuco e a Lenda
Editora: Texugo Editora – Edição especial
Autor: Wagner Willian (texto e arte).
Preço: R$ 60,00
Número de páginas: 208
Data de lançamento: Dezembro de 2017
Sinopse
Neto de um maestro, um sonoplasta que vivia na Escócia retorna ao Brasil após ser comunicado por sua mãe da morte do avô que o criou.
A sua chegada ao Brasil será um tanto estranha, pois reviverá situações regressivas, carregadas de lembranças dos tempos que morou com o avô. Ele experimenta um processo catártico para encontrar motivos que o façam decidir pela venda ou não da fazenda que pertencia ao famoso maestro.
É durante esse processo psicodramático que vive uma aventura ao tentar desvendar os mistérios simbólicos de um pássaro, o Cuco. O personagem perpassa várias referências míticas e culturais que o fazem construir a própria lenda do animal, conduzido imaginariamente pela sua amiga, a índia Kauane.
Mas será que ele descobrirá os segredos que ligam a figura do seu avô ao Cuco? O que essa lenda tem em comum com o universo brasileiro?
Positivo/Negativo
Logo nas primeiras páginas, esta graphic novel traz uma citação de V. Sokolov, um pianista russo do Século 19, sobre o canto dos pássaros. E a narrativa transcorre entre melodias e ruídos que passam pela vida do jovem sonoplasta. O álbum foi publicado no Brasil pela editora do autor, a Texugo, e também na Europa, pela Polvo (Portugal) e Casterman (França).
Wagner Willian já venceu o Jabuti de 2015 como ilustrador e o HQ Mix de melhor roteirista com Bulldogma (Veneta), em 2016. A trama de O maestro, o Cuco e a Lenda é uma viagem pelo tempo por meio dos sonhos, um tanto surreal, mas carregada de fantasia e lendas folclóricas.
O mais curioso é que William faz um thriller psicológico por meio da regressão. Explora questões do subconsciente do personagem que volta no tempo para o seu passado no sítio do seu avô. Muitas memórias o levam a entender os mistérios da vida que o conduziram de volta àquele lugar. A música e o canto do Cuco são os condutores dessa partitura.
A lenda do Cuco é tão instigante quanto às afamadas histórias de terror em torno do corvo, escritas por Edgar Allan Poe. Ou seja, mais um pássaro se torna uma metáfora sombria no universo da fantasia e do terror.
O autor explora elementos das fábulas, como Alice no país das maravilhas, com uma ambiência reflexiva bastante similar ao clássico conto. Há referências metaliterárias em toda a narrativa, conduzida por uma jovem com nome indígena, Kauane.
Assim, o autor cria uma aproximação com o cenário nacional. Seria ela a nossa Alice?
A narrativa explora o drama psicológico do protagonista, que foi vítima de um abuso na infância. Esse acontecimento é cercado de enigmas. Pequenas pistas conduzem o leitor a um desfecho surpreendente: quem será a figura responsável pelos traumas que marcaram a vida dele?
Willian explora figuras conhecidas da cultura nacional como o Mazzaropi e o Capiroto, e insere referências à arte mundial, como Escher, compositores clássicos como Bach, Schumann, Wagner, Maria Callas, Tchakovsky, Schubert etc.
Tudo transcorre em uma floresta cheia de desafios da natureza, um ambiente propício a aventuras. A dinâmica narrativa explora bastante o gênero aventura, mas pode fazer o leitor não captar alguns detalhes do roteiro que ajudam a compreender o final e, assim, desvendar o enigma da história do personagem.
Porque, como a narrativa traz muitas referências e conexões, isso atrapalha um pouco a transmissão da mensagem sobre o abuso na infância, tema que fica remanescente, subliminar e contundente. Com isso, cabe ao leitor mais de uma interpretação para captar o verdadeiro problema do personagem.
Na trama, Willian faz algumas conexões com seus outros trabalhos. As ninfas voadoras salvas pelo personagem de uma emboscada representam a força contra a opressão e a liberdade da figura feminina, e são chamadas de Joanas – o autor lançou, em dezembro de 2018, O martírio de Joana Dark Side.
Outra ligação é o aparecimento de um cão da raça buldogue nas cenas finais, que remete à obra Bulldogma, publicada pela Veneta.
O traço de Wagner Willian é incrível. Seu desenho, todo em preto e branco e feito digitalmente, emula muito bem as nuances do grafite. E isso se reforça quando o autor explora ricamente as páginas duplas, trechos sem texto e brinca com a ausência de sarjetas (o espaço em branco entre os quadros) e requadros em algumas partes com sobreposições de cenas.
O acabamento da edição, infelizmente, deixa a desejar. Os textos da capa e da contracapa não estão centralizados, deixando tudo meio "torto". Faz falta também uma biografia do autor. Há ainda alguns problemas de revisão e digitação.
Esta é uma obra que retrata questões psicológicas, um drama sociofamiliar, traumas e conflitos pessoais. Além de se apropriar, com competência, de muitas referências culturais, literárias, folclóricas e da música.
Classificação:
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