Algumas vezes, a simplicidade de uma história em quadrinhos provoca mais reações e impactos do que outras mais "cerebrais". Esta criação do britânico Dave West é exemplo perfeito.

São poucas páginas de enredo, que funcionam mais como um conto ilustrado do que necessariamente uma HQ tradicional (no prefácio, West diz ter enviado à desenhista, Marleen Lowe, justamente uma espécie de conto, em vez de um roteiro quadrinhístico). Simples assim: ele teve uma ideia, não necessariamente original, e a executou de forma eficiente.

O que aconteceu ao homem mais rápido do mundo? conquista nesse viés: o de enredar o leitor num drama cujo teor fantástico dialoga muito bem com sua força trágica. Em poucos quadros, West apresenta a situação, o personagem e o conflito. Dali em diante, são mostrados os desdobramentos dessa breve preparação e já se antevê as consequências antes mesmo de a história ser concluída.

Este se torna, ironicamente, outro mérito da HQ: se olhada com afinco, a trama não guarda surpresas - é, de fato, bastante previsível. O fascínio está em West "jogar" com essa previsibilidade, fazendo com que o leitor tente buscar soluções, durante o desenrolar da narrativa, para um conflito que não tem nenhuma outra possibilidade senão a que vai se testemunhar.

Essa coragem de ser coerente com a proposta e com a própria natureza do protagonista é um dos maiores acertos de West - e, por ser tão simples e óbvio, guarda forte tendência a ser subestimado. No entanto, nem sempre é fácil realizar a contento algo supostamente fácil. O desafio é fazer o simples se tornar complexo. Isso o autor consegue.

A maior controvérsia em relação a O que aconteceu ao homem mais rápido do mundo? está nos desenhos da também britânica Marleen Lowe. Comentários negativos pipocaram a respeito na internet.

Mas o desenho de Marlowe "funciona" justamente por misturar uma noção torta e absurda a um enredo tão cheio de nuances. A arte parece negar a seriedade com quem West trabalha os dilemas de seu personagem, o que, de certa forma, é positivo num trabalho que problematiza, por meio dos quadrinhos, a noção de super-heroísmo tão banalizada nessa mídia e também no cinema, em especial nos produtos Marvel e DC.

A versão brasileira do álbum, a cargo da Gal Editora, é bem cuidada. Tem a história original, diversos pin-ups de artistas convidados, introdução exclusiva de Dave West e uma história curta ambientada no passado do protagonista e ainda inédita na Inglaterra.

Há ainda um texto do editor Maurício Muniz contando como se deu a negociação para lançar a HQ no Brasil. E, no final, há um simpático apelo ao leitor para que este empreste o álbum e permita que outras pessoas conheçam a história do malfadado Bobby Doyle.

Em tempos de capitalismo e consumismo desenfreados, surpreende positivamente o caráter altruísta e camarada desse pedido.