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Os Morcegos-Cérebro de Vênus e outras histórias

10 novembro 2017

Os Morcegos-Cérebro de Vênus e outras históriasEditora: Mino – Edição especial

Autores: Alex Toth, Basil Wolverton, Bob Powell, Charles Stern, Don Perlin, Ernest Schroeder, Fletcher Hanks, Jack Katz, Jack Kirby, Jack Sparling, Joe Certa, Joe Kubert, Joe Shuster, John Giunta, Manny Stallman, Mo Marcus, Rudy Pallas, Sid Cheek, Steve Ditko, Vince Fedora, Wally Wood e Warren Kremer (arte) – Originalmente em Fantastic Worlds # 5, Weird Mysteries #s 2 e 7, Mister Mystery #s 7 e 18, Tomb of Terror #s 3, 7, 14, 15, Mystery Men Comics # 3, Black Cat Mystery # 42, Airboy Comics # 2, Tales of Horror # 4, Fantastic Comics # 1, Lost Worlds # 5, Chamber of Chills # 22, Strange Worlds # 8, Space Adventures #s 11 e 12, Black Magic # 15, Science Comics # 4, Witches Tales #s 13 e 17, The Thing # 15 e Flying Saucers # 1 (tradução de Diego Gerlach).

Preço: R$ 79,90

Número de páginas: 208

Data de lançamento: Julho de 2017

Sinopse

A coletânea traz 31 HQs de ficção científica produzidas nos Estados Unidos entre 1939 e 1954, no período conhecido como Era de Ouro dos quadrinhos.

Positivo/Negativo

Nomes como Júlio Verne (1828-1905) e HG Wells (1866-1946) ou obras como Frankenstein ou O Moderno Prometeu (1818), de Mary Shelley (1797-1851), são alguns elementos que serviram de pilares para sustentar os gêneros de fantasia e ficção científica do século passado e que ainda norteiam ideias e conceitos nas várias formas artísticas pelo mundo.

Bem além de um gênero da ficção especulativa e imaginativa com um pé no futuro, essas histórias não estacionam apenas nas reflexões sobre ciências ou tecnologias e singram por recantos mais reflexivos, políticos, filosóficos e misteriosos da raça humana.

Esta coletânea de quadrinhos, na qual o grosso das HQs é de logo após a Segunda Guerra Mundial, entre 1950-1954 (com mais duas de 1939 e outras duas de 1940), reúne um recorte interessante de material produzido antes do surgimento do Comics Code Authority, criado pelas editoras para regulamentar o conteúdo das revistas, no clamor moralista e anticomunista dominante nos Estados Unidos na época.

A edição é exclusivamente brasileira, fruto do trabalho dos editores Carlos Junqueira e Lauro Larsen em "garimpar" e elaborar um processo próprio de restauração do material que se encontra em domínio público e está em sites de preservação dessa memória.

Uma triagem de um acervo com mais de 30 mil publicações, segundo Larsen, na sua introdução, que resultou nessas 31 histórias com um leque de 23 artistas. Ainda de acordo do coeditor, foi tomada a decisão de restaurar tudo em preto e branco para a melhor apreciação da diversidade de traços, deixando de lado o colorido original.

Nesta imagem acima, de Warren Kremer (1921-2003) – criador do personagem Riquinho, em parceria com Alfred Harvey (1913-1994) –, pode-se observar o cuidadoso trabalho de restauração da página de abertura. Com certeza, a ausência das cores evidencia mais os detalhes dos desenhos, mas priva o leitor do trabalho como um todo (o exemplo mostra como as matizes de Kremer tinham um vigoroso contraste).

Infelizmente, pelas limitações dos créditos da época, quase todos os roteiristas não são nomeados, com exceção de alguns autores que também ilustram e de Joe Simon (1913-2011), cocriador do Capitão América ao lado de Jack Kirby (1917-1994) – aliás, eles repetem a parceria numa das histórias da coletânea.

Interessante observar a narrativa e o traço de Kirby em duas frentes: em 1940, sob o pseudônimo de Michael Griffith, e no começo dos anos 1950, quase uma década antes do seu retorno ao universo de super-heróis, quando iria alcançar o status de realeza nos comics. Esse salto temporal (mesmo sendo colocado na ordem inversa no álbum) mostra visivelmente a sua evolução.

Há espaço para tudo nas páginas de Os Morcegos-Cérebro de Vênus e outras histórias, desde artes "cruas" e tradicionais, passando pelas capengas e altamente sofisticadas.

Dentre o seleto time, está o virtuosismo de Alex Toth (1928-2006), que abre a seleção com seu traço expressionista, ou ainda a robustez grotesca (no bom sentido) de outro veterano, Basil Wolverton (1909-1978), o “Michelangelo da revista Mad”, que assina duas HQs, inclusive a que batiza a obra. Vale frisar que a sua pegada estranha, feia, distorcida e underground é bem anterior ao movimento encabeçado por Robert Crumb.

Outros destaques são as figuras conhecidas dos amantes de super-heróis: Steve Ditko, cocriador do Homem-Aranha e – pasme! – pode ser encontrado em recentes coletâneas de terror como Cripta (Mythos) e Creepy (Devir); ou ainda uma apreciação mais rara de Joe Shuster (1914-1992), um dos autores de um certo Homem de Aço.

Referência nos comics de sci-fi e responsável pelo redesenho do uniforme do Demolidor, Wally Wood (1927-1981) faz uma trinca de histórias sobre contatos imediatos. Este ano, o quadrinhista foi resgatado também pela editora Pipoca & Nanquim com seu personagem dos anos 1970, Cannon.

Autores como Fletcher Hanks (1887-1976) podem ser considerados "datados" ou "ultrapassados" aos olhos de hoje, mas são vitais para a compreensão do gênero, apesar da brevidade da sua carreira. Era um artista completo, que escrevia, desenhava, arte-finalizava e fazia até o próprio letreiramento. Comparado a Stardust e Fantomah (uma das primeiras super-heroínas, antes até da Mulher-Maravilha), o aventureiro Space Smith presente aqui não é seu personagem mais conhecido, outro motivo de ser apreciado.

Sobre as tramas: no geral, devem ser lidas com o devido distanciamento histórico. Porém, não se engane sobre o que está oculto nas entrelinhas. Em pleno anos 1950, são apresentados enredos de vanguarda que falam temas como ecologia e até objetificação feminina.

Geralmente, o rito narrativo da época abre as histórias com a ameaça ou o clímax, para em seguida voltar no tempo e incitar a curiosidade do leitor para saber como se chegou a esse momento. Assuntos traumáticos muito em voga no período, a exemplo das guerras e ameaças nucleares, são corriqueiros na metáfora de alienígenas e invasões.

Apesar de serem predominantemente sci-fi, o terror é praticamente onipresente nas páginas. Algo bastante comum e estreito, principalmente pelo fator do medo do desconhecido. Os finais fatalistas, revelando as mazelas da natureza humana, ou moralistas também estão à vista.

Em Triunfo do Horror, de Toth, há um criativo uso da metalinguagem com os escritores de ficção científica. Já em O Homem que Imaginou o Monstro, de Ernest Schroeder (1916-2006), o mote faz alusão a Joseph Goebbels (1897-1945), ministro da propaganda Nazista que chegou a declarar que "uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade".

HQs baseadas nitidamente em trabalhos de Ray Bradbury (1920-2012) e Wells podem ser vistas, assim como o contrário. No encerramento da coletânea, Warren Kremer fecha seu episódio futurístico com uma ideia presente no desfecho do clássico filme O Planeta dos Macacos, baseado no romance de Pierre Boulle (1912-1994), ficção científica que só seria lançada 15 anos depois.

O álbum da Mino tem capa dura, papel off-set com boa gramatura e impressão. Mas o zelo que tiveram na restauração das imagens não foi acompanhado com a edição do livro em si.

Não só alienígenas, mas uma quantidade grande de erros de revisão e equívocos de edição de texto também invadem a obra. Logo na primeira linha do texto de abertura de um dos editores, tem "a cerca" e a redundância "há dois anos atrás" (que é agravado com um "a 60 anos atrás", no final).

Além de os textos serem truncados, pecando pela pontuação ou composição dos parágrafos, não há uma padronização. Equivocadamente, termos como "Terror", "Norte-Americano" e "Quadrinho" são colocados ora começando com letra maiúscula, ora em minúscula. No prefácio, há deslizes como "cérebo" escrito duas vezes.

Nas breves biografias dos artistas, a padronização também não é seguida: há nome de editoras e títulos com aspas e sem, sentenças grandes repetidas (na de Wally Wood), além de sinais de pontuação deslocados (um "??" no meio da de Kirby).

No índice, títulos originais grafados erroneamente ("Mistery" Men Comics e "Talves" of Horror) e a HQ escrita e desenhada por Kirby em 1940 tem seu pseudônimo creditado como roteirista e o seu nome mais conhecido como desenhista (na bio não é explicado que Michael Griffith é uma outra alcunha do "Rei").

Já nos quadrinhos, em alguns momentos faltou edição de texto para deixá-lo menos entravados. A diminuição de repetições de pronomes já aliviaria o problema.

Ao longo da leitura, ainda há cacófato ("amo ela"), repetição de texto (por duas vezes), erros de digitação, emprego incorreto do "por que" e erro de conjugação verbal.

O destaque positivo fica para a composição das fontes dos títulos e dos balões. Um trabalho bem aproximado das versões originais.

Mesmo assim, em algumas situações, há balões duplos com frases entrecortadas no meio e o espaçamento muito próximo, que chega a atrapalhar a leitura em determinadas situações.

Uma pena, pois esses deslizes graves acabam afetando a nota final de um projeto de resgate que vale ser conferido, principalmente pela raridade de quadrinhos produzidos em torno de 70 a 80 anos atrás, e que o leitor tem a oportunidade de apreciar pela iniciativa de quem se importa com a memória da Nona Arte e de um gênero muitas vezes colocado em segundo plano. Uma coisa de outro mundo.

Classificação:

3,0

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