Se alguém resolver classificar as tiras de Os Sousa na categoria de quadrinhos adultos, talvez não receba objeções.

O estilo gráfico característico dos quadrinhos da Turma da Mônica está lá. Piadas que se valem do artifício da metalinguagem também passam por ali. E o humor não tem nada de picante e impróprio para menores de idade, embora seja tão politicamente incorreto que dificilmente teria vez nos gibis atuais da galerinha do Bairro do Limoeiro.

Mas a comédia de situação e costumes da série, que inicialmente buscava inspiração em fatos da vida de Mauricio de Sousa, tratava de assuntos mais direcionados ao público maduro e de vaga compreensão para as crianças.

Há até insinuações sexuais e de violência doméstica. E, neste caso, ao contrário do que se possa pensar, é o homem que apanha.

Por essas e outras, quem lia as tiras na infância e agora tem nas mãos esta edição de bolso provavelmente rirá pela primeira vez de muitas das piadas.

Família de classe média com todos os problemas comuns a qualquer membro desse nível social, os Sousa são formados por uma esposa dona de casa e o marido assalariado cujo dinheiro é filado pela mulher, que o leva à loucura com "comprinhas básicas" de supérfluos, "pequenas avarias" no carro e um rolo de massa (ou "pau de macarrão") à sua espera quando ele chega tarde de uma farra noturna depois do trabalho.

Para piorar, a paz do casal é ameaçada pela presença - nociva para a casa e divertida para os leitores - do inútil Mano, irmão do chefe da família.

Mano é um "encostado" que não trabalha (e não tem a menor aptidão para isso), vive correndo atrás das mulheres - com as quais não quer nenhum compromisso sério -, costuma colocar o irmão e a cunhada em situações vexatórias e, quando provoca algum problema sério, deixa o casal sozinho, se virando para consertar o estrago.

Suas cantadas amorosas escondem falsas promessas. Mulheres atraentes recebem dele olhadas indiscretas por baixo da saia. Cobradores batem à sua porta. E nada do que diz merece crédito de confiança.

Os Sousa é uma comédia familiar - em todas as acepções dessa palavra - que mostra dificuldades financeiras, traições amorosas e o "jeitinho brasileiro" para resolver ou mascarar problemas, dentre outros elementos rotineiros com os quais as pessoas comuns estão acostumadas a conviver ou, ao menos, ouvir falar que acontece com o vizinho.

São essas desventuras da família que tornam tão divertidas as tiras da série.

Isso explicaria o que disse Valentine Michael Smith - um terráqueo criado em Marte -, personagem principal do romance de ficção científica Um estranho numa terra estranha (obra máxima do escritor norte-americano Robert A. Heinlein), ao entender pela primeira vez uma anedota e afirmar de forma filosófica que a graça de toda piada está sempre no infortúnio dos protagonistas.