VALENTINA DE BOTAS
Editora: L± - Edição especial
Autores: Guido Crepax (textos e desenhos).
Preço: Variável (disponível apenas em sebos)
Número de páginas: 64
Data de lançamento: 1988
Sinopse
Valentina se envolve no estranho caso de Zelda, cuja secretária, Martha, transfigura-se para ganhar sua aparência e depois matá-la.
Positivo/Negativo
Criada pelo italiano Guido Crepax à imagem e semelhança da atriz norte-americana Louise Brooks (1906 - 1985), a fotógrafa Valentina Rosseli sempre esteve à frente de seu tempo, nos quadrinhos e no mundo real.
Virou ícone de homens e mulheres e viveu o amor livre e a independência, em histórias em quadrinhos que, além de divertir, faziam pensar.
Foram poucas as aventuras que protagonizou, mas suficientes para levá-la ao panteão de musas da cultura pop.
Em Valentina de botas, três episódios interrelacionados formam um universo onírico com miríades de imagens surreais, ocasionalmente pontuado por lapsos de sobriedade, como um hipotético delírio escrito por Lewis Carrol e ilustrado por Salvador Dalí.
A diagramação, ora tradicional, ora caótica, mostra quadros com ou sem delimitações, além de diferentes tipos de tracejados para separar sonho, realidade e flashback.
E as páginas alternam sequências sem textos e outras com muitos recordatórios e balões de diálogos, em que a personalidade dos personagens é minuciosamente detalhada.
Lançado originalmente em 1970, ainda sob forte efeito do psicodelismo, lisergia e emancipação sexual característicos do movimento de contracultura hippie, o álbum, essencialmente erótico - com ênfase na prática do sadomasoquismo -, aborda temas como droga e alucinações.
Percebe-se, contudo, os limites que Crepax impõe em Valentina de botas. Referências a drogas injetáveis não passam de um close na seringa antes de ela ser aplicada; o lesbianismo é apenas sugerido, sem o ato consumado; e, apesar da nudez presente em praticamente todas as páginas, não aparece nenhuma genitália.
Valentina e outras séries de Crepax costumavam ter significados ocultos que somente os editores das obras tinham o privilégio de entender. O autor fazia questão de explicá-los, oralmente, sempre que entregava as páginas originais.
Mas a interpretação própria de cada leitor não torna a leitura menos interessante.
Também são muitas as citações à cultura erudita, nos livros, filmes, músicas e pinturas que desfilam na série.
É interessante notar que algumas dessas citações, como o título de um livro na estante em segundo plano numa cena, exprimem de forma implícita - ou explícita, para quem está acostumado com as artimanhas criativas de Crepax - os sentimentos do personagem naquele instante, sem a necessidade de um recordatório ou balão de pensamento.
Não é mesmo fácil ler Valentina. Como argumentam alguns dos pouco afeitos às aventuras da personagem, se não fossem os desenhos primorosos - e perfeitos em todas as acepções que as artes gráficas permitem analisar - seria difícil não se cansar antes da última página.
No entanto, fugir do desafio de entender as HQs da personagem é a melhor maneira de não ter no currículo de leitura uma das melhores obras da história dos quadrinhos, influência marcante para a explosão da pop art e um dos baluartes das liberações sexual e feminista, nos anos 1960.
Classificação: