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Wilson - Quadrinhos na Cia.

9 março 2012

WilsonEditora: Quadrinhos na Cia. - Edição especial

Autor: Daniel Clowes (roteiro e arte).

Preço: R$ 39,00

Número de páginas: 80

Data de lançamento: Fevereiro de 2012

Sinopse

A ironia e a sinceridade "rinocerôntica" são os principais elementos do discurso de Wilson. Ele é um homem de meia-idade, bastante ranzinza, vivendo seu cotidiano e lidando com diversos problemas familiares.

Positivo/Negativo

"O que eu sei é que a vida é dura se você não tiver com quem dividir".

Esta é uma frase de Wilson. Diferentemente do que podia acontecer e ser uma "frase de ouro" para um fechamento de página, ela está no meio da página.

Importante que se explique que a graphic novel foi organizada como histórias de uma página, que funcionam independentemente umas das outras, mas criam uma força de significação ao serem agrupadas entre capas e intituladas com o mesmo nome.

Cada uma dessas páginas é desenhada de modo diferente. Nas mais de 70 do álbum, Daniel Clowes varia tanto seu traço que parece se tratar de artistas diferentes. Essa mudança de estilos causa uma situação estranha na leitura. Mas uma estranheza boa.

Vale notar que o realismo não é uma preocupação em Wilson. Embora todas as ações cotidianas sejam reconhecíveis, o recurso de texto é do teatro. O personagem monologa pelos quadrinhos em voz alta e conversa (ou melhor, discursa) para outros personagens que não o ouvem ou reagem - às vezes, nem sequer se importam com seu interlocutor.

Antes de prosseguir sobre esse estranhamento, vale mencionar uma peculiaridade da obra. Os outros álbuns de Clowes eram coletâneas de séries publicadas, em sua maior parte, na revista Eightball, como Mundo fantasma e Como uma luva de veludo moldada em ferro.

Todas essas séries se compõem de tramas curtas, de poucas páginas. Parecido com Wilson. Mas há uma grande diferença: este álbum não foi publicado anteriormente em capítulos individuais, embora se prestasse a isso.

Aliás, no texto da última página desta edição da Quadrinhos na Cia., ficou confuso dizer que Wilson é a primeira graphic novel de Clowes, sendo que, linhas acima, esses outros trabalhos de sucesso do autor são enumerados com o mesmo termo graphic novel. Apesar de graficamente caprichado, o álbum carece de textos complementares, que certamente o enriqueceriam. E ainda há uma mancada feia de revisão na página 45 (uma troca de "mau" por "mal"). Mas nada que tire o brilho da obra.

Afinal, a fragmentação proposital do roteiro de Clowes, embora linear, mostra como é possível saltar de momentos do cotidiano para outro. Se as ações mostradas já são bastante simples e rotineiras, os saltos indicam um marasmo imaginável.

Há também uma ótima sacada narrativa de Clowes: surpreender o leitor. Ao não dar todas as informações sobre uma ação quando a apresenta, ele gera a possibilidade de mostrar isso depois e impactar, além de deixar uma impressão de um álbum costuradinho e unificado.

Esses saltos, acompanhados da mudança de estilos de arte, correspondem a alterações na forma como o personagem encara o mundo. E assim, as coisas mudam, o tempo passa e quando o leitor percebe (e também o próprio Wilson) já se passaram seis anos e a vida continua estagnada.

É meio como a própria vida de cada um de nós. As pessoas se enterram entre as urgências do dia a dia e se esquecem de tratar do que importa. Para alguns, um dos grandes males do Século 21, a procrastinação.

Mas isso é visto em um personagem que não é o leitor, embora a identificação seja bastante provável. Wilson funciona como uma espécie de antilivro de auto-ajuda: propõe uma reflexão sobre a própria vida, mas não há os incentivos para que se transforme; existe somente o retrato daquele que não se acerta. Retrato reconhecível em qualquer espelho ao alcance da mão.

"Um banho quente; pisar nas folhas secas - de repente, essas merdas todas começam a ter importância."

Ao final de tudo isso, o leitor já se divertiu, emocionou, se irritou, resta somente uma melancólica e tardia epifania. Ou uma vontade de epifania. E assim se encerra o gibi Wilson e a vida continua, do jeitinho que ela é.

Classificação

5,0

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