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TEMPOS DE GUERRA

Por Delfin
1 dezembro 2010

TEMPOS DE GUERRA

Editora: Book Editora – Edição especial

Autores: Luís de Abreu (enredo) e José Duval (roteiro e arte).

Preço: Não consta da edição

Número de páginas: 64

Data de lançamento: 1993

 

Sinopse

Num futuro não muito longínquo, um jovem chamado Iágar chega à megalópole, abrindo novos horizontes e colocando-o no centro de uma guerra entre párias e poderosos, na qual vencer parece algo improvável.

Positivo/Negativo

Depois de O Entrincheirado Hans Ribbentrop, a dupla Luís de Abreu e José Duval produziu uma graphic novel futurista e distópica, que, assim como sua antecessora, teve pouca visibilidade na mídia.

Megalópoles, barreiras sociais, corporações e a arquitetura do poder são alguns dos temas enfocados por Duval em sua obra mais pessoal, dada a participação reduzida de Abreu no processo de produção de Tempos de Guerra.

A história de Iágar, seu amigo Bór e sua "ficante" Kíria se passa num mundo em que uma peste devastou o que existia do antigo sistema econômico e político. A megalópole, agora, se divide entre as Ilhas, onde vivem os poderosos e abastados, e o resto, onde gangues, povo e polícia se digladiam apenas pela sobrevivência.

Para os detentores do poder, os lumpéns (como os pobres eram chamados) são quase como gado. Com a grande diferença de que o gado de verdade é item raro e valioso.

Enquanto a disputa pelo poder nas Ilhas - que ficam nos níveis superiores da supercidade - passa por atentados e jogos de sexo e corrupção, lá embaixo vale tudo para se manter vivo.

As gangues, em geral, são núcleos confiáveis. A não ser quando se descobre que os cabeças delas estão a serviços da polícia e das Ilhas. Então, só resta uma saída: se rebelar e lutar. Não pela democracia, não por um modo de vida: apenas pelo que se acredita, por mais egoísta que isso soe.

A trama de Tempos de Guerra é intrincada, apesar de pouco complexa. Reúne em suas 64 páginas diversos elementos que fizeram sucesso em outras sagas distópicas futuristas pelo mundo, com destaque para as inglesas Invasão e Juiz Dredd, ambas publicadas no semanário inglês 2000 AD.

No entanto, mostrando o lado dos párias, Tempos de Guerra se tornou um álbum único na história das HQs nacionais até então. Sem heróis, sem tomar partidos, mostrando os problemas de todos os lados da questão, José Duval lança uma pergunta fundamental: por que lutar?

Em meio a tudo isso, o misterioso Muls procura simbolizar o destino a que todos estão submetidos. Meio profeta e meio reprodutor de grandes obras da pintura mundial, ele sabe que algo está errado e procura trazer tanto personagens como o leitor às questões mais profundas que Duval expõe em seu roteiro, como a validade de se continuar tentando, de não desistir nunca.

O protagonista Iágar, marcado por esse destino, terá o livre arbítrio para tentar algo novo? Ou precisará seguir os desígnios que o estigmatizam?

É importante ressaltar as metáforas totais com o momento político que o Brasil passava no início dos anos 1990, com a eleição e a queda de Fernando Collor, a ascensão de Itamar e o surgimento do neoliberalismo como pedra angular dos novos tempos no País. E também os conflitos sociais acentuados em centros como São Paulo e Rio de Janeiro são aqui antecipados, pois hoje eles soam tão violentos como os retratados por Duval, mais de 15 anos antes.

A HQ também acerta ao mostrar núcleos muito diversos entre si em ação, integrando-os ao longo das páginas. Assim, a trama escapa do maniqueísmo que geralmente se coloca em histórias que pretendam alguma moral. Tempos de Guerra não pretende; é uma história como a vida. Em que se ganha algumas e se perde quase sempre. Em que fugir nunca é uma boa opção. Mas lutar também não é.

E se lutar e fugir não são opções, o que resta?

Em meio a intrigas, violência, romance, corrupção e ficção, José Duval realiza uma das melhores graphic novels brasileiras, que atualmente pode ser encontrada apenas em sebos ou por meio de scans piratas, que, se infringem os direitos dos autores, têm o mérito de não deixar este trabalho fortíssimo se perder na memória dos leitores brasileiros.

A Book Editora, nesta segunda obra de Duval, novamente teve a coragem de publicar uma HQ nacional que não se baseia no urbanismo contemporâneo, nem no regionalismo gratuito, nem em adaptações de grandes obras literárias.

Se foi uma decisão infrutífera, ainda assim é difícil acreditar que os editores tenham se arrependido de ter publicado um material tão bom. Ainda que vendido com o preço impresso em etiquetas afixadas a uma embalagem plástica descartável e impressa num papel de qualidade inferior, como era comum ao ainda pouco exigente mercado da época. Que o diretor responsável, Almir Vieira Dias, um dia possa nos esclarecer tais dúvidas.

Pois Tempos de Guerra é, de fato, uma pepita de ouro jogada aos porcos. Uma história ainda atual, pronta para ser redescoberta por algum editor de visão que acredite no potencial de grandes roteiros brasileiros. E que não tenha medo de lutar, mesmo que a opção mais fácil seja a fuga.

Classificação:

4,0

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