Resenha: Creed - Nascido para lutar é o Rocky da nova geração
Alguns defendem a teoria da história cíclica. Ela diz que acontecimentos atuais já ocorreram antes de alguma maneira ou forma, espelha fatos do passado e tem seu período e relevância antes do declínio, apenas para voltar a se repetir no futuro.
Sem querer entrar no mérito da discussão, é curioso notar o que aconteceu na indústria do cinema norte-americano em 2015. Todos estamos familiarizados com continuações e até mesmo remakes, mas alguns dos maiores sucessos foram filmes que se prenderam fortemente nas estruturas narrativas das obras originais, evocando um grande sentimento de nostalgia.
Foi isso o que aconteceu, por exemplo, com as duas maiores bilheterias do ano passado: Jurassic World - O mundo dos dinossauros e Star Wars - Episódio VII - O despertar da Força.
O mesmo acontece com Creed - Nascido para lutar, um spin-off que procura reinventar a franquia Rocky.
Rocky Balboa, o lutador de boxe que supera todas as adversidades, foi criado por Sylvester Stallone em 1976 para Rocky, filme no qual ele escreveu e atuou. O trabalho rendeu dois troféus do Oscar (Melhor Filme e Melhor Diretor) e ainda duas indicações ao mesmo prêmio para Sly: Melhor Ator e Melhor Roteiro Original.
O sucesso gerou cinco continuações e alguns altos e baixos de público e crítica. A última delas, Rocky Balboa (2006) foi elogiada e parecia ter colocado um bonito ponto final na longa trajetória do personagem.
Parecia.
A força para enfrentar obstáculos e voltar mais forte parece ser também uma característica da franquia, que agora foca em Adonis Creed para se revigorar e ter uma novo início e, consequentemente, mais chances de longevidade.
Adonis é filho de uma relação extraconjugal de Apollo Creed, o primeiro e maior adversário de Rocky, que com o tempo também virou seu grande amigo.
Ele tem emprego, mas não se sente feliz. Gosta de lutar e quer seguir a carreira de boxeador. É quando decide abrir mão de tudo para perseguir esse sonho, escondendo de todos seu sobrenome famoso para ser merecedor do sucesso por méritos próprios. Então, ele se muda para Filadélfia e procura Rocky para treiná-lo.
Não é a primeira vez que Rocky Balboa é mostrado nos filmes como treinador. Essa tentativa foi feita em Rocky V, um dos mais fracos da série. Aqui, entretanto, é tratado de maneira mais séria, remetendo ao longa-metragem original.
Além disso, ele terá seus próprios desafios para vencer nesta história, dando a Stallone muito material com que trabalhar, realizando uma atuação admirável e comprovando que este é mesmo o principal papel da vida do ator.
Não é por acaso que venceu o Globo de Ouro de Melhor Ator Coadjuvante, o primeiro de sua carreira, e concorre novamente ao Oscar em 2016, na mesma categoria. A atuação de Sylvester Stallone o fez entrar em um seleto grupo que inclui apenas outras cinco pessoas: o de ser indicado duas vezes ao maior prêmio do cinema por interpretar um mesmo personagem (as outras foram Bing Crosby, Paul Newman, Peter O’Toole, Al Pacino e Cate Blanchett).
Outro ponto positivo do elenco é Michael B. Jordan e sua incrível transformação física. Ele dá a volta por cima, comprova seu talento e deve respirar aliviado após sofrer tanta pressão pela recente polêmica envolvendo a mudança de etnia do herói Tocha Humana no filme Quarteto Fantástico e o fracassado desempenho de público e crítica que a produção teve.
Tudo isso sob o comando do diretor Ryan Coogler, de apenas 29 anos, que até então tinha apenas um longa-metragem no currículo (Fruitvale Station - A Última Parada, 2013).
Ele retorna às origens, filmando o pobre bairro da Filadélfia de maneira crua e realista, sem se render a estilos modernos e estilizados de fotografia. Nas cenas de ação, arriscou e conseguiu bons resultados, como em uma das lutas, filmada de maneira a dar impressão que toda cena é um plano-sequência (sem cortes). Este, obviamente, não é o caso, mas foi uma maneira original levar o esporte para as telonas.
Além disso, Coogler é o autor da história e coescreveu o roteiro.
O trabalho de destaque em Creed já lhe rendeu o comando de Pantera Negra para a Marvel Studios.
Com tantos atrativos, o elo mais fraco fica com o antagonista Ricky Conlan (vivo por Tony Bellew, boxeador profissional e três vezes campeão na categoria peso-pesado). O desenvolvimento do personagem é limitado e sem o carisma de outrora de Apollo, servindo apenas como o obstáculo do protagonista.
A trama também exclui o filho do Rocky e sua ausência é explicada em uma passagem rápida. É compreensível, uma vez que o protagonista aqui é Adonis e essa é a história dele. Mas explorar a dinâmica entre os três personagens pode ser interessante. Quem sabe numa continuação?
Mas isso em nada enfraquece o resultado final. Creed é o Rocky da nova geração, mostrando que a força da história contada há 40 anos continua atual e relevante.
Creed - Nascido para lutar
Duração: 133 minutos
Estúdio: MGM e Warner Bros.
Direção: Ryan Coogler
Roteiro: Ryan Coogler e Aaron Covington
Elenco: Michael B. Jordan, Sylvester Stallone, Tessa Thompson, Phylicia Rashad, Tony Bellew, Ritchie Coster e Graham McTavish.