Resenha: Quarteto Fantástico enfrenta desconfiança, mas ainda não se destaca
Hoje em dia, os estúdios tentam criar um hype cada vez maior em torno de seus filmes, especialmente quando envolve adaptações de super-heróis. Mas, às vezes, o melhor para o público é manter essas expectativas baixas ao entrar no cinema e, assim, tirar algum proveito da experiência.
Esse é o caso de Quarteto Fantástico, reboot da franquia que envolve a primeira equipe da Marvel Comics, produzida pela 20th Century Fox e que estreia esta semana.
O desenvolvimento desse filme foi cercado de polêmicas e desconfianças. O roteiro é de Simon Kinberg, o mesmo de X-Men - Dias de um futuro esquecido, e a direção ficou a cargo de Josh Trank, elogiado pelo longa-metragem de baixo orçamento Poder sem limites (2012), que o levou a ser escolhido para esse projeto.
Mas logo as notícias passaram a não ser bem recebidas pelos fãs. Primeiro, foi decidido escolher um elenco jovem e a controversa decisão em mudar a etnia do Tocha Humana. Depois, vieram as informações de que muitos detalhes da origem e história dos heróis seria mudados, incluindo algumas bizarrices, como transformar Victor Von Doom em hacker.
E sim, praticamente tudo foi mudado em relação à versão clássica da equipe, mas o novo filme não foi fruto de ideias aleatórias dos realizadores. Na verdade, eles se basearam na versão do Universo Ultimate. E muito!
A linha Ultimate Marvel foi criada no ano 2000 com grande sucesso. Era uma iniciativa para reintroduzir os principais personagens da editora sem que os autores e leitores ficassem presos a anos de cronologia. Essa liberdade editorial permitia efetuar mudanças sem que interferissem nas revistas normais. O primeiro deles foi Homem-Aranha, escrito por Brian Michael Bendis, seguido pelos X-Men de Mark Millar. E foram justamente esses dois autores que reinventaram o Quarteto Fantástico, em 2004. Eles escreveram as primeiras seis edições contando a origem do grupo e, então, Warren Ellis assumiu o título.
Em linhas gerais, o reboot segue o mesmo caminho. O novo filme procura se diferenciar dos dois anteriores - lançados em 2005 e 2007 - de todas as maneiras possíveis, incluindo elenco, história e tom da narrativa. E encontraram na versão Ultimate um meio de fazer isso acontecer, ainda mais com Mark Millar sendo um consultor do estúdio.
Quarteto Fantástico começa mostrando Reed Richards (Miles Teller) ainda criança montando protótipos para sua pesquisa sobre teletransporte com a ajuda do amigo de classe Bem Grimm (Jamie Bell). Os dois conseguem melhorar o equipamento até que, anos depois, são descobertos pelo Dr. Franklin Storm (Reg E. Cathey) durante uma feira de ciências e Reed é convidado a fazer parte de um grupo de jovens superdotados do Edifício Baxter. Lá, o promissor cientista conta com a ajuda de Sue Storm (Kate Mara), Victor Von Doom (Toby Kebbell) e Johnny Storm (Michael B. Jordan) para aprimorar seu projeto, que eventualmente os levará para uma outra dimensão e causará o acidente que os farão desenvolver habilidades incomuns.
Dizer que este filme é o melhor do Quarteto Fantástico poderia ser um bom elogio, mas, infelizmente, não quer dizer muita coisa. A franquia sofre com fracas adaptações.
Apesar de controverso, o elenco é talentoso. Mas, mesmo assumindo que esta é uma versão mais jovem da equipe, é difícil conseguir imaginá-la como os super-heróis. Uma vantagem inegável está na utilização dos efeitos especiais, bem superiores aos dois outros filmes, como a representação do Coisa deixa óbvio.
Infelizmente, é justamente quando eles ganham os superpoderes que o filme começa a descarrilhar. Em vez de as habilidades serem frutos de uma exposição à radiação durante uma viagem espacial, aqui elas surgem graças a um acidente enquanto exploram outra dimensão (que pode muito bem ser a Zona Negativa, apesar de não terem dado esse nome no filme).
Desse momento em diante, o filme perde o foco e se apressa para a resolução da história. Ver os personagens usando seus poderes acaba sendo a menor parte da projeção.
Outro ponto fraco está na caracterização do Doutor Destino, mais um dos problemas recorrentes na franquia. Os realizadores não conseguem retratar o personagem de maneira que faça jus aos quadrinhos. Uma única e brevíssima menção à Latvéria é feita.
Com 1h40min de duração, curto para um filme desse gênero, o filme dá a impressão de ter sofrido na sala de edição. Muitas cenas parecem ter sido cortadas, talvez para amenizar pontos polêmicos ou economizar em efeitos visuais. Talvez saibamos mais sobre isso no futuro, em uma versão estendida ou em cenas excluídas apresentadas como extras para home video.
Além disso, o cancelamento da conversão para exibição em 3D e o tempo que a Fox demorou para apresentar o filme à imprensa norte-americana, feito apenas dois dias antes da estreia – algo incomum no mercado de lá –, parece demonstrar a pouca confiança que o estúdio teve no produto final após o turbilhão de problemas nos bastidores.
Josh Trank é acostumado a trabalhar com baixo orçamento e essa capacidade de poupar dinheiro certamente foi um fato importante para ser escolhido. Mas a falta de experiência para lidar com pressão em grandes projetos pode ter prejudicado. E pressão foi o que ele mais teve durante dois anos envolvido neste filme.
O resultado não chega a ser desastroso como era temido, mas tampouco é fantástico (com o perdão do trocadilho!). O longa-metragem consegue ter boas ideias, mas falha em desenvolvê-las da melhor maneira e não se destaca quando comparado aos demais filmes do gênero. Entretanto, existe potencial para continuações, se bem trabalhado. O tom da narrativa se encaixa bem no clima dos filmes dos X-Men e, como se sabe, há planos para o crossover entre as duas franquias. Mas ainda depende do retorno financeiro e a aceitação do público.
Com orçamento de US$ 120 milhões, resta saber como será essa recepção após tanta desconfiança e negatividade. Para os fãs dos personagens é mais difícil aceitar as mudanças e restará à 20th Century Fox o desempenho com o público em geral, cujos detalhes controversos não influenciam tanto.
Para dar um gás maior na visibilidade de Quarteto Fantástico, o estúdio chegou até a “convocar” o Deadpool em materiais promocionais.
Por fim, vale mencionar que neste filme não há as já clássicas participações de Stan Lee e nem cenas pós-créditos.
Quarteto Fantástico
Duração: 100 minutos
Estúdio 20th Century Fox
Direção: Josh Trank
Roteiro: Simon Kinberg, Jeremy Slater e Josh Trank
Elenco: Miles Teller, Michael B. Jordan, Kate Mara, Jamie Bell, Toby Kebbell, Reg E. Cathey, Tim Blake , Owen Judge e Evan Hannemann.